sábado, 17 de fevereiro de 2018

A Igreja face aos escândalos pedófilos


Uma das curiosidades que assiste a quem da Igreja Católica portuguesa vai aumentando a desconfiança face às recentes intervenções da sua figura cimeira e da forma como no seu seio se contesta o papado de Francisco, é a de se saber porque, ao contrário do sucedido noutras paragens, não surgiram revelações sobre as tentações pedófilas dos seus pregadores. Lembramo-nos do crime perpetrado pelo foragido padre Frederico na Madeira e pouco mais se sabe. Porquê? Porque têm mais contenção nas hormonas ou por esconderem melhor os pecados sob um eficiente manto de silêncio?
Por agora acompanhemos o que se passa alhures através do documentário de Jesus Garces Lambert, que o canal ARTE exibirá na próxima terça-feira. Longa-metragem de produção italiana inicia-se com a promessa de “tolerância zero” prometida por Jorge Bergoglio em 2013, quando se  crismou de Papa Francisco. Antevia-se, então, a possibilidade de se encerrar um dos mais sombrios capítulos da história católica punindo-se severamente os autores dos abusos sexuais.
Cinco anos depois, apesar do avanço no reconhecimento das vítimas, a crise está longe de se considerar resolvida. Há padres indiciados como pedófilos que continuam em funções, tentativas de abafar certas histórias suspeitas, dignitários a pressionarem os queixosos para não prosseguirem com os casos na Justiça. Compreende-se que os próprios membros da comissão pontifícia para a proteção de menores, eles próprios antigas vítimas, tenham-se demitido em sinal de protesto.
Os costumes não se parecem ter alterado no seio de uma instituição habituada à cultura do segredo. O documentário procura questionar quais as resistências, que gangrenam a mínima tentativa de reforma e como o Vaticano ainda se pode arrogar da prerrogativa de se pensar acima da Justiça civil.
De Lyon à Pensilvânia, da Argentina à Itália, John Dickie e Jesus Garces Lambert abordam diversos casos de abusos sexuais em parte desconhecidos, mas protagonizados por padres que aproveitaram o ascendente espiritual para satisfazerem os desejos pedófilos nas crianças sob sua responsabilidade espiritual. Mas pretende-se ir mais além do que colecionar um conjunto de casos sórdidos: graças ao testemunho das vítimas, de padres dissidentes, de outros que confessaram os seus pecados e de psicólogos, sondam-se os mecanismos que levam a Igreja a esconder tais situações.
Olhando para os factos históricos, culturais, sistémicos e psicossexuais, os autores tecem um requisitório tenebroso concluindo que faz parte da essência das instituições essa quase inexpugnável cultura do silêncio.

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