1. Ao fim da tarde fiz zapping pelos canais das notícias e deparei com o espetáculo patético de dois náufragos a acenarem ao país a pedirem socorro para a solidão em que se sentem cingidos. O Chicão a querer evitar a todo o custo, que vá por diante o Congresso exigido por Adolfo Mesquita Nunes a fim de o apear do poleiro onde foi perdigão a perder as penas, não havendo males que lhe não venham. Por seu lado Rio a querer afastar-se o mais possível da colagem da ignóbil criatura, que a ânsia do poder nos Açores só facilitou e agora não vê como dela despegar-se. Até por sentir a bipolaridade de uns dias se resignar com ser essa a única hipótese de se alcandorar à governação enquanto noutros sabe certos quem o avisa das consequências desastrosas de cair em tal tentação.
Perante os jornalistas os dois comungados aliados lembravam outros tantos noctívagos saídos de um qualquer bar para a noite escura sem encontrarem candeeiros acesos a iluminarem-lhes o caminho. Condenados a irem aos tombos, iludem-se com o seguirem de braço dado para não tropeçarem nem embaterem em imprevisíveis obstáculos. A aliança agora reafirmada para as autárquicas mais não é do que a confissão de fraqueza de dois líderes partidários com a noção de verem o seu prazo de validade a esgotar-se.
2. Não há médicos nem enfermeiros disponíveis no mercado para socorrerem o Serviço Nacional de Saúde neste estado de emergência. Os que sobravam há muito passaram a integrar os turnos dos hospitais de norte a sul do país. No entanto, e prosseguindo numa mistificação à medida da sua desonestidade intelectual, Francisco Louçã continua a perorar quanto à urgência do governo contratar uns e outros em vez de questionar, por exemplo, a Ordem dos Médicos por, há muito, manter um inaceitável numerus clausus no acesso aos cursos de medicina. Exijam-se contas ao bastonário quanto às razões corporativas porque tem dificultado o acesso à profissão de tantos jovens, com provável vocação para virem a ser excelentes médicos, mas aos quais as inacessíveis médias nacionais privam de acederem a tal futuro.
3. No capítulo das mistificações esta crise sanitária tem conhecido outras não menos desonestas. Uma das que vem-se aclarando nos últimos dias é sobre a suposta capacidade dos hospitais privados em suprirem as faltas de camas e de recursos humanos nos do Serviço Nacional de Saúde. Ora o que vemos? Quando há doentes para eles transferidos para serem operados ou cuidados do covid ou outras doenças, verifica-se que os hospitais públicos fazem acompanhá-los de médicos a eles vinculados, porque só assim têm garantido o seu tratamento. Ainda hoje as notícias revelavam mais um desses exemplos com doentes do Hospital Amadora-Sintra transferidos para o da Luz: quem deles irá cuidar nas camas disponibilizadas por essa entidade privada serão médicos do hospital público. Porque, de outra forma, essa «complementaridade» entre os privados e o SNS não seria sequer possível.
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