1. Confesso que João Leão fora-me completamente indiferente até ser nomeado sucessor de Mário Centeno. Uma ou outra vez ter-me-ei questionado quem era aquele senhor careca ao lado do ministro, mas sem a curiosidade motivar-me a ir mais além. Agora que já lhe ouvi a voz na Assembleia da República a defender o Orçamento Suplementar confesso-me agradado. Se Centeno começara por parecer algo desajeitado nos primeiros embates mediáticos, suscitando o gáudio de Passos & Cª, que não adivinhavam como a mofa depressa se lhes transformaria em azia, Leão parte de patamar mais confortável. E a forma como aconselhou o presidente do Novo Banco a concentrar-se em gerir bem aquilo que tão maus resultados vem acumulando trimestre após trimestre, faz pensar que não lhe passarão facilmente a perna.
Para já dececionou quem quereria aproveitar o discurso austeritário para lançar campanha contra o governo: nem aumentos de impostos, nem cortes em salários nem pensões. A afirmação taxativa terá posto as bancadas das direitas a darem voltas à cabeça sobre o que poderão argumentar para o exercício de maldizer. Mas, mais à esquerda, haverá alguma razão em quem constata quanto têm sido as grandes empresas, e sobretudo as financeiras, a mais ganharem com os apoios criados para contrariar a pandemia.
2. Sobre as pichagens na estátua do Padre António Vieira aventei aquilo que não há quem me venha contrariar: a possibilidade de terem sido feitas por provocadores de direita que assimilam as mesmas táticas dos suprematistas brancos norte-americanos relativamente às manifestações antirracistas em que, descaracterizados, se infiltram para causar-lhes a pior imprensa através dos saques a lojas e a incêndios de viaturas. Mas subscrevo o que escreveu Eduardo Pitta no seu blogue a propósito da estátua em causa: “O mamarracho é muito mau (como grande parte da estatuária portuguesa), mas a sua vandalização não leva a lado nenhum. Isto dito: não faz sentido ter encomendado e construído a obra em 2017, nem faz sentido ter aquilo numa zona nobre da cidade.”
3. Donald Trump vai tendo, entretanto, motivos para execrar as livrarias onde, por estes dias, se lançam sucessivos títulos, que dão dele um retrato tão fiel quanto comprometedor: Melania terá renegociado o contrato pré-nupcial para aceitar fazer de figurante a seu lado e só então se mudou de Nova Iorque para Washington. John Bolton, que com ele trabalhou uns meses, tal qual fizera com todos os presidentes republicanos nas últimas décadas, constata ter testemunhado ações muito mais graves do que a do célebre telefonema para o presidente ucraniano e que maior justificação dariam para um incontornável impeachment. A sobrinha põe logo no título aquilo que fundamenta no interior: ambos pertencem a uma família disfuncional onde os traumas e abusos aconteceram desde a infância de ambos e explicam a natureza patológica, que o levou a tornar-se no homem mais perigoso do mundo.
4. E se a mais eficiente machadada na deslocalização de negócios imposta pela lógica da globalização fosse a de imputar a cada produto a sua pegada ecológica? O aquecimento global justifica-o e impõe menores emissões de gases para a atmosfera se se reduzir a atividade transportadora entre países cujo comércio assenta em mercadorias, que podem ser produzidas localmente e relançar indústrias hoje moribundas na Europa. A ideia anda a fazer o seu caminho em França e poderá assegurar uma mudança muito racional dos paradigmas vigentes.
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