segunda-feira, 23 de junho de 2025

O Espelho Distorcido

 

É fascinante (e, para alguns, assustador) observar como uma parte significativa da população, particularmente do espectro da direita política, parece ter solidificado o seu posicionamento com base no que absorve das redes sociais. Não é um fenómeno aleatório; antes, é uma orquestração quase perfeita dos mecanismos psicológicos que nos tornam vulneráveis à manipulação digital.

Comecemos pela ansiedade. O mundo moderno é complexo, incerto, e frequentemente gerador de angústia. As redes sociais, com o fluxo incessante de informações e o "medo de ficar de fora" (o tal “Fear of Missing Out”), só exacerbam essa ansiedade. A direita e, em especial, a extrema-direita, perceberam essa fragilidade. Oferecem uma panaceia: narrativas simplificadas, vilões claros e soluções radicais que prometem ordem num caos percebido. Para uma mente ansiosa, a gratificação imediata de uma resposta definitiva, por mais simplista que seja, é um bálsamo. A constante exposição a conteúdo que valida medos e inseguranças ("eles vêm aí", "os valores estão a perder-se") alimenta um ciclo vicioso, onde a ansiedade leva à busca por certezas, e essas certezas são prontamente fornecidas pelas bolhas ideológicas das redes.

A depressão e os sentimentos de inadequação são também campos férteis. As redes sociais, ao exibirem vidas editadas e perfeitas, podem amplificar sentimentos de baixa autoestima e frustração. A direita populista, astutamente, capitaliza sobre isso. Em vez de lidar com a complexidade da própria vida, as redes oferecem a "solução" de um problema externo: a culpa é "deles", o país está em decadência, e o caminho é regressar a um passado idealizado que nunca existiu. A gratificação instantânea aqui é a de encontrar um inimigo comum, uma causa maior que desvia a atenção da dor pessoal e canaliza para uma indignação partilhada. A raiva substitui a tristeza, e a pertença a um movimento forte dá um sentido de propósito que faltava.

A baixa autoestima e os problemas de autoimagem, alimentados pela comparação social incessante, encontram nas redes sociais um eco peculiar. Se a validação pessoal é escassa no mundo real, a internet oferece uma plataforma onde a pertença a um grupo ideológico pode suprir essa carência. Ao alinhar-se com discursos fortes e "corajosos", mesmo que controversos, o indivíduo sente-se parte de algo maior, validado pelos "likes" e "partilhas" dos seus pares ideológicos. A nomofobia (o medo de ficar sem o telemóvel), que afeta muitos utilizadores, é o sintoma físico dessa dependência da validação e da compensação imediata que a pertença ao grupo online oferece.

Finalmente, a insatisfação e o vazio existencial, muitas vezes disfarçados de narcisismo, encontram nas redes sociais um palco para a sua expressão. A direita e a extrema-direita oferecem não só um inimigo externo, mas também um espelho que reflete uma versão idealizada do "eu" enquanto parte de um movimento "salvador" ou "revolucionário". A gratificação imediata não vem apenas de ser validado, mas de pertencer a uma elite moral ou intelectual, mesmo que essa superioridade seja construída dentro de uma bolha de algoritmos que só reforçam a própria visão do mundo.

Em suma, as redes sociais, na sua arquitetura viciante de recompensa imediata, criam um ambiente propício para que ideologias que oferecem respostas simples a problemas complexos, vilões claros e um sentido de pertença forte, se enraízem profundamente na psique dos seus utilizadores, moldando o seu posicionamento político. É um espelho distorcido que muitos, infelizmente, aceitam como a sua própria imagem. 

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