sexta-feira, 30 de junho de 2017

Uma megera, um munícipe com tiques fascistas e um falso psicólogo

1. Afinal, depois de um debate quinzenal morno, o PSD lançou um ataque feroz no dia seguinte pela boca de Teresa Morais, que ainda deve estar com azia de ter visto chumbada a sinecura para que o seu Partido a queria projetar com o voto da Assembleia da República. Não conseguindo presidir ao Conselho de Fiscalização das Secretas a deputada de Leiria apressou-se a demonstrar à saciedade uma das razões fundamentais por que era inadequada para tal cargo. Em vez de sentido de responsabilidade e parcimónia nas declarações, agiu com a fúria de uma divindade grega. Ora, de entre as várias erínias, não a conseguimos enquadrar na lógica da vingança - o que justificaria crismá-la de Nemésis -, nem de castigo - chamá-la-íamos então Tisifone -, nem mesmo do inominável - seria Alecto.
Assim sendo, e se há Fúria grega que lembra com o seu discurso, é a deusa do rancor. Fica, pois, e com toda a propriedade, como Megera.
2. Sempre senti incómodo com a coligação pós-eleitoral que o Partido Socialista fez com Rui Moreira no município do Porto. Engoli, mas não me soube bem, apesar do agrado aparentemente sentido por Manuel Pizarro e pela Distrital com essa solução. A rutura veio, pois, ao encontro da forma como entendo aceitável a conduta socialista. Porque Moreira, além de personificar um Porto elitista, sem legítima ligação à maioria dos que vivem na cidade, tem tão óbvios tiques fascizantes, que tê-lo como parceiro só pode significar justificado incómodo com muitas das suas atitudes.
O que está a acontecer com os cartazes do Bloco de Esquerda para as autárquicas só pode justificar a indignação não só dos militantes do partido em causa, mas também de todas as pessoas de bem, que não se reconhecem na intimidação, na busca de argumentações judiciais para dificultar o trabalho político dos adversários.
A ação posta em tribunal pelo Movimento de Moreira para que os cartazes em causa sejam proibidos por utilizarem graficamente o símbolo da autarquia só pode configurar o que vai na cabeça dos queixosos: eles julgam que a Câmara é deles e não dos cidadãos da cidade, que a ela concorrem como candidatos.
3. Pelas redes sociais fui tomando nota de um nome, o de Quintino Aires, que me descreviam como o tipo de troglodita, demasiado obsoleto para ser levado em conta, mas cujos desaforos mediáticos suscitavam o espanto por se julgar impensável haver quem pense, quanto mais diga da boca para fora, o que se torna motivo de escárnio, mas também de indignação pública.
Agora terá invocado um estudo científico - que obviamente não chega a especificar! -para asseverar que 75% dos consumidores de cannabis têm relações com parceiros do mesmo sexo. Esta afirmação, que em si nada tem de substantivo, busca estigmatizar na mesma toleima os consumidores de drogas leves e os homossexuais, procurando fácil sucesso junto do público mais preconceituoso, que se estupidifica a ver tais programas. Tempos atrás o mesmo «psicólogo» cuidara de alimentar o mesmo tipo de ódio para com os ciganos.
Quem veio logo em socorro do energúmeno foi a TVI, argumentando com supostos princípios de Liberdade e de Democracia, quando mais não faz com as suas emissões do que espezinha-los constantemente.
Uma Comissão Reguladora da Comunicação Social, que fosse competente e se respeitasse, deveria abrir sucessivos processos ao canal de Queluz de Baixo, ponderando até na justeza, ou não, de manter a licença para continuar a emitir tanta sordidez.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Parvoíces

