domingo, 12 de maio de 2024

Os dois passos adiante seguem dentro de momentos

 

Não sei se o Pedro Nuno Santos gosta da obra do Leonard Cohen, mas ao ouvi-lo anunciar que vai ganhar as europeias para, logo a seguir, ganhar Portugal, lembrei-me do ritmo galvanizador de “First we take Manhattan, then we take Berlin”. Porque é disso que se trata: os trinta dias de desorientação da equipa de Montenegro têm sido tão elucidativos quanto à incompetência e impreparação de quem a integra, que serão muitos os que estarão arrependidos com o castigo, que quiseram dar ao Partido Socialista em 10 de março. E serão esses a garantir a vitória em 9 de junho, que servirá de trampolim para a reposição da normalidade democrática interrompida pelo golpe de Estado promovido pelos procuradores do ministério público.

Agora até gente insuspeita de simpatias socialistas, como é o caso do diretor do «Expresso», reconhece um claro cheiro a urgência nas substituições de titulares de cargos públicos em que são risíveis as justificações quanto à sua competência. “O novo governo optou por uma caça às bruxas, com acusações apressadas e pouco sustentadas, para justificar saneamentos políticos em áreas sensíveis”, lê-se na coluna do referido João Vieira Pereira. E, na «Visão», Rui Tavares Guedes apimenta o escrutínio deste momento político com lapidar conclusão: “quando se governa com lentidão nas decisões, mas com rapidez nas demissões (ainda por cima mal explicadas), abre-se uma avenida para o populismo”. Embora queira acreditar que serão os partidos das esquerdas a melhor rentabilizarem a deceção dos eleitores com a manifesta falta de jeito dos políticos das direitas para acolherem-lhes as expetativas de vida menos difícil.

Após breve interlúdio para gáudio de Marcelo e dos boys de Lucília Gago, voltemos à tradição de termos as esquerdas maioritárias a garantirem os dois passos por diante depois de tão atabalhoado passo atrás.

terça-feira, 7 de maio de 2024

Um desgoverno acabrunhado

 

Em tempos - que já lá vão! - costumava-se dar o benefício da dúvida a um governo durante cem dias para ver quanto valeria. Com o da Aliança Democrática nem foi preciso um mês para aferir o nenhum mérito. Para além do logotipo e uns quantos saneamentos indisfarçavelmente políticos, que legado fica da sua ação?

Acabrunhado, Montenegro foge aos jornalistas para furtar-se a explicar o inexplicável, e de pouco lhe servirão tribunas como as do jantar do aniversário do PPD, porque lembra invariavelmente a canção de Mina sobre a futilidade de certas parole.

Pedro Nuno Santos tem razão plena, quando diz ser este (des)governo quem aposta em provocar novas eleições no mais curto prazo possível antes que se torne ainda mais evidente o quanto se distancia a prática das promessas com que quis embalar o eleitorado.

Esta permanente instabilidade não tenderá a facilitar a réplica da vigarice cometida em tempos por Cavaco Silva para conseguir a maioria absoluta. Até porque a memória curta dos portugueses chega para lembrar o que, para além da campanha criada por sucessivas corporações para derrubar o governo anterior, este estava de facto a concretizar para dar satisfação às suas necessidades.

Embora desejasse que viessem essas novas eleições, que reencaminhassem o país para o trilho do que foi interrompido com as de 10 de março, desconfio que o desejo de conservar o poder seja tanto nas hostes laranjas que, mais facilmente, darão a Ventura aquilo que ele lhes exigirá.

domingo, 5 de maio de 2024

Um gélido banho de realidade

 

Pode haver quem seja suficientemente distraído para não ver aquilo que o seu preconceito tornou cego, mas também desconfio não faltarem desiludidos com este desgoverno, com que julgaram ver satisfeitas muitas das suas ânsias, e de que encontram como resposta um gélido banho de realidade.

Penso nos polícias, que se imaginaram com subsídios  iguais aos dos colegas da Judiciária, ou nos professores apostados em recuperarem rapidamente o tal tempo de serviço, a que outros funcionários públicos poderiam aspirar.

Olhando para um primeiro-ministro mudo por desconhecer que dizer, ministros céleres a despedir e a difamar gente competente, mas depois admirados por não os terem a fazer aquilo que não sabem, anuncia-se uma tempestade tão intensa, quanto parece estagnada esta bonança.

