Quatro generais sentiram-se assustados com a irrelevância progressiva das Forças Armadas e encontraram nessa insatisfação um bom argumento para espicaçar a conflitualidade entre Marcelo Rebelo de Sousa e o governo decidindo enviar ao primeiro uma missiva a solicitar-lhe intervenção. Ao mesmo tempo soube-se que os concursos de recrutamento, recentemente abertos, primaram pela indiferença de quantos poderiam estar interessados em vestir a farda.
Quanto aos generais Marcelo passou-lhes ao largo de fininho aludindo a uma atitude coletiva de desinteresse dos portugueses pelos assuntos e oportunidades das carreira militares. E não lhes deu troco relativamente ao ensejo de criticar o governo, tanto mais que sabe importantes os votos dos eleitores socialistas que, hélas!, continuam a considera-lo presidenciável. Mas mais eloquente é essa indiferença dos jovens relativamente às Forças Armadas. Será de estranhar que, depois das notícias sobre a morte de alguns deles em exercícios militares, que relevaram do sadismo dos instrutores, ainda haja quem se arrisque em seguir-lhes as pisadas? E que futuro pode esperar um jovem depois de sucessivas comissões até passar à reserva quando outra alternativa de sustento não encontra que não seja a de integrar as diversas polícias, insuficientemente remuneradas e infiltradas de gente pouco recomendável?
Em tempos idos, e olhando para exemplos como os da Suíça ou Costa Rica, diria que as Forças Armadas são um vertedouro de dinheiro improdutivo, que seria melhor aplicado nos investimentos do Estado na saúde ou na educação. Mas isso seria numa conjuntura ideal, que, atualmente, não justifica rebate pacifista. Hoje há na Espanha um partido fascista, que faz cartazes a nela integrar o território português, demonstrando que as conhecidas ambições expansionistas de Franco continuam a ter inquietantes herdeiros. Há, igualmente, a necessidade de satisfazer as solicitações da comunidade internacional, sobretudo da ONU, para integrar militares portugueses nas suas missões em África ou na Ásia. Importa manter o controlo do espaço aéreo fazendo-o corresponder rigorosamente ao traçado das nossas fronteiras terrestres e marítimas. E há, sobretudo, a relevância estratégica de assegurar uma soberania muito ativa na importante área marítima reconhecida internacionalmente como pertencente a Portugal e onde os recursos naturais, incluindo os piscícolas, têm de ser defendidos da avidez alheia. Todos esses factos legitimam as preocupações dos quatro generais conquanto despojadas da intenção intriguista, que lhes pareceu motivar a tomada de posição. Mas as Forças Armadas, para além de esbanjarem verbas na anacrónica contribuição para a NATO, também devem ser repensadas de forma diversa da tradicional em que cada oficial tem de comandar diversos sargentos, que por seu lado exigem números mais alargados de cabos e ainda maior vastidão de recrutas. Se a realidade já demonstrou a impossibilidade de manter essa visão cristalizada das Forças Armadas importa que elas se dotem, sobretudo de oficiais com especializações consonantes com as importantes missões a serem-lhes confiadas, modernizando-se para constituírem instituições viradas para o futuro.
Sem comentários:
Enviar um comentário