Sei que esta época é sempre monótona: pensa-se, sobretudo, nas férias de verão, e a política secundariza-se, dando espaço aos invariáveis textos parvos nas capas das revistas. Silly season, assim crismaram os ingleses esta fase, só ainda sobressaltada pelos mortos de Pedrógão.
Mesmo à distância vou tentando acompanhar as notícias nas televisões e nos jornais e nada parece sair da banalidade. Quase lembra o filme do Jim Jarmusch, agora em exibição no Ideal Paraíso, sobre a estória de um motorista com uma vida todos os dias sempre igual.
O governo governa, os parceiros de coligação emparceiram, o líder da oposição estatela-se e a sucessora de Portas inquieta-se com os filhos encomendados a uma colónia de férias à beira das florestas. Bem poderia ganhar sossego com a opinião especializada de Passos, que adora eucaliptos e explica a intenção de lhes reduzir os impactos nos fogos, porque Costa tem de contentar os Verdes. Se isto não é silly, que mais será preciso arranjar?
Embora tenha chegado tarde à emissão em direto do debate parlamentar de ontem aquilo a que assisti foi o habitual: António Costa a passear-se como um grande senhor por entre as cabisbaixas bancadas das direitas.
Na entrevista de hoje Santana Lopes procura dar algum alento aos desencantados do seu campo: anuncia a possibilidade de se terem acabado as boas notícias com que Costa tem brilhado, vendo no incêndio da semana passada o ponto de viragem. Tivesse dado a entrevista a David Dinis depois da derrota com o Chile, o provedor da Santa Casa encontraria nesse resultado mais uma prova evidente de, desta é que sim, o Diabo não tardará a vir aí apressado a desculpar-se da falta de pontualidade no seu compromisso com Passos. Como de costume na criatura, a argumentação das quatro páginas acompanha este registo primavera-verão: obviamente silly...
Para a parvoíce ser mais completa o i vai-se aprimorando em capas risíveis, porventura resultantes dos seus próprios focus groups, o tavares indigna-se por não ser o barreto a presidir à Comissão Independente sobre os incêndios e o vieira pereira diz que houve crime, sim senhor, mas sempre afeiçoado á vida boa de Lisboa.
Pena ter-se parado com a velha brincadeira de tentar descobrir onde está, e quem é o wally, neste caso um tal sebastião pereira, que fez toda a gente andar a cogitar quem seria. Mas o tom continua com o escândalo de uma palavra dita pelo nosso eurofestivaleiro num espetáculo, que me dizem ter sido do mais pimba que se poderia imaginar. Mais parvoíces em suma.
E, no entanto, por estas bandas neerlandesas, as coisas não andam mais animadas: a modorra é tanta, que estes tipos com que me cruzo quando vou às compras ou ao colégio da neta, não parecem nada preocupados por eu ir indo e vindo entre Lisboa e Haia e continuarem por ter um governo digno desse nome...

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Falências políticas e financeiras

A eleição de Trump, e sobretudo o seu comportamento errático nestes cinco meses de ocupação da Casa Branca em que nem sequer conseguiu pôr fim ao Obamacare, pode dar muitas esperanças aos Democratas quanto a vitórias nas parciais para o Senado e para a Câmara dos Representantes do próximo ano, mas é bom que metam a casa em ordem e definam o que querem.
O texto de Alexandre Martins na edição de hoje do «Público» é elucidativo quanto ao tempo perdido até agora pelo grande Partido da oposição. Esperava-se uma rápida análise de tudo quanto conduzira ao catastrófico resultado de novembro transato e a correção das políticas e estratégias seguidas, mas continua-se por definir se optará por uma linha mais centrista, se mais acentuadamente à esquerda de acordo com os desejos dos apoiantes de Bernie Sanders. As dúvidas deveriam ser dissipadas em função dos ensinamentos recolhidos nas quatro eleições parciais, entretanto organizadas para outros tantos lugares da Câmara dos Representantes. Todos eles pertenciam a Republicanos, pelo que a eventual vitória num deles significaria o prenúncio de uma viragem política em favor dos Democratas. Ora isso não sucedeu: na Geórgia, onde concorreu o challenger mais centrista os resultados foram dececionantes. Pelo contrário nos distritos rurais do Montana e do Kansas, onde as vitórias republicanas costumavam ser esmagadoras, revelaram-se bem mais apertadas graças a candidatos próximos do velho senador, quase vitorioso nas primárias.
Tudo aponta, pois, para um sucesso potencial das propostas mais à esquerda, à medida das aspirações dos eleitores desencantados com uma América, feita de pesadelos em vez dos prometidos sonhos. Se os candidatos democratas afinarem pelo diapasão do mais do mesmo, sairão tão chamuscados quanto Hillary Clinton.
Esperemos que o grande partido aprenda depressa tal lição.
Trump, por seu lado, tem muito pouco de que se gabar. A mais recente edição da «Mother Jones» revela como, depois de surgir com todo o espavento em 2012, as Torres Trump em Toronto perderam o nome e passaram para novos investidores após rotundos fracassos financeiros.
Como sucedera com outros empreendimentos, construídos sem aplicação de dinheiro seu, essas torres eram construídas captando dinheiros privados, cujo aliciamento era garantido com bem sucedidas campanhas publicitárias capazes de prometerem avultados rendimentos aos investimentos nelas aplicados. Um milionário comprava as frações, que entendesse, pagando-as ainda na fase de projeto, esperando receber uma generosa comissão sobre o seu aluguer tão-só ficassem concluídos tais arranha-céus.
Cinco anos depois nem os incautos foram em número suficiente para levar essas torres à conclusão, como os lautos dividendos nunca lhes chegaram aos bolsos. A exemplo de outros parceiros de negócios de Donald Trump, há muitos indignados com a espoliação de que se viram alvo.
Para que o crime não compense há a reconhecer que a eleição não terá ajudado grande coisa os negócios da organização do seu mentor: gozando de má fama, os hóteis Trump esvaziam-se, mesmo com pacotes de descontos significativos para quem neles teime pernoitar. Por outro lado muitos associados de Trump, nomeadamente da Ucrânia e da Rússia andam a movimentar os seus duvidosos pecúlios para outros investimentos, que não os da ambígua personagem. Resultado: a ambição de chegar à Casa Branca poderá revelar-se-lhe ruinosa. O que se trataria da mais elementar Justiça!


