quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Uns estragam, os outros reparam os danos passados


1. A meio do verão as mentes lusas andaram desaustinadas, porque a Web Summit planeara convidar Marine Le Pen para discursar no evento deste ano.
Não faltaram vozes escandalizadas para zurzirem na putativa oradora pedindo ao governo que exigisse a pronta revogação do convite a pretexto da condição de patrocinador ativo. Avisado, António Costa reagiu com o prudente - e inteligente! - comentário de não lhe caber a escolha de quem viria ou não, por ser matéria exclusiva dos organizadores.
Os mais lúcidos adivinharam nessa utilização do nome de Le Pen uma estratégia de Paddy Cosgrove para fundamentar a mudança de ares para cidade disposta a melhorar significativamente o patrocínio à sua organização. Acaso o governo ou a Câmara de Lisboa agissem no sentido de beliscar a autonomia de decisão dos organizadores, logo estes alegariam tal facto para se porem a milhas.
Agora que estão acordados mais dez anos de Lisboa como capital da Web Summit, o mesmo Cosgrove reconhece ao «Expresso» a pressão que Madrid, Valência e Bilbau estavam a fazer na altura para passarem a receber o encontro anual das start ups das novas tecnologias. E como Medina e Costa terão feito tudo quanto estava ao seu alcance para que Portugal não perdesse o estatuto de país particularmente vocacionado para a economia do futuro.
Não seriam necessárias mais demonstrações para confirmarem a superior inteligência de um e de outro face  aos líderes das direitas desavindas, que continuam a prender-se com trivialidades gelatinosas (mas com as quais fazem ruidoso alarido) e não vislumbram nada de substantivo para além da espessa neblina, que só lhes permite olhar para o próprio umbigo.
2. Outro dos grandes políticos com que o Partido Socialista conta para o presente e para o futuro - Pedro Nuno Santos - participou num encontro promovido pela Associação 25 de Abril, e voltou a um dos temas por que tem revelado persistente preocupação: a forma despudorada como as direitas têm pretendido assenhorear-se do vocabulário das esquerdas, mormente da palavra «Liberdade».
Mas a Liberdade reivindicada pelas direitas não é a da comunidade, a do interesse coletivo. É sim a individualista, a egoísta, a que detesta a solidariedade para quem mais precisa. Por isso mesmo a «liberdade» das direitas “serve para que o Estados e vá retirando das suas funções sociais», seja na Saúde, na Educação ou na Segurança Social.
3. Contra as mesmas direitas, sobretudo a do CDS, insurge-se Daniel Oliveira numa crónica em que considera uma pouca vergonha a campanha feita por Cristas & Cª sobre os problemas por que passa o setor ferroviário. Fiquemo-nos com um trecho desse repúdio:  De 2013 a 2017, o presidente da CP, nomeado por Passos Coelho, foi Manuel Queiró, ex-deputado, ex-governante e quadro dirigente do CDS. E é da sua administração o maior desinvestimento, a maior quebra de passageiros e o maior endividamento que a CP conheceu. Não se trata aqui de saber quem foi o pior, trata-se de recordar o óbvio: que o colapso não foi coisa súbita. Resta saber se resultou de falta de estratégia ou do oposto. É que em 2020 teremos a liberalização do transporte ferroviário de passageiros. Longe de mim levantar qualquer dúvida sobre o empenho dos vários partidos, e do CDS em particular, na defesa dos serviços públicos. Aí estão os CTT para provar que só isso os move.
4. E para concluirmos com mais uma constatação da política de terra queimada perpetrada pelos governos das direitas nos últimos quinze anos em Portugal aí está o «Público» a fazer capa com a decisão criminosa de Vítor Gaspar em 2011, quando decidiu integrar os fundos de pensões da Banca no Estado, transferindo para este as responsabilidades pelo pagamento das reformas de 27 mil aposentados. Ora, sete anos depois, mais de metade da verba transferida para iludir o efetivo descalabro nas contas públicas já foi gasta, não tardando o dia em que o orçamento terá de suprir a inexistência de verba para manter essa obrigação.
No fundo Gaspar limitou-se a replicar outra desastrosa decisão de Manuela Ferreira Leite, quando era ministra das Finanças de Durão Barroso e, por idêntica razão, transferira para o Estado o fundo de pensões dos CTT. Sete anos depois já a verba tinha sido gasta e passou a ser o Estado a colmatar essa falta.

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