quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

O que mais ela não saberá?

 

Neste que foi o dia de nos despedirmos de Eduardo Lourenço voltámos a ter notícias de quem se escusa a seguir-lhe o exemplo de tudo pensar antes de ajuizar consistentemente aquilo que lhe suscitou alguma afirmação. Trata-se, obviamente, de Ana Gomes, que cometeu uma ilegalidade ao mandar vir de França a vacina contra a gripe, que não encontrou disponível entre nós.

O que ela fez foi, a vários títulos censurável. Em primeiro lugar veio para as redes sociais gabar-se do facto nele julgando matéria bastante para satisfazer o seu hobby predileto: tiro ao alvo ao governo e ao primeiro-ministro, acusados de não conseguirem vacinar contra a gripe todos quantos ansiariam fazê-lo. Sem a ponderação, que alguém de bom senso a si próprio imporia, ela sentiu a pulsão do escorpião perante a vítima e ei-la no seu esplendor a disparar na direção, que não perde uma ocasião para o fazer.

Em segundo lugar veio alegar que desconhecia ser ilegal aquilo que fez. O que nos leva a questionar o que mais ela não sabe e seria fundamental que conhecesse antes de se candidatar ao cargo de Presidente da República? A ignorância quanto ao que é legal ou ilegal, quando assim confessada, faz prova da sua inequívoca irresponsabilidade.

Em terceiro lugar decidiu libertar-se do incómodo em que ela própria se acossou e questionou a legitimidade da lei, como Donald  Trump não enjeitaria igualmente fazer. Para Ana Gomes se uma lei da República não lhe serve logo considera que deve ser mudada. Como se o interesse de uma só pessoa justificasse a alteração da lei que todos consideram justificada e cumprem.

Em quarto lugar Ana Gomes tem uma noção muito singular do sentido de igualdade entre os cidadãos, porque em vez de aceitar as contingências inerentes a ainda não ter conseguido chegar à almejada vacina, encontrou forma de se antecipar a todos os nela interessados, alcançando-a através de uma mão amiga. Forma exemplar de quem tem enchido a boca com condenações à corrupção alheia e, afinal, logo contornando a dificuldade  através de um tipo de jeitinho, que praticado por outrem, mereceria a sua indignada reprovação!

E, finalmente, Ana Gomes despreza o exemplo de Eduardo Lourenço no não saber, nem querer saber onde reside o problema da falta de vacinas, antes de se armar na tosca pasionaria dos que continuam por ver garantida essa proteção.  Se o insigne pensador, agora tão incensado, muito pensou o país antes de sobre ele dar profundo contributo, Ana Gomes faz o contrário:  quer ostensivamente ignorar as razões, que levam as farmacêuticas a produzir mundialmente um número de vacinas muito aquém das necessárias atualmente no mercado. Ora ela não sabe nem quer saber que nenhum governo, nem nenhum primeiro-ministro conseguem fabricar vacinas, nem distribui-las de acordo com as suas boas intenções. Mas vão lá dizer isso a quem faz da candidatura a Belém mais um exercício narcísico de querer ocupar lugar destacado no palco e quiçá legitimar ambições futuras consonantes com aquilo que dela nunca poderemos esquecer: que sempre conviveu mal com o resultado das primárias de 2014 e nunca se conformou com o facto de António Costa ter conseguido formar governo com os partidos, que lhe garantiram estabilidade na legislatura anterior e continuam hoje a mantê-la.

Daí reitero uma vez mais o que aqui tenho defendido: como militante socialista a caminho dos quarenta anos nunca por mim passaria pela cabeça apoiar uma candidata, que tem vestido pele de socialista, mas tem escondido mal a sua verdadeira natureza, que está bem à vista debaixo de tal disfarce. E garanto-vos que para tal dizer, muito o pensei, muito o ponderei nos seus prós e nos seus contras.

1 comentário:

  1. Jorge Rocha, poupe-nos as suas reflexões. A sua posição sobre Ana Gomes é há muito conhecida. Por boas e más razões (nomeadamente o facto de o Jorge Rocha se recusar a reconhecer que Sócrates é um mau carácter) o Jorge Rocha decidiu que não queria ter nada que ver com ela, o que é legítimo. Podia era deixar-se deste exercício de algo que não é bonito. Você está acima disso.

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