Jornalismo: uma luzinha a acender-se ao fundo do túnel

O episódio do suicídio, que afinal nunca existiu, serviu para percecionar uma eventual mudança no comportamento do jornalismo português em relação às direitas de que, com raríssimas exceções, se fez porta-voz nos últimos seis ou sete anos.
Ao rever as imagens do atrapalhado Passos Coelho face às insistências dos jornalistas, que lhe pediam dados concretos sobre a notícia em causa, assistiu-se a algo de incomum ainda há algum tempo: é que o ainda líder laranja habituara-se a debitar bitaites para os telejornais sem que houvesse quem tratasse de lhe exigir fundamento ao que dava como certo. Por isso, baseado em rumores ou até como fruto da imaginação de um dos seus mais azougados colaboradores, achou por bem avançar como uma «novidade», que adivinhava capaz de fazer mossa ao governo na abertura de todos os telejornais.
Que chatice a de lhe estarem a estender microfones alguns jornalistas com sentido crítico e ousadia bastante para exigirem mais do que mera retórica eleitoralista. Foi quanto bastou para se ver Passos estendido ao comprido, obrigando-se à cena memorável de ter de se desdizer.
Doravante ele fica ciente de se conter na emissão de fake news, porque já não conta com a complacência acrítica de quem lhe costumava aparar todos os golpes. Façamos votos de que este pequeno exemplo seja o prenúncio de atitude diferente de uma classe ainda há pouco reunida em Congresso supostamente empenhado no incremento das boas práticas deontológicas.
Apesar das judites de sousas, das anas lourenços ou dos zésgomesferreiras, há, pois, esperança em que o jornalismo luso volte a estar á altura do praticado na época dos seus maiores vultos, aqueles que nem sequer a besta fascista impedia de espelharem a realidade por maiores voltas que se vissem obrigados para contornar a abjeta censura.

terça-feira, 27 de junho de 2017

Anúncios mais do que suspeitos

Os romances da Agatha Christie que li na adolescência, sempre me convenceram da regra axiomática de só cometer crimes quem, de uma ou outra forma, lucra com eles. Vem isto a propósito do anúncio norte-americano quanto a estar em preparação um novo ataque químico por parte das forças afetas ao Presidente Assad.
Se em tempos não se pode excluir essa hipótese, porque existiam arsenais que foram destruídos sob controlo internacional, os ataques subsequentes, a elas imputados, cheiraram demasiado a esturro. Sempre pareceram argumentações de quem, não possuindo móbil do crime, que pretenderia imputar ao mesmo suspeito, tratava de os perpetrar por sua conta atirando as culpas para ombro alheio.
Assad seria tonto se adotasse tal conduta, sabendo o quanto ela daria fundamento áquilo que tantos crápulas desejam: a invasão da parte da Síria, que controla para a entregar aos sicários financiados pela Arábia Saudita e inspirados pelos agentes da CIA no terreno.
Mas a notícia de ontem tende a constituir uma nova escalada na estratégia: os criminosos anunciam a preparação dos homicídios, que intentam concretizar, para depois os atribuir ao inimigo Assad. Trump, que tem a delicadeza do elefante em loja de porcelanas, julga ser essa a forma de acabar de vez com o problema sírio, adivinhando-se o quanto ele se agravaria ainda mais se conseguisse levar por diante tal intenção.
Não me admiraria que os russos - ciosos de manterem a sua importante base naval naquele país do Médio Oriente - estejam já a preparar a celebérrima cassette comprometedora para Trump em que ele anda à chuva … dourada!