O verão está para vir e os hospitais voltarão a estar num caos, que as televisões - tão desejosas de o denunciar, quando o imputavam ao governo anterior - não conseguirão iludir, e as ruas serão estreitas para conter a deceção dos que veem a situação piorar, quando não se contentavam com os avanços assim assim.

E entre os que se arrepiam com este duche frio está a caquética criatura ainda suficientemente lúcida para perceber quão falhada foi a missão a que se dera, e julgara concluída com a demissão de António Costa. Afinal aqueles a quem pretendera devolver o pote demonstram ser tão desajeitados, que só resta desejar que não o partam. Porque para recuperar os danos já os socialistas se preparam... 

sexta-feira, 3 de maio de 2024

Vai ser curta a festa deles, pá!

 

Voltasse ao mundo dos vivos, e quisesse replicar uma análise semelhante à que produziu sobre o 18 de Brumário de Luis Bonaparte, que diria Karl Marx desta enésima repetição de um governo da AD? Se é certo que teve o cuidado de anteceder a expressão “pelo menos” na constatação da tendência da História para se replicar, que haverá a acrescentar à tragédia (cavaquista) da primeira vez - e dando de barato ter o sácarneirismo sido breve prólogo aos malefícios do filho de Boliqueime! - e à farsa santanista subsequente? Depois da palhaçada protagonizada pelo autarca da Figueira da Foz, que se pode esperar deste interlúdio montenegrista senão a vigência de uma permanente trapaça?

Isso mesmo o confirmou Miranda Sarmento com a indesculpável comunicação de ontem, quando quis iludir a incapacidade para cumprir todas as promessas, que o suposto choque fiscal e o mirífico crescimento exponencial da economia lhe prodigalizaria. Agora que as contas começam a exigir-lhe a assinatura para serem pagas o presumido centeno do PSD vê-se no mesmo filme de há duas décadas quando Durão Barroso comprovou não ter dedos para tão exigente guitarra, e aproveitou para dar às de vila diogo tão-só a conjuntura veio ao encontro do seu congénito oportunismo (e isso digo-o eu que o tive por colega de liceu nos idos anos 70 e já então sentia por ele uma forte antipatia!).

Encontrar saída para o embrincado labirinto em que se vê, eis o que Sarmento e seus colegas sentirão como urgente, cientes de estarem a percorrer um caminho de pedras em vez da celestial estrada de tijolos amarelos, que os deveria levar para o outro lado do arco-íris. Porque, em vez de céus claros eles tendem-lhes a ser assaz nebulosos.

Imagino a deceção de quantos se julgaram potencialmente satisfeitos nos anseios de uma vida melhor ao confiarem o voto a quem tantas vezes já deu provas de incompetência e insensibilidade social. Não admira que, sentindo curta a festa, o governo cuide de arranjar emprego para os amigos o mais rapidamente possível mesmo recorrendo a argumentos  injuriosos. É torpe o que os seus ministros fizeram a Fernando Araújo ou a Ana Jorge esperando-se por novos episódios nas semanas vindouras. 

Sendo a pressa má conselheira será inevitável o tombo a curto prazo. Para desgosto de um Marcelo, que terá julgado cumprido o desígnio de afastar as esquerdas do poder e as verá de volta a curto trecho. Até porque, como o demonstraram as manifestações da semana transata, são muitos mais os milhões apostados em defenderem os valores de Abril do que quantos, por perfídia ou ignorância, se deixam embalar pela conversa patranheira do farsante-mor...

terça-feira, 30 de abril de 2024

O tonto e o incipiente jogador de xadrez

 

Temos de Cervantes a prova em como assiste alguma razão aos tontos para darem conta da incómoda verdade aos que deles troçam. Por isso, apesar de Marcelo merecer a mofa - mas não só, porque a História também se encheu de exemplos de tontos capazes de causarem imenso dano, quando estão em posições de poder! - há que reconhecer-lhe alguma razão, quando aponta a lentidão como característica a conotar a António Costa. Porque adivinhasse este a conspiração, que o atiraria para fora de São Bento depois da maioria absoluta e decerto teria sido outro o ritmo com que implementaria as medidas, que a folga orçamental proporcionara! Não estava em causa a sua origem étnica, mas o erro de cálculo por se julgar imune à permanente sanha de alguns titulares do ministério público para com os governantes socialistas. Digam-no Ferro Rodrigues, Paulo Pedroso, José Sócrates e outros que, como João Galamba, foram atacados sem escrúpulos tão-só assinaram o compromisso com as funções públicas!

