sábado, 12 de setembro de 2020

Lembremos aos que esquecidos estão (1)

 

Em 27 de maio de 2014 o «Diário de Notícias» fazia parangonas com a novidade do dia: Ana Gomes anunciava o apoio a António José Seguro na disputa interna para o cargo de secretário-geral. Quase dois meses depois, a 21 de julho, quando o seu candidato formalizou a candidatura, lá comparecia Ana Gomes na trincheira errada, mas condizente com o seu pensamento político.

Na realidade não é fácil descortinar uma ideia consistente na agora candidata presidencial: a nuvem populista com que encobre o que, verdadeiramente, lhe vai na alma, só se revela nas alturas em que se posiciona do lado errado da História, quando o Partido Socialista está numa daquelas encruzilhadas donde partem dois caminhos, um virado para mais progresso e desenvolvimento, com maior igualdade na distribuição de rendimentos entre os portugueses - o que pressupõe convergência à esquerda! - e o outro, que tem sido igualmente frequente no passado, quando se julgou possível conciliar esses objetivos no conúbio promíscuo com os grandes interesses financeiros e os principais grupos económicos do país.

Aquele momento de 2014, em que António José Seguro não teve como justificar os dececionantes resultados nas europeias, foi um daqueles que atrás se consideraram: na altura, ciente da fragilidade da direção do PS, Cavaco Silva andou a força-la a render-se a Passos Coelho num acordo tácito onde poderia haver uma aparente divisão de poderes - até com a entrada de ministros socialistas para o governo do PPD e do CDS - mas numa situação de menoridade, que tem apoucado o SPD perante a CDU de Angela Merkel numa alternativa semelhante há anos vigente na Alemanha. Quereriam os socialistas participar num governo em que pouco decidiriam e o país continuaria a regredir nos direitos sociais e nas desigualdades de rendimentos?

Foi por sentir o Partido consonante com a sua revolta perante tal perspetiva, que António Costa manifestou-se disponível para disputar o cargo de secretário-geral, mesmo sabendo como toda a imprensa e a grande maioria do tecido empresarial tudo faria para sabotar o seu esforço.  Daí que, apesar de quase terem chegado a assinatura do vil acordo com a direita, os seguristas compreenderam que teriam triste fim se a tal se atrevessem. E, com grande pena de Cavaco, que julgava ter definitivamente os socialistas no bolso, escusaram-se a fazê-lo. Mas a vontade fora tanta em assiná-lo!

Nesse momento chave Ana Gomes demonstrou de que lado estava - com os mesmos que hoje apoiam Marcelo na sua recandidatura! A sua bravata tem o mesmo objetivo que Maria de Belém encarnara há cinco anos: dificultar tanto quanto possível as convergências à esquerda, de que viria a manifestar-se pertinaz opositora, quando elas ocorreriam nos primeiros dias de novembro de 2015 (mas isso é substância para o texto de amanhã!).

Não é, pois, por acaso, que Ana Gomes traz como lastro para a sua candidatura os apoios de Francisco Assis, de António Galamba e outros notórios cabeças de cartaz da antiga tralha segurista. Os socialistas voltam agora a ter de escolher que Partido Socialista preferem no futuro: o que prossiga o caminho traçado nos últimos quatro anos e desenvolva o país ao mesmo tempo, que melhora a qualidade de vida da grande maioria dos portugueses menos abonados, ou aquele que sempre se mostra interessado em mais do mesmo, cedendo no essencial aos interesses dos que mandam nos mercados e têm na imprensa o útil altifalante  propício a criar a ilusão de não ser possível qualquer outra alternativa.

Iludem-se os mais inocentes: mas não tem ela denunciado os casos de corrupção? Bom, tal qual o Kim Jong-ventura não deixa de vir a jogo para defender os interesses da grande burguesia ( e daí as suas propostas de imposto único para ricos e pobres!), mesmo enganando os tolos, que o julgam um “amigo do povo”, também Ana Gomes esconde os seus verdadeiros objetivos atrás da nuvem de poeira que lança nas suas cruzadas, sempre inconsequentes...

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