Valls que vale nada

A notícia de Manuel Valls ter saído do Partido Socialista francês nem o é sequer, mas serve de mais um exemplo - e existem-nos demasiados! - de gente que entra em partidos de esquerda para, voluntariamente, ou de acordo com o que não consegue deixar de ser no âmago, intentar destrui-los.
Infelizmente o agora deputado de Essonne já dera mais do que provas de quão pouco socialista era. A sua prática era coberta pela autodesignada condição de social-democrata que, por estes tempos, mais não é do que a capa sob que se cobrem quantos temem o regresso dos valores fundamentais das organizações apostadas em conseguir sociedades mais justas e igualitárias. Aqueles que, pelo contrário, têm valido apoios eleitorais dos jovens e das camadas mais esclarecidas das respetivas sociedades a Bernie Sanders ou Jeremy Corbyn.
Alegarão os cínicos, que ambos terão perdido as respetivas eleições, mas bem podem engolir em breve essa impudência, porque nem Trump, nem May - e já agora nem Macron ou Rajoy! - estarão em condições de reparar o rombo nas barcas capitalistas, que pretendem direcionar para os seus amanhãs cantantes, como os velhos tontos irão desaparecendo conjuntamente com os seus retrógrados valores.
O quinquénio com Hollande na condição de marionete-mor dos interesses agora, efetivamente, chegados ao poder sem qualquer disfarce, figurará num dos mais negros da esquerda francesa, mas ao mesmo tempo permite reformatar-se sem a carga inútil dos muitos agora tomados de amores pelo canto de Macron.
Não sendo a primeira vez que o partido de Jean Jaurès tem de renascer de períodos particularmente difíceis, esperemos que as tropelias de Valls e de Hollande não fiquem esquecidas quando - e esperemos que isso possa voltar a acontecer em 2022! - regressar ao Eliseu e ao Matignon.

Pedrógão Grande, Passos pequeno

A distância a que estou de Portugal não me inibe de sentir viva indignação pelo que aí vai sucedendo e atinge a dimensão do desaforo mais escandaloso. Saber que Passos Coelho anda a cavalgar por cima da tragédia da semana passada invocando um possível suicídio, relacionado com a «falta de apoio psicológico» a um dos sobreviventes, só pode acrescentar desprezo a quem o já considerava uma repulsiva criatura. Sobretudo lembrando como nunca teve uma palavra, um sobressalto sequer, pelos inúmeros desesperados que desistiram de viver durante os quatro anos da sua repulsiva desgovernação.
Não sei se houve alguém que possa ter levado ao desespero ao extremo depois de perder quem lhe era muito querido ou se viu desapossado de bens que constituíam o objetivo de tudo quanto vivera. Se aconteceu as palavras de Passos Coelho são tão obscenas quanto a execrável reportagem de Judite de Sousa com um cadáver como décor.
Se, pelo contrário, não houve qualquer suicídio a lamentar e algum marketeiro laranja decidiu criar uma fake new ainda a sua conduta é mais condenável por já não encontrar argumentos na realidade e tê-los de inventar no mundo virtual, que lhe vai animando a tosca mente.
Como havia quem o sublinhasse no twitter, Pedrógão é grande, mas Passos revela-se muitíssimo pequeno.

