Se as direitas tivessem da História a noção realista do que os factos lhe deveriam ensinar saber-se-iam enfeudadas numa ilusão, que mais facilmente as derrotará. Mas não é assim: episódios avulsos da semana passada bastam para concluir que quem se situa nesses quadrantes, mais ou menos extremados, olha para trás e vê um Império glorioso, cheio de heróis representados no monumento concebido por um arquiteto menor e nos brasões esculpidos em arbustos por todos ignorados se não os viessem agora defender como obras maiores.
As direitas taparam os ouvidos ao que disse um dos maiores vultos da nossa cultura nas últimas décadas - Eduardo Lourenço - que desmentia a existência do tal Império português porque, ao contrário dos que efetivamente mereceram a designação, o seu povo nada lucrou com o esbulho das riquezas dos que colonizaram. Ao invés os portugueses nunca saíram da miséria olhando para o além-mar como promessa de melhor qualidade de vida, que nunca viram concretizada. A não ser, quando emigraram para as Américas ou para além-Pirenéus e, pelo menos um punhado de entre eles, aí encontraram artes de concretizarem os objetivos.
É esse um dos fadários lusos: ficar sempre à espera de dias melhores sem mexer uma palha para que aconteçam. Quando alguns, mais ousados, sacodem a letargia - implantando a República ou acabando com o fascismo - o povo acorre ás ruas como se as revoluções fossem efetivamente suas (e até iludindo-se com a circunstância de, durante algumas semanas ou meses, o parecerem!), mas depois volta à má sina de cruzar os braços e deixar-se enganar pelos que ficaram momentaneamente na mó de baixo, permitindo-lhes o regresso em força, segundo a regra de algo mudar para que tudo fique na mesma.
As nossas direitas, por natureza mais propensas a tal vertente abúlica da identidade portuguesa, andam nessa onda: porque se sabem incapazes de estratégias de sucesso para recuperarem o poder suspiraram pelo seu Sebastião. Não importa se dele têm os portugueses a memória de uma governação, que só lhes roubou direitos e ainda mais os empobreceu. Se o pífio mito vitorioso bastou para ganhar uma vez, logo julgam possível que a água do rio volte a passar duas vezes pelo mesmo sítio. E até a ignóbil criatura invoca (em vão) o seu nome no parlamento para estupefação de Ana Catarina Mendes numa reação, que foi a de muitos quantos, atónitos, ouviram a grotesca enormidade.
As direitas não aprenderam que o sebastianismo surgiu da frustração dos seus antepassados em terem perdido tudo - até mesmo as dez mil violas que ficaram a torrar ao sol ardente de Alcácer-Quibir - e sentirem na pele a opressão filipina. Num dia de nevoeiro o rei voltaria e redimiria a pátria do abismo para que a precipitara.
Nos séculos seguintes os que viviam as frustrações de não alcançarem melhor futuro andaram iludidos com outros sucessivos Sebastiões. O fenómeno dá alento aos que se sentem impotentes e se iludem com futuros risonhos sem nada fazerem para tal. Se até Fernando Pessoa olhou para o protofascista Sidónio e nele viu o presidente-rei!
É esse o estado das nossas direitas, e sobretudo dos que anseiam pelo regresso de Passos Coelho. Que até por certo acontecerá, porque Rui Rio já teve três anos para demonstrar a incapacidade para ir além do mero preenchimento do cargo sem golpe de asa, que impeça a inevitável queda no rápido esquecimento. Mas, também aí, as direitas não aprendem com a História, aquela que nos dita a possibilidade de algo poder repetir-se, a primeira vez como tragédia, a segunda inevitavelmente como farsa. E cá estaremos para galhofarmos à conta do novo Sebastião, mesmo que por ora recue na intenção de regressar a 26 de março, porventura esperançado em que, dando-se a delongas no ressurgimento, ainda se torne pelas suas hostes mais desejado.
Não sei, não.....
ResponderEliminarQuando era PM, o homem sempre que falava verdade caía-lhe um braço. Ainda tem os dois, logo....