Amigos meus, que mantém apoio, senão mesmo admiração por Marcelo Rebelo de Sousa, chamaram-me a atenção para a injustiça, que lhe fiz ao criticar o discurso do 25 de abril por pressupor o branqueamento do passado - os crimes nas cadeias da Pide, os perpetrados nas ex-colónias , etc. - em nome de uma convivência harmoniosa de todos os cidadãos para além das suas diferenças ideológicas. Uma questão de consolidar aquilo que seria uma suposta coesão social, seja lá o que isso for.
Hélas!, como diriam os franceses: entre fascistas e democratas existe uma fronteira inultrapassável, que acabará com a vitória de uns ou de outros, nunca com a sua pacífica convivência. Porque os fascistas trazem catadupas de proibições na bagageira: basta olhar para o regime de Orban na Hungria e comprova-se como, passo a passo, uma sociedade suficientemente democrática para ser aceite na União Europeia, se foi afastando dos seus valores e princípios inalienáveis até tornar-se no tipo de ditadura aí sofrida. Não faltam imitadores de Orbáns nas bancadas dos quatro partidos das direitas parlamentarmente representados. Faltam-lhes os meios, mas quanto à vontade não há como a disfarçar...
Não significa isto que todos, ou mesmo a maioria dos eleitores e simpatizantes dos partidos de direita e extrema-direita sejam fascistas, mas o facto de se deixarem embalar pelo tipo de demagogia dos seus chefes ilustra bem a incapacidade dos democratas em desmascararem a incoerência daquilo em que acreditam. Porque se alegam a luta contra a corrupção para exigirem mais transparência (até há uma coisa esdrúxula que tem lugar cativo na imprensa para a propagandear), logo se insurgem contra a burocracia, que dificulta o sucesso dos negócios só por estes terem de passar pelo crivo de quem os analise e considere livres de suspeita. Se, como o Chicão apareceu a propor esta semana, se exige aos políticos uma exclusividade total num número limitado de anos, porque o número de mandatos deve ser restringido, bem podemos imaginar a (falta de) qualidade dos que se disporiam a cumprir essas regras tendo em conta que, quando voltassem ao seu percurso profissional já há muito o comboio que lhes cabia partira da gare sem terem por garantida outra alternativa de recurso.
Se queremos melhores políticos não há como fugir à inevitabilidade de lhes pagarmos salários ao nível do que ganhariam nas empresas pelo mesmo tipo de responsabilidades e sem as limitações próprias de trabalhadores precários. Mas esta evidência é criminosamente torpedeada pelos que anseiam por ter uma classe política mal paga e desconsiderada, porque se torna mais fácil aos candidatos a donos disto tudo prosseguirem com os seus obscenos interesses. E isso é coisa que, infelizmente, não foi ainda compreendida pelos que acreditam no que as televisões ou as publicações da Impresa, da Cofina ou o Observador lhes vão transmitindo...
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