domingo, 25 de junho de 2017

Um sonso persistente, mesmo que inepto

Nos últimos anos as estratégias fascistas têm sabido adaptar-se às circunstâncias contemporâneas, tornando-se particularmente bem sucedidas no recurso à demagogia mais primária, às notícias falsas, ao contorno dos dados de forma a dar-lhes uma leitura mais de acordo com os seus intentos.
Trump foi o mais bem sucedido nessa atualização das metodologias, mas Orban, Erdogan, Duterte ou o gémeo sobrevivente da Polónia também alcançaram o poder com tais «ferramentas». Só não foram suficientes para os fascistas, que têm assombrado as incipientes democracias europeias nos últimos anos, mormente na Áustria, na Holanda, na França ou em Itália.
 A última eleição presidenciais em Portugal foi ocasião interessante para ver despontar esse tipo de demagogos. Três deles destacaram-se pela falta de vergonha com que esgrimiram argumentos, só nos valendo o facto de todos serem uns meninos ao lado de uma Marine Le Pen ou de um Geert Wilders: Henrique Neto já não passa de um velho dos Marretas, Tino de Rans é o idiota da aldeia com pretensões a ser levado a sério e Paulo Morais lembra aqueles acólitos de igreja, que envelheceram sem cumprirem o desejo de se verem investidos na missão de sacristão.
Vem isto a propósito deste último continuar a alimentar uma campanha de persistente apelo a emoções primárias na esperança de vir a ser mais levado a sério do que no inverno do ano passado, quando os seus votos nem sequer lhe bastaram para merecer a subsidiação da tíbia campanha.
Agora ataca as PPP’s das rodoviárias. De facto quem não gostaria, que elas fossem rapidamente nacionalizadas, poupando ao Estado o pagamento de verbas significativas, que tanta falta fazem ao investimento público? Estivéssemos nós numa situação revolucionária e seria medida tomada com plena justificação. Mas um governo enquadrado na União Europeia, com regras a cumprir, pode dar-se a tal extremo? Claro que não, sob pena de vir a pagar indemnizações avultadas em processos judiciais quase por certo perdidos!
E que dizer da anunciada proposta para que o Ministério Público averigue tais contratos? O complexado ex-acólito por certo não ignora que os atos de governo dificilmente podem ser questionados a menos que se descobrissem provas evidentes de corrupção na sua negociação.
É tudo isso que me faz execrar Paulo Morais, mudando de canal sempre que ele me ofende ao aparecer nas  televisões: essa prática de aparentar honestidade com segundos objetivos, ambicionando  explorar as paixões populares, é do que de mais repugnante posso encarar na vida pública. Até porque sabem-se lá os vícios privados que se escondem naquela cara de sonso!

A teimosia dos falhados

Quem não deve não teme! É essa a lógica seguida pelo governo de António Costa em relação a tudo quanto se passou em Pedrógão Grande na semana passada. Sem qualquer entrave a comissão independente, pretendida pelo PSD, fará o seu trabalho com acesso a todas as informações disponíveis e as ainda em processo de recolha e lavrará as suas conclusões.
Para quê, questiona-se? O PSD e os CDS tentarão extrair das conclusões uma linha ou uma frase a que se agarrem como cão a osso para exigir a demissão da ministra da Administração Interna. Sempre presos a sofismas, que depois falham, as direitas desistiram do Diabo, mas agarram-se à desesperada hipótese de conseguirem que, caindo um ministro, logo todos os outros tombarão, permitindo-lhe um bombardeamento mediático de falácias suficientemente bem sucedidas para infletirem a queda ininterrupta nas sondagens.
Terão alguma sorte em tal desígnio? Quase por certo não, a menos que fossem buscar ao «El Mundo» o «misterioso» Sebastião Pereira para liderar essa comissão independente. Mas, como nenhum especialista digno desse nome deseja associar-se a conclusões, que não sejam científicas, o mais certo é a inculpação do desordenamento do território com a responsabilidade a atravessar transversalmente todos os governos dos últimos trinta anos sem exceção, mas com particular incidência nos promotores da desertificação rural (nos mandatos de Cavaco Silva) e de liberalização da expansão do eucalipto (no de Passos Coelho e Assunção Cristas).
É por tudo isso que acredito na repetição do que já vem sendo demonstrado como evidência constante: as expetativas das direitas para porem em causa o governo socialista acabam atempadamente por estiolarem-se na sua insignificância.

