1. É uma pequena notícia na primeira página, mas bastante elucidativa sobre o que existe dentro da farta cabeça de Assunção Cristas: pouco menos que nada. Daí que tenha decidido escrever aos residentes de Lisboa a pedir-lhes opiniões e ideias para inserir no seu programa eleitoral às autárquicas da capital.
Espanta que, entre os seus assessores, não haja quem lhe diga o óbvio: mesmo não tendo um projeto político para apresentar, convirá aparentar que o tem…
2. Por norma quando começo a ler um texto assinado pelo Martim Silva a minha predisposição é esta: se a sua opinião é uma, a minha é a contrária. Mas, desta feita, há algo que consegue unanimizarmo-nos: Donald Trump. Não posso estar mais de acordo quando, em função destas duas semanas na Casa Branca, o desqualifique como “arrogante, autoritário, vingativo, mesquinho e em permanente bullying sobre tudo e todos”.
3. Ricardo Costa também não está nas minhas simpatias, mas a propósito de passarem hoje 56 anos sobre o início da insurreição angolana, que haveria de conduzir à independência em 1974, concordo com o veredito de “país adiado”. Pelo menos enquanto a família de Eduardo dos Santos continuar a deter o poder económico, mesmo prescindindo formalmente da vertente política.
4. Pelo menos engenhosa a metáfora utilizada pelo Pedro Santos Guerreiro a propósito do acordo conseguido com os patrões na concertação social: “se os economistas negoceiam usando a teoria dos jogos, o Governo criou a teoria dos fogos. Apagou-os todos, ainda não se apagou em nenhum.”
Parece, igualmente, evidente que o assentimento dos patrões a esta aparência de acordo tem uma contrapartida bastante danosa para quem trabalha: o adiamento por mais um ano da reversão das leis laborais, que Passos Coelho tinha alterado de modo a desequilibrar ostensivamente a proporcionalidade de forças com os sindicatos.
Serão necessários grandes sucessos na redução do desemprego, no crescimento da economia e na travessia, por entre os pingos de chuva, das crises internacionais anunciadas para que se reduzam as injustiças agravadas nos quatro anos das entroikadas criaturas e os trabalhadores possam contar com deveres, mas também com direitos equiparados…
5. Os números não enganam: dez anos depois do referendo que despenalizou o aborto, as mortes resultantes da sua prática clandestina ficaram reduzidos a zero e as Interrupções Voluntárias de Gravidez têm decrescido, sendo raras as reincidências. A maioria das mulheres em causa terá optado, doravante, por tomar contracetivos.
Eis um número com que Marcelo se deveria regozijar, fazendo ato de contrição por se ter oposto o mais possível a esse avanço civilizacional.
6. Numa altura em que a morte assistida está na ordem do dia, o médico Bruno Maia explica a ilegitimidade da eventual objeção de consciência por quem deveria apoiar o solicitante a cumprir a vontade: “não faz sentido ser médico se isso significar colocar os meus interesses, crenças ou a minha moral acima dos interesses dos outros. A morte assistida é uma decisão individual de alguém cuja vida terá um fim próximo e o médico que assiste a morte está a respeitar essa escolha”.
7. No mesmo sentido pronuncia-se outra médica, e fervorosa católica, Maria Xavier, que até enfatiza a contradição dos que invocam Deus para impor a sua vontade aos outros: “Temos o livre arbítrio - os que são contra a eutanásia esquecem-se disso -, que foi Deus que nos deu. Nós é que temos o direito de decidir sobre a nossa vida. E sobre a nossa morte.”
8. Raramente tenho concordado com os textos assinados por Miguel Sousa Tavares mas, desta feita cumpre-se a exceção, que satisfaz a regra. Depois de se insurgir contra as decisões recentes dos tribunais em favor de Gonçalo Amaral contra os pais de Maddie McCann e de António Ventinhas contra José Sócrates, comenta o depoimento recentemente feito por Hélder Bataglia e tão enfatizado pelos que quiseram garantir a condenação publica do antigo primeiro-ministro e nunca o conseguiram provar na Justiça: “o acordo que fez não foi simplesmente para vir prestar declarações, mas para vir dizer aos autos aquilo que o dr. Rosário Teixeira queria que ele dissesse. Esse é o preço que se paga com a delação premiada: nunca se sabe se o delator disse a verdade verdadeira ou a verdade conveniente.”
Por isso mesmo, perante a possibilidade de Bataglia ter vindo prestar-se ao papel de dizer o que pretendia Rosário Teixeira, este terá evitado o embaraço de nada ter a apresentar no dia 17 de março. As provas até poderão cair em tribunal e confirmar que, como José Sócrates tem reiteradamente afirmado, tudo não terá passado de um embuste, mas enquanto o pau vai e volta - um processo desses arrastar-se-á anos nos tribunais - as costas dos que o terão perpetrado andarão folgadas.
9. Abordando o fenómeno Trump, Pedro Adão e Silva rejeita o seu propósito reformista nas instituições do pós-guerra, pois identifica-lhe clara intenção de rutura. Por isso, globalmente, a prioridade tem de ser outra: “perceber como lidar com um fenómeno novo e que veio para ficar”.
10. Daniel Oliveira prefere retroceder às condições que possibilitaram a vitória de Trump e o crescimento dos populismos de extrema-direita na Europa. Nelas houve a indução de medos islamofóbicos nas populações - com semelhanças com o anterior antissemitismo - e que teve até o aval de alguma esquerda menos estruturada. “Este ambiente geral favoreceu a estratégia dos grupos terroristas, apostados em criar um fosso intransponível entre o Ocidente e o mundo muçulmano. Os atentados aconteceram quase sempre onde havia pasto para as chamas da xenofobia.”
Trata-se de compreender o que ainda tem sido sonegado à maioria dos eleitores: que, embora odiando-se entre si, os melhores aliados da extrema-direita e do terrorismo islâmico são respetivamente o terrorismo islâmico e a extrema-direita. Como na eletricidade os opostos atraem-se irresistivelmente...
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