sexta-feira, 2 de junho de 2023

A escrita como arma enquanto há quem encha chouriços

 

1. Na Visão da semana passada surgia uma interessante entrevista com Don Winslow, conhecido escritor de policiais, que iniciou uma sabática para investir o talento narrativo no esforço de bloquear o acesso dos trumpistas, e dos republicanos em geral, ao poder.

Faz sentido o que defende: “uma boa parte da política é sobre quem controla a narrativa” e “a pessoa que conta a história mais convincente é o vencedor”. Mesmo que assim relativize a lógica marxista de tudo explicar pela dinâmica da luta de classes. Mas, se José Mário Branco defendia que a cantiga pode ser uma arma, o autor norte-americano parece convencido dessa mesma urgência em criar narrativas, que combatam eficazmente as que, mentirosamente, provém da extrema-direita norte-americana. E convenhamos que também precisaríamos de uns quantos Winslows lusos para estilhaçarem a retórica ruidosa das réplicas locais desse vírus político de além-Atlântico.

2. Na mesma publicação Rui Tavares Guedes também estabelece um paralelismo pertinente entre o que se passa na Comissão de Inquérito Parlamentar à TAP e os McGuffins dos filmes de Alfred Hitchcock. E explica o que significa essa expressão, que os cinéfilos aprenderam a associar à melhor forma do mestre do suspense em conseguir esse tipo de efeito: “um objeto ou pessoa que, embora sem importância alguma, acaba por funcionar como motor do enredo e motivar as ações das personagens”, mesmo sem qualquer relevância para o que será o final da história. 

O McGuffin também corresponde à expressão lusa de encher chouriços, que nenhuma importância tem, mas adia interminavelmente o que seria de mais curta duração.

Por isso mesmo, e sem nada de substancial para apresentarem como propostas para melhorarem a vida das pessoas, as oposições - com a honrosa exceção dos comunistas! - tentam manter esse palco ativo tanto tempo quanto possível. Mesmo que em nada corresponda ao motivo porque foi criado: o de discutir as estratégias políticas e empresariais da companhia aérea nacional nos últimos anos...

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