segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Os pigmeus e a inveja pelos homens grandes

 

Discordo de quase tudo quanto escrevem Ana Sá Lopes e Clara Ferreira Alves, mas tenho de reconhecer alguma pertinência no que defende a primeira ao associar o aparente sucesso de Gouveia e Melo ao fascínio luso pelos “homens que mandam” na linha do que, no passado, beneficiou Ramalho Eanes ou Cavaco Silva. Mas, convenhamos que a experiência contrária, a de se deixarem iludir por um entertainer também não os deixou em melhores lençóis. Tendo-se constatado - com a derrota de Sampaio da Nóvoa em 2016 - que o eleitorado pretere  quase sempre os candidatos com melhores características para conferir à presidência a ética republicana, tão superlativamente demonstrada por Jorge Sampaio, espero que desta vez se livrem de aclamar o almirante e os comentadores televisivos (Marques Mendes, Portas ou Seguro).

Quem dera que António Guterres se livre a tempo do vespeiro nova-iorquino para acabar em beleza um apreciável percurso político. Mesmo não esquecendo quanto ele e Marcelo foram culpados pela demora em legalizar a IVG.

Livrar-nos-íamos assim de mais um daqueles pigmeus da História a quem, segundo a comentadora do Expresso, tanto custa reconhecer o valor dos gigantes. Aqueles que, por exemplo, se apressaram a garantir uma estátua no Areeiro, e o nome de um aeroporto, a um político quase sem História (para lá do seu larvar intriguismo e autoritarismo interno dentro do PPD), enquanto Mário Soares - cujo centenário, agora quase clandestinamente se comemora! -, tende a ser esquecido. Tendo sido ele um dos grandes vencedores do tal 25 de novembro, de que esses mesmos pigmeus procuraram apossar-se com a mais descarada das ilegitimidades.

domingo, 1 de dezembro de 2024

Minúsculos pensos para evitar Maiúscula solução

 

Num debate entre comentadores da atualidade política ouço o alucinado interlocutor de Raquel Varela pedir-lhe para não voltar à carga com a expressão de luta de classes, que tanto o incomoda.

É natural que os toscos ideólogos das direitas se amofinem com algo que sabem estar-lhes a cada esquina a torpedear as certezas, mas a realidade tende a complicar-se-lhes com um (des)governo liderado por quem, além da incompetência, também leva alguns deles - o Tavares da última página do Público por exemplo - a reconhecer-lhes uma evidente falta de ... carácter.

A última semana tem sido, aliás, pródiga em vários ministros - e já não só as desgastadas titulares da Saúde e da Administração Interna - a demonstrarem igual conduta, quer o da Educação a propósito dos números dos alunos sem aulas, quer a Dalila da Cultura a avançar para a inusitada substituição de quem lidera o Centro Cultural de Belém, confirmaram o que já se adivinhava: para acompanhar alguém de tão minguadas qualidades (Montenegro) só caberia gente igualmente falha em méritos, que o seu chefe revela.

Claro que o momento é de nos impressionarmos com o desaforo das direitas mais extremas até agora bem sucedida nas campanhas de ação e propaganda. Mas o agitprop só faz sentido quando suporta ideais, que pressuponham uma visão de futuro galvanizadora quanto à probabilidade de melhorar a vida de quem a apoiar. Quando se orienta apenas para a satisfação das frustrações coletivas feitas de preconceitos e pelintrices, só tendem a durar enquanto suportarem o efeito de moda.

Tal como os desgovernados rios capazes de inundarem margens depois de inusitada pluviosidade, essa moda tenderá a regressar ao merecido caudal das ribeiras ameaçadas de secar, quando o clima se torna mais bonançoso. Cabendo então a quem agora se surpreendeu com a dimensão do fenómeno reforçar os diques de contenção fazendo com que suportem melhor as futuras investidas. Por exemplo lembrando efetivamente que as sociedades humanas dinamizam-se nas lutas de classes e não há “reformismo social-democrata” capaz de ser bem sucedido onde só o Socialismo com maiúscula fará sentido...