Numa entrevista a Luís Caetano o trekker Gonçalo Cadilhe assinala uma diferença substantiva entre os portugueses e os franceses no capítulo das crenças: enquanto os primeiros vão a Fátima agradecer as dádivas que julgam devidas aos céus, os segundos acorrem a Lourdes para exigirem mais do que já têm. Daí que olhemos para as ruas parisienses e as vejamos frequentemente ocupadas por gente reivindicativa, desde os que andaram a descobrir praias debaixo das pedras da calçada em 1968 até aos coletes verdes dos tempos recentes! Ao invés, por cá, pouco gás damos a quem se manifesta por causas justas, mesmo quantos, ordeiramente, a CGTP consegue pôr a desfilar nos dias de greves gerais ou nos Primeiros de maio.
O salazarismo deixou-nos tão acomodados nos axiomas inconscientes de sermos pobrezinhos, mas honrados, satisfeitinhos com a Grande Guerra nos ser poupada, mesmo que condenados a morrer de fome, que preferimos morder pela calada, mormente desconsiderando e desvalorizando quem bem agora nos governa e não merece os sucessivos assassinatos de carácter a que se sujeita na imprensa em geral e depois amplificados pelos altifalantes dos cobardes e mentirosos das redes sociais.
É à conta desse comportamento de cordeirinhos, que os lobos fascistas se valem ousando ocupar as ruas e praças a quem delas é legítimo dono, mas se ausenta. Até saem das catacumbas em que se escondiam para terem a surpreendente lata de convidarem para as suas hordas, quem com elas nada tem a ver. Nesse sentido, achei curiosa a confidência ontem feita por quem me é próximo e falava do que sucedera a amiga comum: alguém que conhecera e com quem privara numa daquelas viagens organizadas por agências para metrópoles centro-europeias, viera agora convidá-la a entrar no partido da florzinha de estufa da extrema-direita. E aí está uma diferença tão substancial, quanto a dos portugueses vs. franceses no relato do Gonçalo Cadilhe: o que distingue os atuais fascistas do partido criado à sombra de Passos Coelho dos que se escondiam envergonhadamente no CDS - e são provavelmente os mesmos! - foi terem ganho descaramento e não terem pejo em declararem-se como tal. E até ousarem fazer trabalho de proselitismo junto dos que os execram...
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