sábado, 24 de junho de 2017

A origem do cenário de cinzas

Como não dar razão a Pacheco Pereira, quando ele descreve a maioria das transmissões televisivas dos últimos dias como um enorme exercício de «masturbação da dor»? Valeu tudo para garantir audiências e, tanto quanto possível, incriminar o governo por tudo quanto, legitimamente ou não, se inscreveria no âmbito das suas competências. Ainda assim alguns desses trabalhos informativos tiveram o condão de exemplificar a raiz em que assenta o problema anual dos fogos florestais: foi o caso da entrevista com o “benjamim” de uma aldeia com cinco habitantes, dos quais esse homem de 67 anos, era o menos incapacitado.
Em regiões tão desertificadas, com espaços habitacionais quase inteiramente desocupados, restando um punhado de idosos, como é possível garantir a limpeza dos matos se eles mal ganham para a alimentação e para os remédios?
Olhando para o passado foi Cavaco o «autor» deste Portugal, que recebeu subsídios fartos para abandonar a agricultura e as pescas. Não  foi por acaso que, tão só convidado a formar o seu primeiro governo, foi buscar o Ministro da Agricultura à Soporcel. Essa nomeação continha todo o programa que  se seguiria nos anos dos governos AD: o abandono dos campos, a ocupação progressiva do território com eucaliptos. Formaram-se desde então uma catadupa de lobistas da fileira das celuloses, que iremos ouvir nos próximos dias repetirem tantas vezes quanto as necessárias, que o eucalipto é «nosso amigo», um «petróleo verde», que tanto nos poderá enriquecer. Seria muito positivo que, por cada uma dessas intervenções, tais “especialistas” e “professores universitários” nos elucidassem quanto aos patrocínios escondidos por trás do frete a que se dispõem.
Seriam depois participantes nesses governos das direitas, que constituiriam o BPN e proporiam a Durão Barroso a parceria público-privada para a utilização do SIRESP, equipamento de comunicações, que valeria no máximo 100 milhões de euros e foi comprado por cinco vezes mais.
Do que os cavaquistas e as direitas em geral não terão assim tanta culpa é quanto ao aquecimento global, já manifestado no início precoce do verão enquanto ainda deveria ser só primavera, e estendendo-se outono adentro até ao começo da estação das chuvas, concentradas num cada vez mais exíguo período de inverno. No sábado da tragédia a temperatura média foi de 29,4ºC, ou seja dez a mais do que se deveria verificar nessa altura.
Agora a dificuldade será corrigir  o que todos sabem estar mal: as propriedades muito pequenas e segmentadas, a vegetação descontrolada a tomar conta de todos os terrenos abandonados, a inexistência de um ordenamento criterioso com caminhos de acesso para os meios de combate a incêndios e abertura de clareiras para a preparação de “fogo amigo”. Mas, tendo em conta a reação truculenta dos que viram as suas casas derrubadas nas ilhas em frente a Faro e a Olhão, bem se poderá esperar bem pior, se o governo avançar com expropriações coercivas das pequenas propriedades regressadas ao seu estado mais selvagem. Não faltará Cristas a esganiçar-se contra o que entenderá ser um atentado à propriedade privada.
Certo é que, por conta do sucedido, este governo será sujeito a trabalhos esforçados nos próximos meses. Sobretudo se quiser reduzir as possibilidades de ver repetido este desolador cenário nos anos vindouros...

sexta-feira, 23 de junho de 2017

Ávido de inquéritos o PSD bem poderia responder a questões pertinentes sobre o SIRESP

Um mistério para os partidos do anterior governo esclarecerem: porque é que chegaram a acordo em abril de 2015 com o consórcio fornecedor do SIRESP para uma redução de 25 milhões de euros até final do contrato  em 2021 e não o concretizaram com a correspondente decisão no Conselho de Ministros? Será porque isso corresponderia a um corte nas «rendas» no grupo cavaquista desse consórcio, igualmente associado à bancarrota do BPN?
Seria já o atual governo a implementar tal corte em dezembro desse ano, poucos dias depois de entrar em funções.
Quem assina essa peça jornalística no «Público» - Paulo Pena, jornalista cuja credibilidade prezo - procurou junto de Luís Marques Guedes, então secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, a razão para nunca se ter agendado a aprovação desse acordo, mas, sabe-se lá porquê, ele escusou-se a responder.
Fernando Alexandre, economista e professor da Universidade do Minho, então envolvido na negociação, não tem duvidas quanto ao que deveria ser feito de imediato: a nacionalização do sistema para se o poder melhorar já num contexto diferente do atual, evitando-se a aquisição de outro sistema em 2021, quando terminar a atual Parceria Pública-Privada.
O texto não o pressupõe, mas as muitas notícias destes últimos  dias sobre os falhanços do sistema de Redes de Emergência e de Segurança no sábado transato (uns dizem ter havido falhas momentâneas, outros falam de 14 horas) não  terá, afinal, a ver com o posicionamento dos concorrentes para conseguir contrato chorudo nessa altura? Uma outra questão pertinente tendo em conta o comportamento ganancioso de quem lucra com este tipo de sinistro.