Já quanto a Luís Montenegro a tontice não acertou assim tanto, porque em vez do lerdo rural, o atual primeiro-ministro corresponde à característica do provinciano, que se julga espertalhão, e por isso se apressa a aproveitar as oportunidades para ocupar um espaço, de que o arrivismo depressa tenderá a afastar. Veja-se a rapidez com que afastou da Santa Casa a provedora, que estava a fazer laborioso trabalho de correção dos erros de gestão anteriores.

Carmo Afonso diz que Montenegro está a jogar xadrez com as oposições, que quer ver conjugadas em afastá-lo, mas optam por sucessivos xeques com estratégias distintas. Teria de ser um Alekhine para levar de vencida os adversários, mas não se lhe adivinha esperteza bastante, que não seja a de ir adiando o momento da derrota sempre suspirando por outro tabuleiro em que as peças se lhes apresentem menos asfixiantes. Mas bem pode ir alimentando o pensamento mágico, por estar fadado a ser mais um parêntesis numa dinâmica, que não conseguirá travar. 

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Distrações, indiferença e uma inequívoca tendência

 

1. É claro que a bolha comentadeira das televisões - quase inteiramente dominada por gente de direita! - sossegou com as declarações de Marcelo perante os correspondentes da imprensa estrangeira por livrá-la de melhor espelhar o incómodo com as imagens das comemorações do 25 de abril. Ter-lhe-á custado a digerir o mais de um milhão de pessoas, que vieram para a rua proclamar a perenidade inquestionável da Revolução e o significado óbvio de fascismo nunca mais. E bater num cadáver adiado, como o presidente é há muito tempo, serviu-lhe de consolo para justificar a tença e não dar conta do enxovalho por que terá passado.

2.  Pacheco Pereira tem razão, quando diz ser de indiferença o sentimento generalizado dos portugueses em relação ao governo de Montenegro. Acrescentaria, que assim é ... ainda! Porque, se não se deteta entusiasmo em nenhum grupo social com quem ocupou os ministérios graças ao golpe de Estado promovido pela procuradora Lucília Gago, sabe-se lá com que cúmplices clandestinos, lá virá o momento do acerto de contas, quando os iludidos com a manipulação mediática dos casos e casinhos se derem melhor conta do logro em que se deixaram enredar.

3. As sondagens da Intercampus conhecidas este fim-de-semana confirmam o que as ruas revelaram no dia 25: tão rapidamente quanto pareceram lestos a darem maioria às direitas, os eleitores aprestam-se a retomar o bom costume de confiarem às esquerdas o seu futuro. Quer para as presidenciais - em que António Costa e António Guterres deixam à distância os preferidos das direitas (com Passos em queda, Ventura no seu nicho, o almirante a empalidecer entusiasmos, e Portas, Marques Mendes ou Durão Barroso a quedarem-se por percentagens ridículas) -, quer para as europeias, a soma das esquerdas já superam as das direitas. E se isso ainda não sucede no barómetro mensal para as legislativas o empate técnico confirma uma tendência, que já dá o PS como maior partido entre os consultados.

Depois da tormenta, melhores dias estarão para vir!

sábado, 27 de abril de 2024

O probiótico de espectro alargado

 

1. Neste que é o primeiro fim-de-semana depois da impressionante manifestação dos últimos anos importa relevar o suplemento anímico suscitado em quem somara desalento à deceção causada pelos resultados das eleições mais recentes. Se o poltrão do  partido neofascista já sonhava com passadeiras desenroladas à sua frente para chegar ao poder, ou o ex-eremita de Massamá se via dividido entre que palácio - São Bento ou Belém - tomar por residência, muito lhes devem ter arrefecido os entusiasmos por demonstrar-se a vivacidade das esquerdas, que provaram a vontade de porem cobro ao sucesso do golpe de Estado, agora também a replicar-se em Espanha.

Prova-o, porém, o regresso de Lula ao Palácio da Alvorada, que não há conspiração das direitas capaz de perdurar: mais cedo ou mais tarde, a política retoma o interrompido percurso, apenas com alertas reforçados para melhor se vacinar contra quem insiste em rodar a História para trás.

