Neste presente em que a informação flui a uma velocidade sem precedentes, assistimos à proliferação da desinformação online e suas consequências nefastas no mundo real. O que começa como uma publicação aparentemente inofensiva pode ser uma peça na complexa teia que alimenta a polarização, a radicalização e, nos casos mais trágicos, a violência.
Sites e plataformas que disseminam notícias falsas e teorias da conspiração prosperam, muitas vezes, graças a um sistema perverso: o financiamento por publicidade de marcas conceituadas. Estas empresas, alheias ao destino final dos seus anúncios, veem os orçamentos a serem canalizados, via algoritmos complexos, para espaços digitais que promovem ódio e divisões. É um ciclo vicioso: quanto maior atenção geram estas narrativas extremistas (ainda que falsas), mais anúncios atraem, garantindo a sua sustentabilidade financeira. Sem querer, as marcas tornam-se cúmplices passivas na monetização da desinformação.
Em Portugal, temos observado como certas estratégias comunicacionais do Chega alinham-se com estas táticas. O uso intensivo das redes sociais para propagar narrativas sensacionalistas e polarizadoras, o aproveitamento de ressentimentos e o alinhamento com discursos que, por vezes, roçam a intolerância, espelham as abordagens frequentemente usadas por geradores de desinformação. Embora não criem diretamente todas as fake news, a amplificação e legitimação de certos temas contribuem para um ecossistema digital onde a verdade é ofuscada pela emoção e pela raiva.
O resultado mais inquietante deste cenário é a radicalização de indivíduos. Pessoas vulneráveis, expostas a um fluxo constante de ódio e narrativas distorcidas, podem ser levadas a crer que a violência é a resposta para os problemas que lhes são apresentados. Infelizmente, já não é um mero cenário teórico: há um rasto de crimes e homicídios que podem ser ligados diretamente a indivíduos radicalizados pelo que absorveram online. A desinformação deixa de ser apenas uma "opinião" e torna-se um catalisador para atos de terror e crimes de ódio.
Perante esta realidade, a responsabilidade é coletiva. As marcas deveriam exigir mais transparência e controlo sobre onde a sua publicidade é exibida. Os cidadãos deveriam desenvolver uma literacia digital crítica, questionando as fontes e resistindo ao impulso de partilhar informações sem verificação. E, politicamente, importaria criar legislação mais robusta para responsabilizar as plataformas, apoiar o jornalismo de qualidade e promover uma educação cívica destinada a capacitar a navegação no complexo oceano da informação digital. Só assim se desmantelaria esta teia de enganos e protegeria a nossa sociedade dos seus perigos mais sombrios.