Dois figurões candidatos a incendiários

1. Se há quem deveria mostrar algum recato em relação ao aproveitamento político da tragédia de Pedrógão Grande, Assunção Cristas figuraria por certo na primeira fila. Não foi ela quem, durante os quatro anos em que assumiu a responsabilidade pelas florestas portuguesas, cuidou de maximizar a plantação de eucaliptos?
A falta de vergonha é imensa quando aparece em tom pespeneta a inquirir António Costa na forma de vinte cinco perguntas divulgadas previamente à comunicação social.
Porque é educado e mostra um notável controle a reagir a tais desaforos, o primeiro-ministro por certo porá algum assessor a dar resposta à sucessora de Paulo Portas. Mas que o mais comum dos mortais trataria de atirar esse rol para o lixo não tenho a menor dúvida. Porque é esse o sítio certo para acolher tal obscenidade.
De qualquer forma, e muito embora o estar fora do país me impeça de acompanhar o debate quinzenal da próxima semana, está prometida violenta peixeirada por conta de Montenegro e de Cristas. Só tenho pena de não assistir em direto à elegância com que António Costa responderá com contundência assassina a tais figurões.
2. Estranhei as palavras equilibradas de Jaime Marta Soares no sábado, quando foi dos primeiros comentadores do sucedido em Pedrógão. Mas porque um escorpião nunca deixa de revelar a sua verdadeira natureza ei-lo a lançar a confusão sobre a origem do incêndio atribuindo-o a uma suposta mão criminosa.
Obviamente que a Judiciária não ficou satisfeita, tão lesta se tinha revelado a demonstrar a origem natural do sinistro ao encontrar a árvore atingida pela descarga elétrica ao princípio da tarde de sábado: não só ela tinha a casca aberta como sempre sucede nessas situações  como o chão em volta estava com a terra recozida, mais arenosa e com um brilho diferente, quase vitrificado. De acordo com as melhores práticas científicas o ground zero do fogo não deixava a menor dúvida quanto á sua efetiva localização.
Perante a ciência, Marta Soares apostou em ser a voz por que esperavam todos os órgãos de comunicação social para apimentarem as suas reportagens: sem qualquer fundamento inventou a teoria da mão invisível. Ora os registos revelam que, entre as 14.30 e as 16 horas dessa tarde fatídica ocorreram trezentas descargas elétricas na região de Pedrógão Grande e que o alarme de incêndio aconteceu ás 14.43. Onde estão afinal os comprovativos de já existir ignição anterior a esse alerta?
Conseguindo lançar a confusão Marta Soares remeteu-se à clandestinidade: a Judiciária bem procura, que ele lhe dê as provas do que disse, mas o boateiro ainda não encontrou disponibilidade de agenda para o fazer.  É preciso fazer um desenho sobre o que está aqui em causa?
3. O fenómeno, que terá apanhado de surpresa a maior parte das vítimas de Pedrógão tem uma designação, que desconhecia até agora: o downburst. Trata-se de uma massa de ar descendente , que chega ao solo e se espalha de forma radial, causando ventos fortes. Parece um tornado, mas não o é.
Em função de quem sobreviveu para testemunhar o ocorrido, os peritos inclinam-se para considerar este tipo de comportamento da Natureza como a causa mais provável para, em cerca de quatrocentos metros, morrerem tantas pessoas.
4. Nos meus “anos africanos” assisti muito frequentemente a trovoadas muito violentas, quer secas, quer húmidas. No Gabão, nos Camarões ou na Costa do Marfim, ou menos frequentemente na Nigéria ou na Serra Leoa, elas apareciam subitamente quase sem se fazerem anunciar e iluminando os céus plúmbeos com violentos encadeamentos.
O que terá sucedido em Pedrógão terá sido algo de semelhante: nas nossas latitudes são as nuvens em forma de flocos de algodão a suscitarem esse tipo de descargas, sobretudo se revelam significativa extensão vertical. Porque a camada de ar imediatamente abaixo de tal nuvem estava demasiado seca - a humidade estava abaixo dos 20%! - a chuva nela contida evaporou. Daí que os curto-circuitos entre a nuvem e terra firme contivessem tal perigosidade. Com as consequências conhecidas.