segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Os impostores que pairam por ai


Quando constatamos que cerca de 30% de inquiridos pelos institutos de sondagens confessam a predisposição para votarem por um dos partidos da direita, questionamo-nos se um em cada três portugueses beneficiou com as políticas austericidas implementadas á boleia do alibi da troika ou se muitos deles continuam vítimas da impostura de um discurso, que contraria os seus verdadeiros interesses?
E que dizer dos que iludem as mentes dos italianos, fazendo-lhes crer que todos os seus males derivam da excessiva presença de emigrantes e que tudo melhorará se os expulsarem. Vivemos numa sociedade de impostores, seja a coberto de discursos nacionalistas, populistas ou abertamente fascistas.
Cada sociedade tem os impostores que merece, porque é-lhes natural apresentarem-se como mártires da comédia social. Eles são verdadeiras esponjas vivas, que absorvem os valores, que organizam o drama social. A forma como hoje se calibram os comportamentos favorece as estratégias de camuflagem ligadas à impostura.
 Jean François Lyotard costumava dizer que hoje vivemos numa realidade em que importa não perder tempo. Ora, tendo em conta que pensar acarreta isso mesmo, o importante parece ser dispensarmo-nos de o fazer. Hoje todos os dispositivos de iniciação social, entre os quais a educação, estão concebidos para que economize o tempo dedicado ao pensamento. Tanto mais que ele acarreta angústia e incerteza. Porque decidir significa renunciar a algo e detesta-se renunciar. Hoje os discursos dominantes, que formatam a opinião pública, abandonaram as grandes narrativas, fossem elas políticas ou religiosas, para se centrarem nos indicadores quantitativos definidos pelas agências de notação financeira. Só conta o que se puder financeirizar, transformar em receita monetária.
Estamos ligados a uma cadeia de produção de comportamentos num sistema definidor do lugar que devemos ocupar para desempenharmos um papel funcional e que nos não obrigue a pensar. O grande problema das nossas sociedades tecnologicamente avançadas é mesmo esse: o de sermos «poupados» a conjeturar o que quer que seja, porque se espera de nós o mero cumprimento das rotinas e dos comportamentos correspondentes a esse enquadramento social e profissional. A técnica só nos exige uma execução.
Hoje continuamos sem viver numa verdadeira Democracia, porque confiamos o cumprimento das nossas aspirações a «especialistas»: os políticos eleitos para decidirem em nosso nome. Funcionamos em função das pressões dos lobbies, que se apoderam das opiniões públicas e transformam as eleições em meras sondagens periódicas sem conexão verdadeira com a participação efetiva de todos os cidadãos nas decisões coletivas.
As nossas sociedades tornam-se cada vez mais normativas, controladas, fazendo de cada um de nós uma peça na  produção coletiva. Guy Debord dizia que vivemos numa sociedade do espetáculo, que é o exato oposto dessoutra que era, ou podia ser, a do diálogo permanente.
O impostor é aquele que sabe adaptar-se às expetativas dos outros. Consoante as épocas, vão alterando os discursos com que iludem as vítimas. Respondem a uma espécie de encomenda inconsciente daqueles que o ouvem. Na sociedade de adaptação, que é a nossa, o impostor move-se como o peixe na água.

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