segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Ainda nos está a saber a pouco… e queremos que nos saiba a tanto!


Há analistas da realidade política, cujos textos nos dão um enorme prazer na sua leitura pela inteligência e consistência do pensamento, que refletem. É o caso do que Boaventura Sousa Santos costuma publicar e de que hoje nos foi disponibilizado «A unidade das esquerdas: Como? Porquê? Para quê?» na edição do «Público».
Começando por reconhecer que a atual solução governativa portuguesa é pouco divulgada fora de portas - onde valeria a pena ser replicada (vide o queixume de Rui Tavares no mesmo jornal ao lamentar a anunciada vitória da extrema-direita italiana devido á escusa das esquerdas em se associarem apesar da lei favorecer as grandes coligações!) - existe uma explicação óbvia para esse manto de nevoeiro, que a esconde para lá dos nossos limites geográficos: ela “representa uma solução política que vai contra os interesses dos dois grandes inimigos globais do aprofundamento da democracia que hoje dominam os media — o neoliberalismo e o capital financeiro global.”
E, no entanto, quase sempre na História portuguesa pós-25 de abril as esquerdas somaram mais votos do que as direitas, embora estas tivessem ocupado por demasiado tempo as funções governativas ou com elas se tivesse concertado o Partido Socialista para descontentamento de muitos, que nele militavam como tem sido o meu caso nos últimos trinta e dois anos.
Há que não esquecer - e o Professor da Universidade de Coimbra lembra-o! - que Mário Soares passou os seus anos derradeiros a advogar as vantagens desta convergência das esquerdas. E os factos deram-lhe razão: “realizando políticas opostas às receitas neoliberais obtêm-se os resultados que tais receitas sempre anunciam e nunca conseguem e isso é possível sem aumentar o sofrimento e o empobrecimento dos portugueses. Antes, pelo contrário, reduzindo-os. De uma maneira mais direta, o significado desta inovação política é mostrar que o neoliberalismo é uma mentira, e que o seu único e verdadeiro objetivo é acelerar a todo o custo a concentração da riqueza sob a égide do capital financeiro global.”
Num dos seus mais relevantes alertas Boaventura Sousa Santos refere o grande perigo de ver enfatizado a ideia de centro político como espaço de virtude. E aqui não o explicita, mas é notório para muitos de nós, que o principal defensor dessa ideia, e que tudo fará para a fortalecer no imaginário coletivo do eleitorado nacional, é Marcelo Rebelo de Sousa, que ocupa o atual cargo político para sabotar os benefícios colhidos pelas faixas mais desfavorecidas da população com os frutos dessa convergência à esquerda. Na sua prática e discurso o atual inquilino do Palácio de Belém tudo fará para erradicar as esquerdas da definição substantiva das políticas implementadas em favor da maioria dos portugueses.
É por isso que, após dividir por onze itens a sua análise a essa concertação dos mínimos denominadores comuns, ele confessa o pouco que ainda sabe esta solução, exigindo-lhe mais: “visou criar um espaço de manobra mínimo num contexto que prefigurava uma janela de oportunidade. Recorrendo a uma metáfora, a solução portuguesa permitiu à sociedade portuguesa respirar. Ora respirar não é o mesmo que florescer; é tão-só o mesmo que sobreviver.”
Se a muitos esta solução ainda sabe a pouco, o seu maior desejo é que venha a saber a tanto!

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