sexta-feira, 10 de maio de 2019

O QUE A CRISE CONFIRMOU SOBRE A PERSONALIDADE DOS LÍDERES PARTIDÁRIOS (III)


3 - A Catarina Martins que olhamos com complacência
Há uns anos atrás senti-me quase no limite da paciência para com um Partido Socialista que, liderado por António José Seguro, e pressionado por Cavaco Silva, parecia em vias de dar a mão ao desacreditado Passos Coelho, que conseguiria assim arregimentar em seu torno uma grande maioria parlamentar tendo apenas a CDU e o Bloco como pequena representação opositora na Assembleia da República. Indignada com a possibilidade de tal suceder a minha cara-metade aproveitaria o facto de cruzar-se com Alberto Martins, Eurico Brilhante Dias e Óscar Gaspar na escadaria de acesso ao primeiro andar da sede do Rato para lhes disparar um alerta: «vejam lá o que andam a negociar!».
Felizmente o tal acordo, que permitiria à então direção do PS vender-se às direitas por um prato de lentilhas gorou-se, António Costa manifestou a intenção de ir a votos com Seguro e a política do partido reorientou-se para o cumprimento dos princípios, que o norteiam.
Não tivesse isso acontecido e seria provável que pusesse um definitivo termo à ligação como militante vivida desde 1986. Poderia imitar Alfredo Barroso, que saiu nesse consulado segurista e se aproximou do Bloco de Esquerda como simpatizante? Francamente não sei. Houve alturas em que pensei que sim, muitas outras dissuadiram-me de tal hipótese.
Em primeiro lugar há Francisco Louçã, que nunca deixou de ser mais anti-PS do que arreigado defensor de uma estratégia política, que quase sempre favorece as direitas. É até caso para nos questionarmos se a SIC não mostra bastante competência no cumprimento da vontade do patrão-mor ao tê-lo há já vários anos como comentador regular no seu telejornal das sextas-feiras à noite?
É verdade que João Semedo sempre me mereceu uma enorme simpatia. Se vezes houve em que senti empatia com o Bloco foi por seu intermédio, porque revelava-se homem ponderado e ciente das vantagens das alianças com os socialistas, mesmo que isso não significasse uma coligação de governo. Aliás, por essa altura, num debate em que Ana Drago - ainda militante do Bloco e sua recente deputada -, mostrava intenções de exigir essa contrapartida, Semedo questionava-a com a complacência de quem já muito vivera e refletira, se ela achava-se preparada para tais responsabilidades, havendo na pergunta a resposta negativa subjacente.
É essa irreprimida jactância, que sinto ao ouvir Catarina Martins em muitas das suas intervenções, como se não lhe reconhecesse maturidade bastante para defender certas posições mais polémicas. Como se da adolescência tivesse ainda trazido de reboque uma irrefletida forma de pensar e agir. Que a faz cair inevitavelmente em contradição. Que a leva a condenar o tirano Maduro mas, quando sente quanto está a alinhar na agenda de Trump, a conduz a um discurso de nem carne nem peixe, que soa a incongruente. Quando se agarra às pretensões de Mário Nogueira e, depois, quase surge como uma beata suplicante a querer suscitar comiseração em António Costa.
Ao ouvirmos Catarina Martins nunca sabemos o que provém do que pensa, ou do que lhe possa impor Louçã como consultor sénior, que sinta obrigação em ouvir. Desconfio que, se avançar pelo que pensa se aproxime do Semedo, que em toda a esquerda deixou um lastro de saudade. Se der demasiados ouvidos a Louçã é a repetição da coligação negativa de 2011, que se torna aflitiva hipótese.
De qualquer forma, misturando antigos trotsquistas, marxistas-leninistas e outras orfandades das esquerdas mais extremas, o Bloco é ideologicamente algo difuso, que nunca chegamos a perceber muito bem o que quer e onde pretende chegar.

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