Não é só Mário Soares quem o diz: multiplicam-se os comentadores que alertam para os perigos das privatizações a serem proximamente lançadas pelo governo. Por exemplo, Fernando Sobral, no Jornal de Negócios, afirma: As privatizações que aí vêm (a das águas é francamente absurda, porque elas vão ser o petróleo do futuro e será um sector estratégico nacional) vão delimitar uma nova ordem económica em Portugal. A alienação de algumas das maiores empresas nacionais vai ser um doce para o capital estrangeiro, porque parece evidente que aqui não há músculo financeiro para acompanhar o leilão. As privatizações vão terminar com os célebres centros de decisão nacional, que tantos militantes criaram. Mas, sobretudo, vão mudar o xadrez da economia nacional.
E, no mesmo jornal, um excelente artigo de Manuel Caldeira Cabral é bem claro quanto aos riscos de passarmos para entidades privadas estrangeiras a gestão de bens essenciais para o nosso dia-a-dia, que se tornarão muito mais caros e de pior qualidade: Podemos estar a passar para as mãos dos privados infra-estruturas impossíveis de reproduzir, onde o Estado investiu milhares de milhões, que são essenciais ao funcionamento de muitas actividades económicas e ao bem-estar de todos os cidadãos.
Apesar de, em muitos casos, estas empresas terem acumulado prejuízos e dívidas, é fácil perceber que se estiverem em mãos privadas, a regra de fecharem se não conseguirem ter lucros não poderá ser aplicada.
Quem ficar detentor destas infra-estruturas ficará com um enorme poder de chantagem sobre a sociedade e sobre o Estado. É difícil que estas empresas consigam ser lucrativas apenas com melhorias de eficiência. No entanto, muitas delas actuam em monopólio, pelo que será possível ter elevados lucros com base em preços mais altos e menor qualidade de serviço e de segurança de abastecimento.
No caso de empresas como a Galp ou a EDP, é claro que o facto de se estar em crise económica e financeira vai afectar negativamente o encaixe que o Estado conseguirá obter. No caso destas empresas deve também ser acrescentado que há riscos importantes de retirar um instrumento importante ao Estado num sector tão sensível e estratégico como a energia.
Noutros casos, a menos que se proceda a aumentos brutais dos preços dos serviços que prestam, o valor do património das empresas é muito superior ao valor actualizado dos lucros futuros, o que sugere que as empresas acabem por comprar este património ao Estado por uma pequena fracção do valor que nestes foi investido, ou uma fracção do valor que estes têm para a sociedade.
O valor e a importância estratégia das infra-estruturas envolvidas recomendaria que se mantivesse estes sectores na esfera pública. Mantendo a decisão de privatizar seria desejável que tal seja realizado através de concessões, evitando a alienação do património a preços tão baixos.
A ideia de que a gestão privada nas "utilities" consegue melhor serviço com menores custos, não se verificou em muitos casos.
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