2. Não é que acredite na presença da procuradora-geral Lucília Gago na Assembleia da República para explicar-se, mas a proposta de Aguiar Branco surpreendeu pela positiva. A cobardia da senhora - sempre decidida a não se responsabilizar pelos danos da sua ação e dos que protege! - levá-la-á a fazer ouvidos de mercador ao que lhe pediu o presidente da Assembleia da República, porventura já candidato a investigação sumária de uma das equipas infiltradas do Chega no DCIAP. Mas seria positivo que o PS e o PSD, particularmente visados por quem não se importa de forjar denúncias para dar primeiras páginas aos tabloides, forçassem à concretização dessa sugestão para melhor encaminhar o ministério público para a decência, que alguns dos seus titulares não têm revelado.

3. Não é, pois, apenas na campa de Salazar que se justifica o uso do probiótico de Bordalo II. A manifestação desta semana elucidou o desejo reforçado de milhões de portugueses para que se ministre a Liberdade aonde ela mingua, quer na forma de preconceitos racistas e xenófobos, misóginos e homofóbicos, quer em tudo quanto falta cumprir na Constituição saída da Revolução - e entretanto tão desnaturada! -, que exigia maior igualdade e justiça para quem a não tem. Sobretudo no que aos direitos fundamentais - o pão, a habitação, a saúde e a educação - dizem respeito. 

sexta-feira, 26 de abril de 2024

Uma data para voltar a acelerar a História

 

1. Não têm sido poucos os momentos, que tenho pressentido como de importância crucial por, em maior ou menor dimensão, acelerarem tendências que, umas vezes, representam um passo atrás na História, mas, na maior parte das ocasiões, a tendem a acelerar para lá do que pretenderiam os cultores do conservadorismo económico, social e cultural.

Ontem, ao assistir no Rossio, à passagem do cortejo vindo da Avenida da Liberdade, enchendo-a completamente, vaticinei estar numa dessas datas por ser a que, fez refugiar em bafientos armários, os que execram tudo quanto simboliza o 25 de abril tomados do medo de neles se voltarem a enclausurar. Foram muitos os milhares que vieram proclamar a intenção de não deixar o tempo recuar até meio século atrás exigindo, ao mesmo tempo, o cumprimento das muitas esperanças definhadas por uma Revolução ainda por se cumprir plenamente.

Se o José Mário Branco constatara ter visto multidões a lutarem para acabarem com a sua exploração, ontem viram-se idênticas marés humanas a dizerem que fascismo nunca mais.

2. É claro que as confidências de Marcelo aos correspondentes estrangeiros são prova concludente da incapacidade para manter-se no cargo sob pena de prosseguir a ação nefasta, que nos trouxe ao atual contexto par(a)lamentar, mas numa coisa tem razão: é tempo dos portugueses libertarem-se da mitologia malsã do fascismo, que os convenceu da grandeza de um império de ladrões, de traficantes de escravos e de genocidas. Se esses crimes podem entender-se à luz dos conceitos de então, o balanço tem de ser assumido como inequivocamente negativo. Sem que faça sentido pagar indemnizações a quem, na prática, é descendente muito distante de quem, efetivamente, sofreu as dores da ganância de uns quantos aventureiros, que nada descobriram, porque já existia quem vivesse em terras ilegitimamente declaradas como pertencentes à nossa coroa. 

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Abril, Revoluções adiadas mil

 

1. A questão ainda agora posta, pelo Paulo Alves Guerra na Antena 2, surpreendeu-me deveras: será que existe muita gente a sentir esta como a última vez em que se dá tanta importância ao 25 de abril? Haverá um progressivo esquecimento da efeméride nos anos vindouros, um pouco como sucedeu com o 5 de outubro, hoje quase reduzido a feriado nacional ?

Quero crer que assim não será: enquanto o regime republicano está consolidado não sendo crível que o tonto Pio, ou um dos seus sucessores, sentem o traseiro num trono real, a Democracia não está assim tão firme no inconsciente nacional não faltando quem suspire por líderes providenciais. Daí que, no ano que vem e nos que se seguirão - mesmo quando o Chega for epifenómeno dado como morto e enterrado! - fará todo o sentido proclamar sempre o 25 de Abril e o fascismo nunca mais!

2. Uma das opiniões mais ousadas - mas que subscrevo sem pejo! - foi formulada nos dias mais recentes pelo jornalista António Marujo: a urgente substituição do vetusto hino nacional pelo Grândola Vila Morena.

Faria bem mais sentido proclamar a importância de ser o povo a mais ordenar do que contra canhões marchar, marchar...

