segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Os sinais que anunciam o futuro das esquerdas

A vitória de Benoît Hamon nas primárias dos socialistas franceses poderá ser, com a designação de Martin Schulz para enfrentar Angela Merkel nas eleições alemãs, um dos dois momentos de viragem na realidade política europeia deste ano, por constituírem potenciais líderes com visões completamente diferentes das que possuíam os que irão substituir nos respetivos partidos. Ganhem ou não os combates a que se propõem, ambos sabem que as alianças preferenciais devem ser feitas preferencialmente à esquerda e nunca à direita e que essa coisa indefinida do «centro» é algo que ninguém hoje pretende. Estamos num tempo em que os eleitorados preferem escolhas entre opções bem ancoradas a um ou outro lado do espectro político num dobre de finados pelas várias designações do que, entre nós, se definiu como o arco da governação.
No caso de Benoit Hamon há também a novidade de um candidato credível para o mais alto cargo político do seu país, levar muito a sério as questões, que não se tardarão a pôr: como responder a um volume de emprego sempre menor por obra e graça da crescente automatização das linhas de produção? Como garantir que o direito ao trabalho, que não é apenas uma questão de sobrevivência, mas também de dignidade pessoal, possa continuar a fazer sentido na sociedade do futuro?
Hamon propõe medidas a aplicar a médio e longo prazo, que passam pela aprovação de um rendimento universal de existência para cada um dos cidadãos e a redução do horário de trabalho para as 32 horas semanais. Havendo poucos empregos de qualidade - e dando aos robôs o primado dos que são repetitivos e perigosos - a sua distribuição por número mais alargado de candidatos significará a possibilidade de limitar os riscos de grandes perturbações sociais.
Curiosamente, e sem nunca comentar o momento atual vivido na esquerda francesa, o economista Thomas Piketty, autor de «O Capital do Século XXI», deu uma entrevista à France Culture em que continua a denunciar o crescimento das desigualdades depois da queda do muro de Berlim, regressando-se a um passado anterior ao século XX. Terá sido neste que diminuíram, significa e temporariamente, graças à Revolução Bolchevique e às duas Guerras Mundiais. A Europa pouco pode fazer para infletir a tendência dos últimos anos, paralisada como se encontra pelo excessivo peso da dívida em alguns dos seus países.
A solução para Piketty passa pela aprovação de um imposto progressivo sobre o património a nível mundial através de um Tratado subscrito, e respeitado a nível global.
Utopia?, pergunta-lhe o entrevistador. Piketty lembra-lhe que os impossíveis de ontem são os exequíveis de amanhã. Quem é que, há vinte anos, acreditava que os suíços iriam deixar cair o sigilo bancário nos seus bancos?
Depois do parêntesis Trump será viável pensar numa reação de sinal contrário, onde as oligarquias financeiras e ligadas ao petróleo terão de ser postas na ordem através de mecanismos regulatórios, que as impeçam de cometer os crimes sociais e ecológicos, que se adivinham nos próximos quatro anos. Nessa altura até poderá vir a ser possível a implementação de uma das propostas eleitorais de Hamon e que já está a ser discutida no Parlamento Europeu: a taxação fiscal dos robôs na produção de bens transacionáveis.
Parece estar em curso um refluxo conservador, traduzido nas ameaças de diversas forças políticas de extrema-direita? É verdade, mas será crível que, como tem acontecido ao longo da História, a moda passe e os tempos que o Billy Bragg denuncia como estando a andar para trás, voltem a acelerar bem para diante... 

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