sexta-feira, 11 de julho de 2025

O "Não é Não" esfarelou-se

 

A política é um palco de promessas e, por vezes, de desilusões. E nestes primeiros tempos de governação de Luís Montenegro o palco está montado para uma daquelas peças em que o enredo se desenrola de forma, no mínimo, previsível, para não dizer preocupante.

Lembro o estribilho que embalou a campanha eleitoral da Aliança Democrática: o famoso "Não é Não" ao Chega. Uma frase curta, assertiva, que visava tranquilizar os mais céticos e demarcar águas, garantindo que a direita "democrática" não se curvaria perante os acenos de um partido que pisa perigosamente a linha do intolerável.

O "Não é Não" esfarelou-se logo nas primeiras semanas. E o epicentro dessa desagregação é a lei da nacionalidade, que não é um mero ajuste técnico ou uma reforma consensual. Foi uma negociação, com o Chega, sobre um diploma que tresanda a xenofobia e alimenta-se de mentiras descaradas.

Quando vemos propostas que visam dificultar a vida a quem procura em Portugal uma nova oportunidade, e justificadas com discursos populistas e carregados de preconceito, é impossível não sentir um arrepio. A memória ainda está fresca dos episódios vergonhosos, com Ventura e Rita Matias, a debitar nomes de crianças em escolas públicas, num festival de demagogia que parecia saído de um manual de como incitar o ódio. Esse tipo de "espetáculo" é a face mais visível de uma ideologia que o PSD, teoricamente, se propôs a combater.

O que assistimos agora, com esta aproximação em torno da lei da nacionalidade, é o concretizar de um alinhamento que muitos temiam. A direita "democrática", ao negociar e, ao que tudo indica, ao ceder terreno a um partido que já deu provas da sua índole fascista em atos e palavras, está a abrir uma porta perigosa. Mais do que uma questão técnica ou jurídica, é uma questão de princípios. É o sinal de que, talvez, a ideologia venha antes da ética, e a necessidade de governar se sobreponha à coerência. O "Não é Não" não era apenas uma promessa; era, ou deveria ser, um baluarte. E esse baluarte, está a ruir logo ao abrir de cena para os quatro anos que se seguirão.

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