Numa altura em que os números do covid atingem máximos ganha ainda maior sentido a afirmação de António Costa quanto à necessidade de se revelar bom senso na definição do próximo Orçamento. Se uma negociação pressupõe, que ambas as partes saem delas com a sensação de terem ganho alguma coisa, está a revelar-se exasperante a atitude dos dirigentes do Bloco de Esquerda, que teimam num desiderato feito de ganhos para eles e de perdas para quem efetivamente governa. Indecorosa tem sido, igualmente, a atitude de vir para a praça pública anunciar divergências insanáveis, quando as negociações ainda prosseguem e deve a todos comprometer com a exigência imposta pelas circunstâncias atuais: a de se chegar a bom porto.
Esta reiterada demonstração do Bloco em livrar-se dos tais tiques que Lenine classificava como infantis embate, igualmente, com uma evidência há muito cristalizada: por muito que procurem pôr em causa o governo socialista, as sondagens demonstram que, a haver quem ganhe com as divergências à esquerda, são sempre a direita e a extrema-direita quem beneficiam com o facto. Ora se ainda persiste a tal bolha, que António Costa designa como politico-mediática, destinada a menorizar as esquerdas em proveito das direitas, acaba por ser insensata a teimosia em querer tudo já quando passos mais prudentemente conquistados nessa direção vão sendo dados à medida da perna.
Na entrevista ao «Público» António Costa refere o exemplo de José Manuel Pureza, que teria proclamada a possibilidade de nem sequer haver orçamento, porque poderia sempre governar-se à conta dos duodécimos. E realmente é de espantar que um político, que até parecia revelar alguma solidez estratégica, tenha proferido tal enormidade. Nesta altura de crise faz algum sentido governar como se ela nunca tivesse existido permitindo-nos prosseguir de acordo com os condicionalismos de um passado já tão distante? Daí que Costa conclua que “o mínimo de respeito que podemos ter por esta realidade social é fazermos tudo o que estiver ao nosso alcance para assegurar ao país um OE. O OE não é para o Governo, é para o país.”
Infelizmente não é só com os demais partidos de esquerda, que António Costa tem de lidar. Lendo a imprensa não falta quem dentro do Partido - o caso de Sérgio Sousa Pinto ou do grotesco secretário-geral da UGT - ou dele tido como próximo como é o caso de Susana Peralta (um dos nomes maiores entre os apoiantes de Ana Gomes), quem fale do primeiro-ministro como se fosse uma espécie de encarnação do Príncipe das Trevas.
Numa altura de toque a rebate, em que importa congregar forças para vencer as dificuldades, a falta de senso alarga-se a fronteiras, que deveriam nem sequer fazer-se lembradas.
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