quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

A inominável e parasitária criatura


Há muitas formas de abordar o debate quinzenal de ontem na Assembleia da República, mas uma sobrepõe-se a todas as demais: enquanto as esquerdas mostraram-se veementes com o episódio criminoso de Guimarães, quando um bando de energúmenos manifestou o ignóbil racismo, que lhes vai nas turvas mentes, as direitas, pelo contrário, quedaram-se no silencioso comprometimento de quem se sabem confrontadas com assunto capaz de lhes estragar as estratégias futuras. Porque estas carecem de um imaginário coletivo analfabeto e emocionalmente orientado para as distrações suscitadas pelos preconceitos como forma de imporem opções ideológicas consonantes com os interesses de quem, na retaguarda, as financia. Por isso, quando sentem um enorme clamor a levantar-se em prol de um valor que lhes é estranho - a dignidade dos humilhados e ofendidos - sabem instável a estrutura de segmentação da sociedade em classes desiguais tão do seu agrado. Por isso silenciaram-se, acoitando-se na cobarde retirada de um  campo de batalha onde se sabiam em risco de um resultado hostil.
Houve, porém, o breve, mas elucidativo, momento de confronto entre António Costa e a inominável criatura, cuja presença no hemiciclo é, por si só, uma ofensa aos valores contidos no texto constitucional. Que aquele a quem Rui Tavares designa como “parasita” na sua crónica de hoje não tem a mínima pinga de decoro viu-se nas suas palavras, mas, sobretudo, na atitude corporal. Porque António Costa confrontou-o com o ter-se eximido em ali, cara-a-cara, afirmar aquilo que vem repetindo nas redes sociais nos dias mais recentes mas, em vez de o fazer, trouxe mais uma fatura que, por certo, teria o mesmo destino das anteriormente apresentadas em arruaça similar e depois rapidamente desmascaradas quanto á sua veracidade. Costa aceitou-lhe a oferta de receber de bom grado essa «prova», mas decerto pode sentar-se à espera, não só porque o tratante não quererá ver.se novamente desmascarado como trapaceiro, mas sobretudo por facilmente se vir a identificar a «mão amiga», que lho terá facultado.
Rapidamente posto em xeque ao primeiro movimento no tabuleiro retórico logo escolheu colar-se ao seu émulo no TIC, pondo em causa a legalidade da publicação da resposta ao famoso documento das cem perguntas. E aí ouviu o que nem ele, nem o conjuntural aliado, gostariam de ouvir: as provas de quem começou por violar o segredo de justiça são tão óbvias, que implicam eloquente ricochete. E ambos terão esquecido que António Costa foi eminente jurista antes de aceder às mais significativas responsabilidades políticas. O facto do segredo de justiça deixar de existir quando se conclui a fase de inquérito num processo demonstra que as provocações do justiceiro de Mação saldar-se-ão numa mão cheia de nada, outra de coisa nenhuma.

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