domingo, 14 de janeiro de 2024

O tempo das ilusões perdidas

 

Num fim de semana que justifica ter a televisão desligada pelo risco de ali vermos passar a vérmina fascista reunida numa convenção de gente feia, porca e má, vale a pena olhar além-fronteiras e constatar como tantas ilusões se vão perdendo nos que julgaram livrar-se de males inventados e acabam bem pior do que estavam.

Falo, por exemplo, dos equatorianos e dos argentinos, que foram manipulados para execrarem o “esquerdismo” de Rafael Correa e dos peronistas e se veem agora a contas com estados de emergência suscitados pelo crime organizado dos narcotraficantes e dos anarcoliberais.

Falo de Zelenski e de todos os ucranianos, que foram levados a crer no apoio indefetível do Pentágono, e seu apêndice na Casa Branca, e enfrentam o frio do inverno sem munições, que os protejam dos mísseis de Putin. Vale-lhes o balão de oxigénio de um governo inglês condenado a curto prazo e as palavras vazias de dirigentes europeus sem posses para suportarem por mais tempo um tão dispendioso investimento condenado a ser sem retorno.

E falo do novo presidente de Taiwan, também ele acobertado pelo prometido apoio norte-americano, mas também condenado a ser abandonado à sua má sina tão-só se confirme o sucesso de Trump em novembro.

Não esqueço, igualmente, os franceses, que a imprensa, dominada pela direita e a extrema-direita, levou a odiarem Mélenchon, iludindo-se na pertença de Macron a um indefinido centro e o confirmam agora ancorado indisfarçavelmente à direita. O ressurgimento da esquerda socialista em França (e já agora ali ao lado na Itália e no Benelux!) é a única resposta possível a uma extrema-direita, que vai surfando a onda mediática de manipulação dos eleitorados mais jovens e menos instruídos.

E há os judeus convencidos por Netanyahu quanto a ser esta oportunidade para a criação do Grande Israel à conta do genocídio dos palestinianos, e esquecidos da lição da História: os perpetradores de massacres indiscriminados em nome da superioridade racial, ou do ódio religioso, raramente conseguiram os seus intentos, amiúde acabando como párias. Condição que os supostos herdeiros dos sobreviventes do Holocausto estão a adquirir, não só no Tribunal de Haia mas, sobretudo, na justa apreciação da opinião internacional.

Todos estes iludidos - com o capitalismo selvagem, com o imperialismo norte-americano e com a força brutal e cobarde dos exércitos perante população civil indefesa - lembra passados em que tudo parecia perdido, levando gente desesperada a suicidar-se (Virginia Woolf ou Stefan Zweig só para dar dois exemplos óbvios). Sabemos que afinal, e num ápice, tudo mudou, porque puxar para um lado a corda da evolução histórica, salda-se quase sempre pelo dobrar da força do outro lado. Os tais dois passos para diante, que acontecem quando se dá um para trás.

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