sexta-feira, 17 de julho de 2020

Um alegado menino de coro e a deputada que nele não crê


Confesso que Mariana Mortágua suscita-me reações ambivalentes: umas vezes admiro-a pela indubitável competência de economista capaz de analisar a realidade com a profundidade necessária para dela extrair leitura consistente; noutras a forma como o faz lembra-me aquelas pespenetas muito seguras de si, que não admitem contraditório como se essa leitura representasse A Verdade, em vez de uma das verdades possíveis de acordo com a maior ou menor atenção dada a outras variáveis do mesmo contexto.
Vem isto a propósito do que José Maria Ricciardi disse ontem na SIC Notícias e constitui repugnante manifestação de um estado de alma muito comprometido por tudo quanto andou a fazer nestas últimas décadas. Ao dizer, preto no branco, que “Mariana Mortágua devia ter vergonha, devia desaparecer de vez” não só insinua simpatias com o Aldrabão, que fez de inocente palavra uma ferramenta estratégica para vender serôdias atoardas populistas, como lhe aduz asquerosos propósitos implicitamente homicidas.
O que levou o antigo presidente do Banco Espírito Santos de Investimento a perder assim as estribeiras? Apenas as oportunas dúvidas da deputada bloquista sobre o alegado desconhecimento sobre as crescentes falcatruas engendradas pelo primo para salvar o falido Grupo onde sempre fizera carreira.
Ricciardi merece-me o mesmo respeito, que dedico aos ratos em fuga de um qualquer navio prestes a afundar-se: enquanto ele lhe assegurava os rendimentos e o estatuto de cortesão de quem todos à volta reconheciam como Dono disto Tudo nunca se lhe viu qualquer escrúpulo com as manigâncias financeiras implementadas para tornar possíveis tais privilégios. Foi quando sentiu a água a pisar-lhe os calcanhares, que mandou às malvas as cumplicidades familiares e quis, avant la lettre, assumir o papel de denunciante recompensado. E é nessa condição que a SIC - quartel-general da propaganda dos que anseiam tomar o lugar de Salgado como DDT - lhe dá tempo de antena.
Entre o seu curriculum de ganancioso - como o são todos os banqueiros privados - e as dúvidas da deputada do Bloco não vacilo a favor de quem me situo. Até porque só na mente nebulosa de Ricciardi haverá o convencimento de passar por inocente menino de coro nos ouvidos dos que ainda têm peregrina paciência para o escutar.

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