domingo, 11 de dezembro de 2016

Da ditadura de Erdogan à intensa corrupção romena

1. O ano está quase a acabar e eu em vias de perder a aposta feita comigo mesmo num post aqui publicado nos dias seguintes ao do “golpe” de 15 de julho na Turquia, quando Erdogan aproveitava para fazer razia total nos políticos, intelectuais e jornalistas da oposição, silenciando-os, prendendo-os ou forçando-os a fugir para o exílio.
Na altura previ que não seria de excluir um atentado com pontaria bastante para acabar com o ditador antes da entrada no novo ano. Tratava-se tão-só de confiar na competência dos curdos ou no despeito dos militares transformados em marionetas do poder político. O problema é Erdogan estar apoiado politicamente pelos mesmos setores sociais, responsáveis por Trump chegar à Casa Branca.
Há dias acenei no skype à Seden, uma jovem turca conhecida há meia dúzia de anos em Londres quando era flatmate do familiar a quem estava a visitar precisamente na altura em que com este fazíamos a comunicação regular via net.
Acabada de regressar da terra natal, onde fora visitar os pais, deu conta de um ambiente asfixiante um pouco por todo o país, razão não só para ter evitado Istambul onde tal clima é mais intenso, mas também em apressar-se a voltar à capital inglesa, ciente de não haver condições para o regresso definitivo a casa tão insuportável é o quotidiano de quem se ocidentalizou nos valores e no trajar.
Mas por ora é genuíno o apoio de Erdogan junto da população iletrada e religiosa por razões compreensíveis: aproveitando o crescimento económico, que valeu ao Estado um significativo aumento nas receitas, ele tratou em aplica-las em tudo quanto lhe rendesse votos. Saneamento público e água canalizada a populações, que nunca tinham conseguido tal direito, estradas e serviços assistencialistas orientados para a redução da pobreza.
Beneficiada com o que já há muito deveria ter recebido, esse setor social vê em Erdogan um deus. E constitui boa parte dos dez milhões de militantes com que conta o seu partido, o AKP. De entre eles estão 4 milhões de mulheres, que se sentem satisfeitas por poderem utilizar o véu onde queiram e nenhuma importância atribuem a outros direitos reprimidos como o de expressão ou liberdade de imprensa.
Com o seu misto de conservadorismo social e de liberalismo económico, a realidade tende a sorrir ao ditador. Até por contar proximamente com um amigo dileto em Washington. Mas atrás de tempos, tempos vêm, e as receitas públicas não têm crescimento infinito. Pelo contrário, a perda de muito conhecimento ligado a quem foi despedido, preso ou exilado só tende a reduzir as possibilidades de prossecução do «milagre económico» neo-otomano. E cessando a redistribuição dos últimos anos por efeito da corrupção, que lavra ao mais alto nível do Estado, voltarão a criar-se as condições para ver a Turquia retomar o laicismo republicano implementado por Ataturk. Suba ou não Erdogan mais alto que Carrero Blanco...
2. Corrupção também é a que se encontra em todos os principais partidos romenos, que disputam hoje as eleições legislativas, todos eles apresentando candidatos anteriormente já inculpados por tal acusação.
Não deverá, pois, existir grande diferença no relacionamento difícil entre o poder político e o judicial, tendo em conta a determinação com que este último investiga, prova e condena quem se aproveitou dos cargos públicos para enriquecer.
Continua a não ser devidamente analisada a relação causa-efeito entre o fim dos antigos regimes do Leste europeu e a corrupção em altíssima escala. Interpretações simplistas não faltam, todas elas eivadas de um anticomunismo primário. Mas o fenómeno, desde a Rússia à Bulgária, da Roménia aos países saídos da ex-Jugoslávia, é bem mais complexo do que pretendem os que só apostam na lógica ideológica. E terá, sobretudo a ver, com as expetativas de acesso inesgotável às delícias do consumismo ocidental e elas só ficarem ao alcance de quase nenhuns... 
Gulsun Karamustafa

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