Nos finais dos anos setenta vivi uns meses no Bahrain e uma das imagens, que me ficaram desse tempo foi a de sujeitos baixotes e barrigudos a passearem-se pelo bazar de Manama à sexta-feira à tarde, logo seguidos pelas quatro mulheres alinhadas duas a duas e quase impercetíveis por baixo das abayas.
Nessa altura o estaleiro onde me encontrava ainda estava sob a gestão da Lisnave, pelo que os portugueses possuíam algum ascendente sobre os poucos bahranis, que trabalhavam ali, no meio de tantos filipinos e indianos. A um encarregado local questionei sobre o casamento, tendo em conta que uns quantos compatriotas açambarcavam logo quatro mulheres para si, o que deveria dificultar a possibilidade de outros conseguirem pelo menos uma.
A resposta não me surpreendeu: ele próprio andava a poupar há imenso tempo para conseguir a verba necessária para o dote a entregar à família da prometida. Tratava-se de uma espécie de compra da noiva, que a família dela tornava numa “mercadoria” assaz dispendiosa.
Então, e os que não conseguem arranjar dinheiro para tal?
Vão-se safando como podem!, disse-me ele de forma equivocamente irónica. Foi assim, que percebi a inevitabilidade de relações homossexuais em muçulmanos devotos, ou nem por isso, que sempre olhariam para as mulheres do bazar como um fruto totalmente proibido.
Vem isto a propósito de uma notícia sobre o sucesso dos «lady boys» vindos da Tailândia junto de homens sauditas. Inequivocamente adornados de membro viril apesar da aparência mais ou menos feminina, eles subvertem a política moral do reino da família Saud onde a homossexualidade é proibida.
Desconheço se essa intolerância chega aos extremos do Daesh, que filmava execuções de supostos homossexuais atirados do alto dos edifícios mais proeminentes do território, que ocupavam, mas a crer na facilidade com que os súbditos sauditas são executados ou chicoteados não me admiraria, que a lei contra a sodomia contemplasse esse tipo de penas. Mas, como sucede em todas as sociedades profundamente vinculadas a preconceitos religiosos - sejam elas muçulmanas, católicas, judaicas, budistas ou hindus - a hipocrisia é a regra principal. Conquanto se salvaguardem as virtudes públicas, os vícios privados são tolerados até aos limites do seu recato…
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