domingo, 14 de julho de 2019

Como o recurso ao medo tolhe o advento do futuro por que ansiamos


Nesta terça-feira cumprir-se-ão cinquenta anos sobre a chegada do primeiro representante da Humanidade à Lua. Na época tinha treze anos e vivi o acontecimento com a grande emoção de imaginar quão diferente seria o futuro em relação à cinzentude em que se vivia.

É verdade que a realidade excedeu - em muito! - os sonhos de então. Veio a Revolução, terminou a guerra colonial e os avanços da ciência e da tecnologia garantiram uma qualidade de vida que não podíamos imaginar porque pouco sabíamos doa ainda incipientes computadores.
Olhando para tudo quanto nos rodeia dificilmente encontramos focos de atenção, que já pudéssemos encontrar meio século atrás. Tudo mudou e o tempo foge em velocidade acelerada. De repente tudo se tornou possível, até por exemplo deixarmos de ter empregos, porque os robôs no-los sonegarão. Pelo menos é o que antevemos através de muitos artigos da imprensa escrita ou em documentários e reportagens da audiovisual.
Incutem-nos o medo. É essa uma das estratégias deste capitalismo selvagem que sabe quão perigosa é a esperança a florir nas mentes coletivas e tudo faz para as acossar com bichos-papões sempre em atualização: no tempo da guerra fria era o apocalipse nuclear, que assumiria outra forma - a de usarmos essa tecnologia para produzir eletricidade! - quando ocorreram os desastres Three Miles Island ou de Chernobyl. Caiu o muro de Berlim, apareceu um ingénuo (não tanto como isso!) a propor o fim da História, mas logo vieram os terroristas islâmicos (criados pela CIA na guerra do Afeganistão) para sentirmo-nos vítimas potencialmente aleatórias. E é agora o tempo das grandes migrações de refugiados e emigrantes económicos, que levam os mais timoratos a sentirem em risco a sociedade de bem estar, que querem fazer só sua.
Ufanos com a bem sucedida estratégia os que pretendem eternizar o capitalismo, veem aquela multidão de explorados, que deveriam ter na fraternidade e igualdade a meta para todas as suas ações, a abraçarem as extremas-direitas racistas e xenófobas.
O medo da robótica insere-se nessa estratégia: ameacem-se os que trabalham por conta de outrem com a possibilidade de serem atirados para a valeta dos sem préstimo na sociedade do futuro e eles contentar-se-ão mais facilmente com os empregos precários e mal remunerados em que gastam os dias e as energias.
Será possível ver os robôs a substituírem as pessoas na maior parte das tarefas, que hoje lhes garantem retribuição? Que imagem de sonho para os patrões, que os teriam a trabalhar vinte e quatro horas por dia e sem ameaças de greves. Mas acontecerá a uma dimensão tão vasta quanto no-lo prometem?  Esses prognósticos lembram os dos que ouvi em 1969 apontarem como prováveis as viagens interplanetárias nesta altura. Os filmes de ficção científica dos anos 60  e 70 - a começar pela Odisseia de Kubrick, acolitado no respeitável Arthur C. Clarke (e não me venham com as razões venais para ele se ter autoexilado no Sri Lanka!) - aí estão para nos recordar como o futuro vem rapidamente ao nosso encontro, mas não tão depressa quanto o pressupõem uns publicitários exagerados e até desviando-se para alternativas, que nem nos passavam pela cabeça.
Nas mais avançadas competições internacionais de robôs - que nada tenham a ver com os industriais, que só fazem repetitivamente a mesma tarefa - eles não dispensam a presença constante de um operador, que os maneja. Até os seus maiores entusiastas reconhecem a impossibilidade de reproduzir numa máquina os milhões de sensores com que a Natureza dotou o ser humano nos muitos milhões de anos, que o trouxeram ao atual homo sapiens capaz de refletir-se e melhorar-se. Por isso não se anteveem futuros em que as máquinas nos substituam. Porque nenhuma inteligência artificial conseguirá reproduzir a mistura de emoções e de análise em cada circunstância particular que garantam reações inventivas, imprevisíveis, inexcedivelmente eficazes.
Para as grandes corporações, que investem mundos e fundos na robótica na expetativa de virem a auferir de lucros ainda mais obscenos, os tais bichos-papões tenderão a desmistificar-se, mesmo quando assumem cabeleiras alaranjadas e ameaçam tudo e todos com os seus limitados recursos intelectuais.
Aos que acreditam num mundo novo a sério importa que combatam essa instituição permanente do medo como sendo mais forte do que o desejo de Utopia, essa esperança em que ela reemergirá da requalificação das do passado, tragicamente derrotadas por não estarem ainda conjugadas as condições históricas, económicas e tecnológicas para se concretizarem. Porque, ao contrário do que julgava Lenine, o Socialismo não resultaria da soma aritmética entre o capitalismo e a eletricidade.

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