domingo, 7 de julho de 2019

Património da Humanidade?!


Vai por aí grande foguetório por causa da aceitação da Unesco em integrar o Palácio Nacional de Mafra e o Bom Jesus de Braga nos monumentos reconhecidos como Património Mundial da Humanidade, mas será bom lembrar a importância do desempenho do embaixador António Sampaio da Nóvoa nesse sucesso ao mesmo tempo que se devem evocar algumas reservas quanto ao mérito de um e outro monumento.
Mafra continuará a ser o símbolo do despesismo de um poder autocrático, que esbanjou as riquezas do Brasil para satisfazer o capricho de quem demorara a cumprir uma das tarefas que lhe estavam incumbidas, a de garantir sucessão. O «Memorial do Convento» bem denuncia o sofrimento de quem teve de acartar com as pedras, os sinos e demais materiais para cumprir a vontade real enquanto em Lisboa se queimavam cristãos-novos por conta da vontade dos inquisidores.
Na realidade o Palácio de Mafra nada tem de arquitetonicamente admirável para além da dimensão de quem o quis equivalente à prosápia do seu encomendador, valendo sobretudo por ter suscitado no melhor dos nossos escritores uma notável obra literária justamente premiada com o Nobel. Mas nem isso o presidente da câmara de então o quis reconhecer por mais que hordas ininterruptsa de turistas ali se têm deslocado desde então só para verem o cenário do romance. Quando alguns professores quiseram dar o nome do escritor à escola secundária da vila o autarca logo a ideia vetou.
Por todas esses motivos convenhamos que só vejo razão para o Palácio de Mafra ser Património da Humanidade por ter estimulado Saramago a escrever uma das grandes obras da língua portuguesa e não tanto pelo que, mais carrilhão, menos carrilhão, o edifício e a sua tapada verdadeiramente mereçam.
Quanto ao Bom Jesus, valha-me o tal Deus em que não acredito. Para além da escadaria a incitar os crentes a fiarem-se de ser árduo o caminho até à salvação, e umas capelas sem nada de interessante a justificar que nelas estaquemos, que mérito possui o monumento? A vista lá de cima até pode ser aprazível, mas o verdejante Minho não é propriamente o tipo de paisagem, que me suscite entusiasmos.
Deixe-se, pois, acabar o foguetório para reconhecer que, acabados os injustificados brios nacionalistas nem Mafra, nem o Bom Jesus, passam a valer mais do que já valiam.

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