quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O PREC quarenta e cinco anos depois

 


O José Mário Branco cantou-o como sonho lindo que acabou. Porque depois veio o FMI, o forrobodó das agências de espionagem a manipularem as suas marionetas e, quatro anos depois, a AD desse homem pequenino, a quem ninguém reconheceu dotes de competente dançarino.

Há quarenta e cinco anos viveram-se vários golpes de Estado no mesmo dia. O primeiro, o mais desastrado e desesperado, foi o das extremas-esquerdas, que sentiam, dia-a-dia, o chão fugires-lhe debaixo dos pés. O outro, igualmente falhado, foi o das direitas e extremas-direitas que se haviam colado oportunisticamente ao PS de Mário Soares para alcançarem o seu objetivo: pôrem fim à Revolução dos Cravos e imporem um regime pós-marcelista em que os socialistas figurassem um pouco á maneira de um berloque decorativo. E prevaleceu o contragolpe dos militares do grupo dos Nove, que ambicionavam replicar em Portugal o tipo de democracia europeia em que os patrões explorassem comedidamente os trabalhadores e a estes fosse dada a ilusão, através  dos sindicatos e de uma aparência de cogestão das empresas, de não serem demasiado espoliados nas mais-valias que produzissem.

À distância uma análise racional conclui que as extremas-esquerdas - à exceção do Partido Comunista, que ficou a ver como evoluíam as ondas para melhor nelas surfar consoante se viessem a revelar mais ou menos agitadas! - não quiseram entender a impossibilidade prática de concretizarem esse tal sonho: numa população em grande parte analfabeta, rendida aos ditames dos padres e dos caciques da província, nunca poderiam deter uma relação interna de forças, que possibilitasse um avanço progressista para algo inexistente em parte alguma do mundo. Mais cínica e inteligente as direitas souberam aproveitar-se do anticomunismo agudizado dentro das hostes socialistas para as colocarem ao seu serviço e adiantarem-lhes a sementeira, que sabiam depois vir a colher.

Está por fazer o trabalho histórico de juntar as muitas entrevistas e artigos de Mário Soares nos seus últimos trinta anos de vida para dar conta de como ele evoluiu do contrarrevolucionário de 1975 para posições muito à esquerda do político de então. Como Presidente da República já pouco pôde contrariar uma prevalência das direitas, que Cavaco Silva formataria da maneira que se sabe. E, depois, quer apoiando Guterres, Sócrates ou António Costa, ele terá pretendido reativar essa esperança numa sociedade sem classes como é o socialismo, mas em ambiente de liberdade, o que, neste momento histórico, ainda corresponde a uma quadratura do círculo.

Há quarenta e cinco anos, o 25 de novembro correspondeu, pois, à tentativa das extremas-esquerdas darem dois passos para diante, acordando depois numa sociedade em que muitos foram os que vieram para trás.

 

1 comentário:

  1. Como o Jorge Rocha bem reconhece, não conheço nenhuma democracia que não tenha o perfil europeu. As outras, as populares, eram todas ditaduras de quadros que exploravam os trabalhadores de forma não exactamente comedida e que evoluíram quase todas para oligarquias onde a exploração o é ainda menos.

    O 25 de Novembro representa o fim do caos pós-revolucionário e o início do caminhar lento de Portugal rumo ao desenvolvimento que deve mais ao PS (SNS, RM, políticas científica e de apoio às energias renováveis, etc) que a qualquer outro Partido.

    É curioso notar que o Jorge Rocha refere igualmente o papel relativamente marginal do PCP nesta História, que ficou a apanhar bonés, ultrapassado pela Extrema-Esquerda Militar e pelo PS de cada um dos lados, o que também reflectia a fraqueza da sua posição eleitoral de então (12,5%). Cresceu até aos tempos da APU e desde aí tem sido sempre por aí abaixo, à semelhança de Partidos como o Italiano e o Francês que tiveram um peso eleitoral com que ele nunca sonhou.

    O problema das revoluções, Jorge Rocha, é que elas normalmente falham. A revolução francesa falhou, deixando a Europa a ferro e fogo e ocasionando uma reação que provavelmente atrasou o progresso social uns bons cem anos. Nem vale a pena falar das diferentes intentonas (Alemanha, Itália, Hungria) que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, ou à Revolução Russa que provavelmente enterrou de vez o socialismo, pelo menos o de cariz mais estatista.

    Por isso, se quer mesmo o socialismo, sugiro que se contente com uma via reformista, ou se quiser, social-democrata. O resto é mesmo para esquecer...

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