3. Com toda a justiça juntou-se gente um bocado ambígua (Guilherme d’Oliveira Martins, Álvaro Vasconcelos) para homenagear Mário Soares na Fondation Maison des Sciences. E a eles se juntou, mesmo que pela net, o Edgar Morin a valorizar o que menos nele interessa: a fase do PREC, quando enfatizou o anticomunismo e andou de braço dado com o chefe da CIA em Portugal (Carlucci).

Continuo convencido, que nunca Álvaro Cunhal supôs possível a repetição de uma revolução bolchevique no Portugal de então, nem terá encontrado artes de contrariar uma dinâmica, que visaria devolver os meios de produção aos mesmos de sempre.  Terá sim, porventura, secundado Sebastião Salgado, numa outra esperança agora recordada numa entrevista singular: “a gente acreditava que Portugal ia ser completamente de esquerda”.

Vale que, depois como presidente, e sobretudo no período da troika quando sinalizou o caldo de cultura propício para formar-se o governo da Geringonça, Mário Soares contrariou a imagem alimentada nesse pós 25 de abril e reencontrou-se com o lutador antifascista o tempo salazarista-marcelista.

4. No extremo oposto o cabeça de fila da AD para as eleições europeias viu Carmo Afonso lembrar a queixa, depressa abandonada e arquivada, de uma antiga namorada quanto à violência com que foi por ele destratada.

Perante a sua falta de chá, senão menos malcriadez, não espanta esse episódio que justificaria melhor indagação pelo jornalismo de investigação. A violência doméstica é crime público e não deve haver complacência com quem a comete. Seja ou não cometa (esperemos que fugaz!) da direita sem escrúpulos.

5. Sem surpresa Fernando Araújo demitiu-se da liderança da Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde não chegando a comprovar a bondade das suas soluções.

Espera-se o pior para aquela que foi uma das mais prodigiosas heranças da Revolução e que as direitas quererão, definitivamente, garantir como chorudo negócio para os interesses privados.

6. Mas falando de direitas sem escrúpulos, que dizer da aprovação pelos conservadores ingleses da deportação para o Ruanda de todos os candidatos a asilo político, mesmo dos que para eles trabalharam no Afeganistão? Hipótese também já em vias de ser secundada pela Itália com o beneplácito da Albânia?

E que dizer da continuação do indecoroso apoio norte-americano a Israel, quando é o Departamento de Estado a publicar relatório a confirmar o que outras fontes (invariavelmente acusadas de antissemitas!) já proclamavam: violações odiosas de direitos humanos contra palestinianos, incluindo assassínio arbitrários ou ilegais, incluindo execuções extrajudiciais, desaparecimentos forçados, tortura e tratamento desumano ou degradante?

E o que dirão os financiadores da Ucrânia (nós incluídos) quando rebenta mais um escândalo: o do ministro da Agricultura a locupletar-se com a aquisição ilegal de terrenos no valor de sete milhões de euros, quiçá para garantir auspicioso futuro num pós-guerra, que tende a apressar-se com a vitória de Putin? 

terça-feira, 23 de abril de 2024

Milho aos pardais

 

1. Tão Amigos que nós éramos voltou a passar na Cinemateca na semana passada lembrando a frase sobre o quanto os personagens tinham querido mudar o mundo enquanto jovens mas, envelhecidos, acontecera-lhes o contrário.

Ela voltou a ter particular pertinência quando soube quem liderará a lista de deputados da AD ao Parlamento Europeu. Porque sendo natural - pelo menos era-o para a geração em vias dechegar à vida adulta no dia da Revolução dos Cravos! - que os jovens queiram transformar o mundo, fazendo-o mais justo e esperançoso, constitui enorme mistério porque alguns nunca o chegam a ser por os motivarem a preservação de uma realidade feita de exploração da maioria por uma minoria e um conservadorismo nos costumes a lembrar Ary dos Santos, quando lembrava quantos tinham sido concebidos em ceroulas.

Raras vezes me demorei a ouvir a criatura inventada pelas televisões mais do que o tempo necessário para fazer o higiénico zapping, mas sei que nada ganhei em nada dele reter sob pena de incómoda reação alérgica. Mas não duvido que está destinado a futuro político duradouro. Assim são premiados os que sejam prestativos servidores dos que agem na sombra como putativos donos disto tudo...

