domingo, 21 de junho de 2020

Duas palavras que não se podem usar


Três dias atrás José Saramago foi insuficientemente lembrado apesar de se cumprirem dez anos sobre a sua morte. O país que tanto o maltratou durante o negro consulado cavaquista,  continua a destratá-lo não faltando quem recorra a fúteis argumentos para procurar lançar um véu opaco sobre a impressionante grandeza da sua escrita. Não admira, pois, que Lanzarote o reivindique como seu - como ainda há pouco vi numa excelente reportagem francesa nessa ilha das Canárias - já que o país parece alhear-se da importância do seu único Nobel da Literatura.
Nas brevíssimas evocações houve, porém, quem recordasse uma máxima do escritor: “Há duas palavras que não se podem usar: uma é sempre, outra é nunca.” Numa outra versão alternativa Brecht escrevera sobre a importância de, aquele que está vivo,  nunca dizer nunca. Ou trocado por miúdos, que mesmo tendo falhado sucessivamente em tentativas de implementação em diversos contextos geográficos, o Socialismo acabará por encontrar a solução para acabar de vez com o iníquo sistema de exploração do homem pelo homem. A exemplo do que lembrava José Mário Branco sobre o inventor da cura da sífilis, enfim bem sucedido depois de mais de novecentos testes falhados.
Nunca é palavra proibida. Sobretudo para aqueles que atribuem falsamente a Einstein uma frase profundamente reacionária, só do interesse de quem pretende evitar a transformação progressista das sociedades: “insanidade é fazer a mesma coisa repetidamente e esperar resultados diferentes”. E, mesmo que o cientista alemão a tivesse dito não seria por isso mesmo, que ela se revelaria verdadeira, porque sabemos bem como ele também em alguns aspetos se revelou incapaz de aceitar a evidência dos seus cálculos, como sucedeu com os buracos negros em que nunca quis acreditar.
A frase de Saramago vem, igualmente, a propósito do que a edição do «Libération» de amanhã traz como notícia de capa: depois de ter sido dada como moribunda, senão mesmo declaradamente morta, a esquerda francesa encontrou a resiliência necessária para, daqui a uma semana, sair claramente vencedora na segunda volta das municipais. Para além dos seus mais importantes feudos - mormente Paris - outras cidades, ainda há pouco dadas como inacessíveis, como Toulouse, Marselha, Lyon, Bordéus, Montpellier ou Tours, deverão ser suas. E anunciam-se calamitosas derrotas para Marine Le Pen e Macron.
Se isto não serve para confirmar a justeza da frase de Saramago, não sei que outra evidência seja necessária.

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