Ontem de manhã saímos à rua para adquirirmos alguns alimentos de primeira necessidade, sobretudo fruta e vegetais, que obrigam , pela sua perecibilidade, a serem adquiridos pelo menos uma vez em cada três dias. Nas lojas a que acorremos formavam-se vastas filas com as pessoas espaçadas a distância conveniente umas das outras. Porque não nos dispúnhamos a estar tanto tempo na rua, dispensámo-nos de ficar nas primeiras alternativas, optando por outra mais distanciada dos centros urbanos. Mas em qualquer delas vimos as pessoas sem sinais de exasperação, aceitando fleumaticamente as circunstâncias. Compreendia-se na sua conduta a razão apresentada por quantos consideram injustificada a vontade de Marcelo em impor o estado de emergência e a interpretarem como fútil intenção de recuperar alguma da iniciativa política, que perdera ao pôr-se, durante vários dias, a recato na sua casa de Cascais. Cheirinho a deserção, qualificara o caluniador Tavares na última página do «Público» e assim terão sentido muitos dos apaniguados do Presidente, agora lestos a exigirem-lhe essa manifestação de força.
O que vi nas ruas foi a calma de uma população convencida da necessidade de acatar pacificamente as orientações sensatas do Governo e da Direção Geral da Saúde sem a necessidade de dar força de lei àquilo que sabem ser judicioso para a sua vida.
Que os politiqueiros do costume estão doidinhos por encontrarem motivos para zurzirem no governo não tenhamos dúvidas. O bastonário dos médicos e o sindicalista Roque da Cunha multiplicam-se em declarações incendiárias, que nada têm a ver com o interesse público e só se explicam pelos seus intuitos partidários. E para lhes sugerir possíveis intervenções futuras a SIC incumbiu-se de emitir uma peça com médicos italianos apostados em porem em causa o apoio crescente ao governo de Giuseppe Conte pelos seus compatriotas. Diziam esses médicos que tivesse o governo tomado mais cedo as medidas musculadas dos últimos dias e evitaria tantos milhares de mortos e infetados.
Cabe lembrar que, durante semanas, a própria imprensa veiculou a ideia de ser impossível na Europa a implementação da estratégia chinesa para conter a propagação da doença, porque o modelo «democrático» não a possibilitaria. Compreende-se que o primeiro governo europeu a contas com uma crise da mesma dimensão tergiversasse até a aplicar em pleno só o fazendo quando sentiu haver clima político-social para tal. Mas, quando o fez, foi por sabê-las incontornáveis e ter a noção da sua aceitabilidade pelos governados.
Que a direita italiana venha agora com o velho argumento do «se tivesse feito assim ou assado...» é politiquice desavergonhada, que pode iludir uns quantos, mas se desqualifica junto de quem compreende os seus verdadeiros objetivos.
Por cá as direitas apostam na mesma estratégia: enquanto sabem que a maioria da população apoia as decisões do governo manifestam-lhe apoio e desejam-lhe coragem. Mas tão só tenhamos os mesmos atores da mais rasteira politiquice a darem-lhes munições, vê-las-emos a procurarem colher votos, que lhes devolva a esperança de terem novamente o pote à vista.
Daí ter sido lamentável que, no consenso nacional em torno da ação do governo, fosse Marcelo a sabotá-lo por mero interesse próprio. Tudo quanto o governo definiu até agora mereceu dos portugueses o acatamento sem a mínima contestação. Porquê aprovar a força da lei quando tão bons resultados estava a ter a anuência dos portugueses por sua livre vontade?
Como sugeria António Costa nas entrelinhas essa declaração do estado de emergência só deveria ter sido aprovada quando se viesse a justificar. Porque, nesta situação de exceção, há que seguir a regra de tudo impor com conta, peso e medida, E isso é que o governo tem feito na gestão desta crise...
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