2. A primeira sondagem conhecida desde as legislativas ainda não coincide com os desejos de quem não se resigna com o golpe de Estado promovido pelos procuradores do DCIAP e anseia a retoma do curso dos acontecimentos prometido pelo governo da Geringonça. As esquerdas ainda não superam as direitas, mas para lá caminham. É só dar tempo ao tempo, que este é um interlúdio para dar milho aos pardais. 

domingo, 21 de abril de 2024

Imperativa a recuperação da consciência de classe

 

1. Pertinente a crónica de Rui Tavares Guedes na Visão a propósito da tendência dos bons resultados económicos já não bastarem para ganhar eleições e até serem “negligenciados nos inquéritos sobre a popularidade dos governantes”. Recorrendo à opinião de Paul Krugman e Francesco Rigoli conclui que “a política, mais do que um debate de ideias, transformou-se num duelo de estratégias de comunicação, apostadas em criar perceções desligadas da realidade”.

Fomentar ilusões - como a do trapaceiro choquinho fiscal de Luis Montenegro - estão a resultar em governos de que os eleitores deveriam fugir como da peste. Esperemos que a frase com que se conclui o texto se confirme: “no fim, como sabemos, a realidade vencerá sempre qualquer ilusão”

2. No Público de hoje o antigo ministro António Costa e Silva também glosa o tema, confirmando essa estratégia de comunicação, que levou as direitas a superarem as esquerdas em 10 de março: “Sempre existiu e existirá a mentira no espaço público, mas o que se passa é que hoje ela impera, dissemina-se rapidamente, o que é facilitado pela diminuição do pensamento critico e pelo enfraquecimento do poder de mediação dos media. A fragmentação das fontes de informação e as redes sociais criaram um mundo atomizado em que as mentiras e os rumores dominam e alimentam o ódio e o ressentimento.”

Razão para as esquerdas focarem-se num urgente trabalho nas redes sociais - já que as fontes tradicionais de comunicação são de quem nós sabemos quem!  - para transformarem esse ódio e ressentimento numa consciência de classe, que melhor identifique quem são os verdadeiros inimigos.

3. Poucas dúvidas sobram quanto à incontornável coligação das direitas (incluindo as ostensivamente xenófobas e racistas), quando o atual governo demonstrar a incompetência para lidar com a situação complexa, interna e externa, com que se confronta. E, na entrevista ao Observador , Passos Coelho pôs-se em bicos dos pés para ser ele a vir das trevas e, musculadamente, replicar o sentimento trumpista de vingança, que o tem amargado desde 2015.

quinta-feira, 18 de abril de 2024

Um videirinho de braços cruzados

 

1. É regra elementar aprendida no coaching: deve-se evitar a pose de braços cruzados, quando se discursa, negoceia ou interage de uma qualquer outra forma com quem se contacta publicamente. Porque dá a ideia de alguém retraído em si próprio, defendendo-se de imprevisíveis ameaças, que o possam atingir.

Luis Montenegro é pródigo em assumi-la - aliás a exemplo do que já acontecia com Passos Coelho e Paulo Portas na época da troika! - e, só nos últimos dias, vimo-lo assim,  primeiro perante Pedro Sanchez, depois num intervalo do Conselho Europeu.

Para além do medo a atitude defensiva de Montenegro tem outra interpretação: a de se sentir impostor na pele que o seu arrivismo o levou a vestir. E porque, intimamente - mesmo sem provavelmente ter visto o Barry Lindon  do Kubrick -, sabe quase nunca ser feliz o destino dos videirinhos.

Não é preciso grande esforço de memória para, comparando-se a António Costa, ser visto, interna e externamente, como um pobre amador. E os paralelismos vão-se confirmando com outros protagonistas no dia-a-dia nos debates televisivos : basta ver Alexandra Leitão apoucar Hugo Soares, ou Miguel Prata Roque rebaixar os morgados, que lhe ponham pela frente, para comprovar quanto os eleitores entregaram a governação a quem não tem talento, nem pinga de visão, para aquilo que só pode redundar num lamentável estrago.

2. O dia de ontem terá sido amargo para Lucília Gago e  seus acólitos com o Tribunal da Relação a dá-los como ineptos e eivados de juízos especulativos na imputação de graves acusações a quem se limitava a fazer o seu trabalho, quer do lado dos empresários do Data Center de Sines, quer dos governantes incumbidos de criarem as condições para o sucesso de um investimento de reconhecido valor económico e social para o país. Como comentou o insuspeito Manuel Carvalho na edição de hoje do Público tratou-se de uma evidente demonstração de abuso do poder judicial, que resultou na queda de um governo legitimado pela maioria absoluta, que o tornara possível.