Sabe-se que Benito Mussolini era um cobarde: quando mandou invadir a Etiópia, para alimentar uma campanha de propaganda capaz de iludir milhões de italianos, enviou tanques, aviões e armas químicas contra um exército cujos meios defensivos não admitiam a mais pequena comparação. E, no entanto, na impressionante manifestação de 18 de setembro de 1938 em Trieste, centenas de milhares de seus admiradores celebraram-no como grande herói nacional. (Quantos deles celebrariam menos de seis anos depois a macabra exposição do seu cadáver, quando essas ilusões se haviam convertido em terrível pesadelo?)
No discurso desse dia, o ditador italiano decidiu dar mais uma guinada nas suas incoerentes opiniões. Embora assumidamente racista, pois fora sob a alegação «científica» da inferioridade dos negros que, às suas custas, quis fundar o império em África, ele não se virara até então contra os judeus. Pelo contrário até lhes endereçara palavras simpáticas quando, de alguns deles, colhera elogios pela «obra« em curso. Mas, nesse dia, anunciou as leis racistas que, aprovadas dois meses depois, condenaram os judeus italianos ao mais rigoroso ostracismo, levando os que podiam a rapidamente atravessarem o oceano para juntarem-se aos familiares acoitados em território norte-americano e os outros a optarem pelo suicídio ou a desesperarem na expetativa do momento em que se se veriam enfileirados e enviados para um destino desconhecido, depois crismado com os nomes de alguns dos mais horrendos campos de morte. De um momento para o outro, e para agradar a Hitler de quem pretendia obter proveitosa boleia e colher as sobras do banquete expansionista, Mussolini acabou com a proteção da Casa de Saboia aos judeus italianos e que lhes valera, no século anterior, a saída definitiva dos guetos a que estavam cingidos.
Cobardia de quem se julga forte e se dispõe a espezinhar os mais fracos é o que se viu ontem em Guimarães com uma turba fascista a invetivar um futebolista só por ser negro. Uma vez mais demonstra-se a urgência de se proibirem as claques de futebol tão evidente é o caldo de cultura, que lhes potencia o arreigado racismo dos seus apaniguados. Nesse comportamento de seita convencida de tudo poder por ser menor a força de quem toma por ódio de estimação, está escarrapachada a essência do fascismo mais primário.
Mas desconfio que, nos próximos dias, também o candidato a duce lusitano sentirá a urgência de ler o clima criado à volta deste caso e imite Mussolini no oportunismo com que mudava de opinião: sendo tão veemente a condenação pública do comportamento ultrajante dos adeptos vimaranenses, o tratante deverá engolir as palavras de apoio a eles endereçadas apressadamente e que arriscam a deixá-lo isolado no Parlamento onde este assunto não deixará de ser abordado. Ora já vimos que os fascistas adoram agredir em grupo, mas fazem tudo por escapar com o rabo entre as pernas, quando se sentem sós. E com Marcelo e António Costa a juntarem-se ao ruidoso coro de personalidades e de gente anónima, que se envergonha com a imagem do país dada pelos criminosos de Guimarães, será provável ver o seu defensor a arranjar uma desculpa esfarrapada para se ausentar da previsível condenação. Para ele a coerência com o que pensa não bastará para que a ela se agarre quando os ventos lhe não sopram de feição...
Sem comentários:
Enviar um comentário