segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Desnorte, incultura e trapacice - as marcas deste (des)governo

 

A fuga de Vale dos Judeus, a questão de Olivença e a trafulhice com os números dos alunos sem aulas no ano transato, denunciam três características lapidares deste (des)governo.

A primeira é a reação ao que possa constituir-lhe demonstração de uma realidade assaz diversa da que pretenderia transmitir como mito. Quando não sabe como explicar os dissabores cala-se como o fez a ministra durante três dias escapando depois dos jornalistas na conferência de imprensa em que se propusera justificar o injustificável.

A segunda tem a ver com o lado mais desajeitado dos titulares das diversas pastas. Não é só o “será-lhes” de Montenegro, mas também o comportamento de Nuno Melo que, alguns dos seus parceiros gostariam de ver acantonado num sítio sossegado como o que encontraram para Câmara Pereira durante a campanha eleitoral de há meio ano atrás.

A incultura nalguns dos que integram a corte de Montenegro é tal, que a coleção de “tesourinhos deprimentos” arrisca-se a ser vasta.

E, se alguns dos ministros destacam-se por serem mais respeitáveis na aparência, caso do da Educação, logo a sua prática se revela tortuosa: vide a forma como ele e os apoiantes procuraram iludir o manifesto fracasso desta rentrée escolar em que muitos mais alunos arriscam não terem professores, comparativamente com os do ano transato. E, no entanto, que malabarismos para tentarem mentir sobre essa evidência!

Na saúde, na educação, na habitação - setores onde os governos de António Costa não souberam contornar os constrangimentos do imperativo das “contas certas”! - Montenegro vai-se encarregando de mostrar ser possível fazer bem pior, o que lhe não causará sobressalto por, ao mesmo tempo, ir acautelando os negócios de quem ganha com essa degradação. 

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Navegar à vista a caminho do encalhe

 

Os últimos dias têm sido fartos em demonstrações patéticas de ministros a contas com promessas feitas, e não cumpridas, bem como o seu desnorte perante os problemas para que não vislumbram soluções.

Na Saúde, na Educação, na Justiça, os titulares não revelam a convicção de terem competência para corrigirem dinâmicas disruptivas, que eram empoladas nos governos socialistas como efeito da sua ineficácia, mas agora que crescem como bolas de neve, os ameaçam levar consigo e sem mitigarem os graves danos da sua passagem pelo setor.

Qualquer desses ministros terá satisfeito o ego e, porventura, telefonado aos pais a contarem o acesso ao poleiro - uma conhecida tradição no PSD! - mas deverão estar a contas com a confirmação de como não lhes bastam os preconceitos ideológicos para terem uma “saída limpa” das respetivas funções.

Nos governos anteriores os problemas surgiam - alguns com as dimensões dos incêndios de 2017, da pandemia do covid ou da guerra na Ucrânia - mas sobrava a ideia de se estabelecerem estratégias para os portugueses serem poupados aos seus efeitos mais gravosos. E até beneficiarem com soluções de médio e longo prazo.

Com este (des)governo sucede o contrário: funciona o navegar à vista com os ventos adversos a ameaçarem progressivas derivas para os encalhes nas pedras da costa. O sucedido na prisão de Vale de Judeus, com o comprometedor silêncio dos dias seguintes, só confirma essas suspeições.

Fica, porém, o mais grave: o aproveitamento do caos na Saúde para entregar o SNS aos interesses privados, que os vão sugar dos recursos necessários para o formatar de acordo com o que para ele gizaram António Arnaut e João Semedo. 

domingo, 8 de setembro de 2024

Kim Jong-Montenegro

 

Decidiram-no os votantes laranjas: Montenegro será o incontestado líder nos próximos tempos. Dois anos? Não sei se será assim, mesmo tendo em conta a votação ao melhor estilo norte-coreano: quantos desses 97% de apoiantes de hoje manterão esse atestado de confiança ao darem as coisas para o torto conforme o denunciam os sinais, que levam o tutor Marcelo a implorar para tal não vir a suceder?

Olhemos então para a realidade: diz o Expresso que, neste início do ano letivo, há mais 30% de alunos com professores em falta; o Público também anuncia que o número de cidadãos com médico de família atingiu em Agosto o seu valor mais baixo; e, além da presidente da Federação Nacional denunciar como ineficaz o tão propagandeado programa em favor dos doentes oncológicos, regressam as manchetes sobre os estudantes universitários a contas com a falta de alojamento decente nas grandes cidades e compatíveis com as finanças dos pais.

Some-se a isto a escusa ilegal do governo entregar ao PS (que os exigiu), e aos demais partidos, os dados sobre a margem orçamental para o ano que vem para compreender os palpos de aranha em que o ministro das Finanças se vê para manter a lógica das “contas certas”, que já leva Montenegro a prever um aumento da receita dos impostos de 20% nos próximos quatro anos o que justifica irónico sorriso sobre as suas palavras de ainda há pouco tempo, quando, falciosamente, culpava António Costa por ter conseguido objetivo semelhante à custa do seu “brutal aumento”.

