sexta-feira, 27 de junho de 2025

Um rústico Munchausen à portuguesa

 

Uma fotografia na edição de ontem do “Público”, colhida na cimeira da Nato, é particularmente elucidativa quanto à personalidade de Luís Montenegro e qual a sua relevância junto dos líderes ocidentais.

Se é certo que, muitas vezes, uma imagem vale por mil palavras, esta é exemplo lapidar. A cena capta os participantes da cimeira da NATO em plena interação, trocando ideias e cumprimentos. No entanto, em segundo plano, quase a esgueirar-se da objetiva, surge Luís Montenegro, a quem todos viram costas para a ação central, aparentemente à procura de uma saída discreta, ou talvez, de alguém com quem interagir e não o ignore. A imagem sugere um desconforto visível, um anseio por integração que contrasta vivamente com a aparente autoconfiança que exibe no palco nacional.

Pensamos em Soares, Guterres, Sócrates ou António Costa e todos víamos na primeira fila em diálogo com os seus pares. Ao invés, Montenegro segue na linha de Cavaco ou Passos Coelho que, vindos da província ou duma ex-colónia, e escondiam-se na retaguarda e quase pareciam agradecidos por serem aceites na “festa”. E, se no seu campo politico, Barroso tentava chegar-se à frente, era para a assumida função de mordomo do alheio “conbíbio”.

Este contraste entre a projeção interna de importância e a irrelevância externa evoca de forma irónica a figura do Barão de Munchausen. Para quem não o conhece, trata-se de um personagem literário do século XVIII, famoso pelas suas histórias fantásticas e inacreditáveis de aventuras. Ele era um mestre na arte da mistificação, narrando proezas impossíveis com uma convicção tal que os seus ouvintes, por vezes, acabavam por duvidar da própria realidade. O Barão construía o seu sucesso social e a sua relevância através da ilusão, da invenção de um mundo onde ele era o centro de todas as proezas, ignorando completamente as leis da física e da lógica.

A semelhança emerge quando observamos a forma como Montenegro, perante os graves desafios que Portugal enfrenta – da crise na saúde à escassez de habitação e à crescente pobreza da população –, parece concentrar o fulcro da ação política na questão da imigração. À semelhança de Munchausen, que criava realidades alternativas, o primeiro-ministro inventa a urgência e a prioridade dos problemas reais, elevando um tema à centralidade do debate e da ação governativa de forma desproporcional. A convocação de um conselho de ministros extraordinário para restringir os direitos de imigrantes, que são essenciais para o funcionamento de inúmeros setores da economia e para a sustentabilidade da Segurança Social, parece uma fuga aos verdadeiros dramas nacionais.

Enquanto o país se debate com a subsistência básica, a preocupação prioritária de Montenegro parece ser a de projetar uma imagem de controlo e decisão através de medidas que, ironicamente, desvalorizam a contribuição daqueles que mantêm o país a funcionar. No cenário internacional, a imagem é de isolamento; no cenário interno, a retórica é de um líder que, como o Barão de Munchausen, a criar uma narrativa que, para muitos, se afasta perigosamente da realidade premente.

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