Quem viveu a experiência de intervenções cirúrgicas nos hospitais privados sabe bem o que aqui relembro: somos convocados em cima da hora de entrarmos no bloco operatório e, tão só concluído o ato médico, reduz-se o internamento ao mínimo. Num par de dias o doente está a recuperar em casa sem ocupar o espaço hospitalar por tempo excessivo.
A rentabilidade do negócio fundamenta-se em ter nas consultas das especialidades o fundamento para convencer os pacientes das vantagens de serem operados, mesmo que noutras circunstâncias - as do SNS - qualquer médico considerasse estultas tais hipóteses. Cá em casa temos experiência concreta de uma escusa à cirurgia na coluna vertebral com os sintomas a serem superados através da regularidade do exercício físico ao ar livre. Ou uma operação a um dos ouvidos resultou a completa e definitiva surdez do mesmo. Certo é que as cirurgias consubstanciam o filet mignon do negócio, sendo o paciente/cliente enviado à sua vida como se tivesse entrada numa cadeia de produção semelhante àquelas em que, de um lado, entram os porcos e do outro as caixas com chouriços.
A campanha lançada por Marcelo, e acolitada pelos candidatos da direita, quanto à necessidade do governo proceder à negociação de acordos com os hospitais privados para complementar as falhas do setor público é um logro que só serviu de pretexto para lançar sobre António Costa e Marta Temido o anátema de terem preconceitos ideológicos a respeito da medicina privada. Tal qual resultou igualmente demagógica a proposta de requisição civil sempre na boca de Catarina Martins quando o tema é o mesmo.
Há um embuste em considerar que os hospitais privados poderão substituir os do SNS. Tendo o lucro como foco não lhes interessa incumbirem-se de morosas hospitalizações do tipo das que os doentes por covid necessitam. Para isso faltam-lhes camas e profissionais de saúde capazes do mesmo espírito de sacrifício dos que, abnegadamente e há quase um ano, têm mostrado serem profissionais irrepreensíveis.
Daí não se estranhar que, logo no início da pandemia, os hospitais privados tenham transferido pacientes com essa doença para os do setor público. E que, agora, para justificarem a continuidade do fluxo de dinheiro do orçamento do estado continuamente derramado em seu proveito, se disponham a oferecer meia dúzia de camas para parecerem comprometidos com a resposta coletiva à crise sanitária. Uma cortina de fumo para manter enganados os que teimam em continuarem a sê-lo.
O que toda esta situação demonstrou é que os grupos privados apostados em fazerem da saúde um negócio existem para garantirem lucros chorudos aos seus acionistas, porque a resposta às necessidades efetivas da população só o Serviço Nacional de Saúde estará em condições de satisfazer.
Na mouche, meu caro Jorge Rocha!
ResponderEliminarSei por experiência própria que assim é.
ResponderEliminarNem de propósito:
ResponderEliminar"Foi com a mãe, de provecta idade, infectada com a Covid 19 para o Hospital privado da CUF. De lá foi imediatamente recambiada para o hospital público de Santa Maria. Na televisão indignada por estar há horas à espera para ser atendida. Um ensaio sobre a estupidez num telejornal perto de si."
(Retirado do blog der Terrorist)
Conheço esses meandros por experiência própria, ou melhor, por os ter sentido na pele.
ResponderEliminarParabéns pelo comentário e que os mais céticos reflitam um pouco sobre o assunto.