sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Cadê os outros?


O folhetim sobre as fortes suspeitas de corrupção de Isabel dos Santos propicia boas audiências à SIC e provável aumento de tiragem do «Expresso». Mas quando se deixam implícitas as suas relações com o poder político e económico em Portugal, não se referem as evidentes cumplicidades com quem mais delas buscou associar-se no esbulho das riquezas angolanas. Paulo Portas andará muito provavelmente a perorar banalidades num canal televisivo, que nunca vejo, sem confessar o quanto terá feito para se fazer muito próximo dos interesses empresariais da família do anterior presidente angolano. E outras «personalidades» do PSD conhecidas pelas suas boas agendas de contactos também seguem alegremente a proveitosa vidinha sem prestarem contas sobre os seus ambíguos proventos, muito provavelmente acautelados em paraísos fiscais.
A questão mais pertinente do momento é, porém, a de saber por quanto tempo durará o folhetim. Se nos lembrarmos dos Panama Papers há a experiência de só perdurar enquanto não escaldar quem a família Balsemão tiver a prioritária preocupação de acautelar. E não deixa de ser curiosa a forma como se estabelecem dois pesos e duas medidas diferentes em relação a matérias facultadas ao conhecimento público por whistleblowers. Que se saiba Rui Pinto continua preso e sujeito a uma condenação, que deixará aliviado quem muito teria a temer com a divulgação daquilo que , na sua atividade de hacker, conseguiu apurar...
Em tempos havia um programa humorístico da Globo que, a respeito de ladrões apanhados na rede da Justiça, questionava onde estavam os outros. E é um pouco isso que acontece agora: a filha de Eduardo dos Santos aparece enleada numa teia donde dificilmente sairá. Mas onde estão os que com ela pactuaram? E não falo do pobre empregado bancário, que foi a mão que executou uma das operações sob suspeita, mas não teve condições de recusá-la, escolhendo agora o suicídio como forma de se libertar da fraca culpa a que seria indiciado.
Estão em causa os que enriqueceram obscenamente enquanto o povo angolano passava fome, os que eventualmente possam contribuir para que assim continue a suceder, sem esquecer os alvos dos outros lançadores de alertas, cujo papel acaba de ser reconhecido por uma diretiva europeia - a 2019/1937, de  26 de novembro - que deveria já contemplar o arguido do football leaks.

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