Marcelo Rebelo de Sousa voltou ontem a demonstrar quem motiva o interesse em continuar como presidente da República para além do atual mandato. Ao sugerir que aceitou o aumento proposto pelo governo para o salário mínimo em 2020, mas poderá não o fazer em 2021 por ser altura de defender os empresários, dá um sinal claro quanto aos objetivos do segundo mandato se acaso conseguir para ele ser eleito.
O discurso em que anunciou esse incómodo com a prioridade dada aos que menos ganham aconteceu coincidentemente no dia em que o Instituto Nacional de Estatística publicou o relatório alusivo às condições de vida e rendimento relativo a 2018, que deveria ser bem mais risonho do que o é numa altura em que a economia cresceu e as taxas de desemprego desceram para níveis da ordem dos 7%. E, no entanto, apesar de tudo quanto a anterior maioria governamental aprovou em prol dos mais desfavorecidos a taxa de pobreza do conjunto da população só diminuiu 0,1%. E, pior ainda, agravou-se para os empregados, os desempregados e as famílias monoparentais demonstrando que os nossos salários continuam indecorosamente baixos.
Perante dados quantitativos, que se revelam tão elucidativos, soa pior a perspetiva de Marcelo ao considerar já muito ter sido feito em prol dos mais pobres, sendo altura de privilegiar os empresários e os investidores.
Em Belém pode-se argumentar que o rendimento nacional mediano cresceu 7,2% em termos nominais e 6,2% em termos reais ou que o coeficiente de Gini (indicador da desigualdade de rendimentos) baixou de 32,1% para 31,9%, mas quem poderá argumentar contra o facto de ser falaciosa a definição de pobreza, quando dela exclui quem possui rendimentos acima de 501 euros mensais? Será que alguém consegue viver dignamente com tão irrisória quantia?
A pobreza continua a ser uma realidade indisfarçável em parte significativa da população portuguesa, sobretudo naqueles desempregados que, entre os 297 mil atualmente registados no IEFP, dificilmente encontrarão quem os empregue dadas as competências e capacidades de que estão carenciados. E torna-se ridícula a contínua pressão de Marcelo para que o governo acabe com os sem-abrigo quando, por outro lado, quer restringir a solução inerente à valorização significativa dos salários e outras prestações sociais. Será que ele passou a acreditar nos méritos de uma qualquer varinha mágica? Sabemos que não! Marcelo continua apostado em sabotar na medida das suas competências, e amiúde extravasando-as, as estratégias do governo.
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