Sétimo dia de guerra na Ucrânia com os russos a avançarem para a vitória para pesar da maioria dos telejornalistas lusos, que não disfarçam a vontade de verem a NATO a entrar em força ao lado de Zelenskii, apesar das vozes mais avisadas de alguns militares, chamados a comentar os acontecimentos, e bem mais cientes do que isso mesmo significaria.
Multiplicam-se as manifestações, mas os próprios governantes ocidentais mostram-se mais lúcidos do que os promotores da ideia de lançar mais combustível para um incêndio de já vastas proporções. Por isso mesmo se os parlamentares europeus votaram maioritariamente a favor da aceitação do pedido de adesão da Ucrânia à União, Ursula von der Leyen logo lhes arrefeceu os ânimos ao estimar em vários anos a apreciação da aspiração. E se sobram notícias sobre o corte de muitos bancos russos do sistema SWIFT, sobram uns quantos para movimentarem os fluxos de pagamentos do gás natural e dos combustíveis, que continuarão a vir da Gazprom.
Não é difícil imaginar o resultado da guerra a curto prazo: se Putin a perdesse não se coibiria de pressionar o botão de comando das ogivas nucleares apontadas à Europa e aos Estados Unidos. E não há quem, deste lado do continente, queira testemunhar o apocalipse nuclear à conta dos interesses ucranianos. Por isso há quem troque os sonhos por realidades miríficas e imagine o inimigo número um dos povos apeado por um dos seus generais a mando dos ex-amigos oligarcas. Como se um ex-agente do KGB não se precavesse de uma possibilidade, que a tradição estalinista tanto glosaria.
Pelo contrário não me admiraria, que o mundo verta em breve copiosas lágrimas pela morte de Volodomir Zelenskii, cuja teimosia em ir até ao martírio levou a prescindir da oferta de Biden para o retirar de Kiev e servir de general das suas tropas a partir de fora. A juventude do ex-humorista não lhe permite o conhecimento da História, que o aproxima do esquecido Djokhar Dudaiev, morto em abril de 1996 com os dois mísseis de alta precisão com que os russos acabaram com as veleidades independentistas da Chéchénia.
Na época também muitos a Ocidente o choraram, não querendo sequer saber que a operação russa contou com a ajuda da norte-americana NSA para afinar a precisão até ao jipe donde o líder checheno falava ao telefone com um deputado da Duma. Hoje já ninguém dele se lembra.
Não tenho grandes dúvidas sobre qual será o destino de Kiev nas próximas horas: a exemplo de Alepo acabará em ruínas, com muitos corpos espalhados pelas ruas. Ali não tardará a reinar a paz dos cemitérios. E, depois de expectável período de nojo, o Ocidente voltará aos negócios com Putin, primeiro sob a reserva de uma grande indignação mas, depois com menor escrúpulo, porque os preços dos combustíveis só podem ser contidos com o recurso às exportações russas e as linhas de produção dos carros alemães precisam do escoamento habitual para o grande país de leste. De um lado e do outro será o capitalismo a perdurar no seu conhecido esplendor, que até nem dispensará uma grande conferência de paz entre a NATO e a Rússia sob beneplácito dos chineses, também eles interessados em que os mercados voltem ao laissez faire, laissez passer, todos se contentando com os novos equilíbrios ditados por esta guerra.
Existe cinismo nesta análise? Decerto que sim! Mas a análise geopolítica não aconselha excessivas emoções...
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