Convenhamos que Montenegro anda a provar do seu próprio veneno. E o pior para ele é compreender, nomeadamente através da sondagem da Intercampus, que a intenção de ir rapidamente para eleições pode não ser ideia asizada. A menos que, a exemplo de Macron em França, se queira entregar definitivamente nos braços da extrema-direita. 

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Uma mão vazia, outra cheia de nada

 

Sei que demonstro com isso um carácter pouco dado a elogios, mas tenho uma atávica antipatia pela ministra da Saúde. Algo de parecido quando, pelos meus quatro ou cinco anos de idade, logo antipatizei com a vizinha da Dorothy, que lhe assombrariam depois os sonhos sob a capa da Bruxa Malvada do Leste enquanto cirandava pela terra de Oz.

Até pode tratar-se de pessoa simpática, capaz de distribuir generosas esmolas aos pobrezinhos, e regalar de mimos os netos, mas tudo nela inspira desconfiança, se não mesmo perfídia.

E, não só dela, mas do primeiro-ministro, que a tutela, ao convocar uma apressada conferência de imprensa para desviar a atenção dos portugueses dos embaraços em que estão o ministro das Infraestruturas e a indigitada comissária europeia com a história da privatização da TAP em 2015, quando o desgoverno de Passos Coelho não tinha qualquer legitimidade para a decidir.

Perante o caos em que se encontram os hospitais, mormente os serviços de Obstetrícia, era altura de proceder a um número de ilusionismo que, sem escamotear o objetivo superior de Montenegro em acabar de vez com o SNS pondo o Estado a aumentar ainda mais os lucros dos que, gananciosamente, enriquecem com a falta de saúde dos cidadãos, se voltassem a fazer mirabolantes promessas quanto a um futuro mais ou menos distante em que, não só esse caos continuará a prevalecer, como as verbas transferidas dos cofres públicos para os grandes grupos privados aumentarão exponencialmente.

Não admira que não tenha assistido à conferência em causa - o meu delicado estômago já não suporta coisas tão indigestas! - mas os comentários dos partidos da oposição confirmaram o que esperar de mais uma ação de propaganda.

Montenegro parece esquecer-se de algo óbvio: as habilidades trapaceiras até podem resultar das primeiras vezes mas, quando os saldos se resumem ao agravamento de quanto os eleitores acham ser suas justas aspirações e as veem sucessivamente adiadas por power points e outros artifícios similares, a paciência acaba por esgotar-se.

Não virá distante o dia em que esta direita sem ideias eficazes para melhorar a qualidade de vida de quem nela votou ande a pedir ao santinho de Belém, para não convocar novas eleições... 

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Entre o grotesco laranja e o revigorado fôlego socialista

 

1. Nos tempos de sindicalismo mais ativo sempre achei grotesco o comportamento de um conhecido líder de uma associação filiada na UGT que, tão só percebia as televisões presentes na sala onde ouvia entediado os discursos dos oradores, logo arranjava forma de se levantar e passar frente às câmaras para, perante os que lhe pagavam a lauta qualidade de vida, mediante as obrigatórias quotas (e, tanto quanto o diziam as más línguas, os subornos patronais!), verem-no e comprovarem o quanto aparentava importância.

Lembrei-me desse, hoje merecidamente esquecido,  “dirigente” sindical ao ver Montenegro no rio Douro onde um helicóptero caíra algumas horas atrás e provocara a morte da maioria dos ocupantes.

Por momento ainda ponderei na hipótese de lhe desconhecer os méritos de mergulhador e o ver submerso à procura do corpo do militar, que ainda estava desaparecido. Mas qual quê! A exemplo desse mau exemplo resgatado do passado, importava-lhe, qual abutre, comparecer no local da tragédia e aproveitar-se da circunstância. Não denotando um pingo de vergonha.

2. Não admira o espanto de Maria Luís Albuquerque ao constatar o repúdio socialista pela sua escolha como comissária europeia. Ramo da mesma árvore passista, que gerou Montenegro, gostaria de ter aplausos e não lhe serem recordadas as decisões, tão dispendiosas aos nossos bolsos, enquanto fez parte de um governo, que sujeitou os portugueses a tratos de polé.

Está-lhe garantido chorudo ordenado e uma agenda de contactos para o futuro que, seguindo o exemplo de Durão Barroso, quererá rentabilizar em proveito próprio. Só que o antigo maoísta, para além de geneticamente arrivista, ainda tem alguma esperteza. Coisa que parece não haver na agora escolhida por Montenegro.

3. Ao contrário do que Montenegro repete goebbelsianamente sobre o suposto apoio do país ao seu governo, a situação afigura-se-lhe mais complicada com o discurso de Pedro Nuno Santos neste fim-de-semana: ou atira para o lixo a revisão do IRC e o IRS Jovem, ou tem chumbo certo no orçamento, valendo-lhe então a abstenção do Chega se Ventura constatar serem negativas as perspetivas dadas pelas sondagens quanto a nova ida às urnas.

Elogiado por gente tão diversa quanto o são Paulo Baldaia, Miguel Macedo ou Ana Sá Lopes - nenhum deles seu declarado apoiante - Pedro Nuno Santos surge revigorado para esta rentrée e pronto para devolver o país ao rumo, que as eleições de março puseram em causa.