quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Eu continuo a desconfiar dele

1. Quem me lê com alguma regularidade já sabe o que penso do presidente da República: nem que se pinte da minha cor clubística, nunca me convencerei da sua boa fé no exercício das suas funções. Por isso, quando vejo muita gente de esquerda iludida pelas suas palavras, julgando-o um tácito apoiante da estratégia governativa de António Costa, costumo redarguir: esperem-lhe pela volta e logo veem do que ele é capaz.
Mesmo na frase que parece ter deleitado esta semana tantos socialistas e enfurecido quem nele terá apostado para a rápida demissão do governo empossado semanas antes por Cavaco Silva, devemos escalpeliza-la com mais atenção e ver o que nela subjaz de essencial: “Neste momento, configurar um centrão artificial, imposto, na governação do país seria pouco clarificador. O clarificador é saber-se exatamente o que é proposto por cada uma das fórmulas governativas que no momento existem e podem existir, desejavelmente, até ao fim da legislatura”.
Da frase as duas palavras mais importantes são logo as suas primeiras: “neste momento”, repetidas mais adiante para que não tivéssemos dúvidas quanto á sua pertinência. Ele avisa que  a atual bonomia só dura  enquanto não tiver as  condições para substituir o atual governo por outro mais a seu gosto em que se juntem socialistas e pêpêdês na mesma amálgama com estes a decidir e os primeiros a fazerem-lhes ámen.
E se tivéssemos dúvidas bastaria ler o texto publicado por Pedro Duarte, o dirigente partidário que lhe organizou a campanha presidencial e o acompanhou diariamente por todo o país em tal período. Podendo exprimir o que pensa o seu comparsa, com a liberdade de não ser tolhido pela função institucional, ele critica a solução governativa com os esgotados, mas repetidos argumentos das direitas: “Este Governo garante estabilidade, mas ignora qualquer ideia de futuro, qualquer visão estratégica, qualquer caminho de afirmação nacional. Gere a espuma dos dias com habilidade, mas empurra os problemas para debaixo do tapete.”
Como se a especialidade de atirar os problemas para debaixo do tapete não fosse propriedade de Passos Coelho e de Marilú Albuquerque.
2. Em Espanha a representante do que os socialistas espanhóis ainda contém da nociva Terceira Via, está a preparar-se para abocanhar o partido.
Sempre contando com a inspiração de Felipe Gonzalez, que há muitos anos esqueceu os valores e princípios pelos quais chegou a presidente do governo espanhol, Susana Diaz personifica a repetição das soluções políticas do passado, já castigadas sucessivamente pelos eleitorados como obsoletas, e incapaz de aprender com as lições que o Partido Socialista dos vizinhos ibéricos lhe poderiam prodigalizar.
Esperemos que Pedro Sanchez, ou algum camarada apostado em apostar nas convergências à esquerda em vez de conciliações com as direitas, leve por diante o combate pela renovação do PSOE. A generalidade dos socialistas europeus agradecem…
3. A galeria de horrores  inaugurada por Donald Trump continua a confirmar-se: para embaixadora da ONU manda uma amiga de Sarah Palin conotada com o Tea Party (embora os entusiastas da nova Administração sublinhem o facto de ser mulher e de raízes indianas). Para a Educação vai uma milionária cujo projeto é pôr o Estado federal a subsidiar as escolas privadas distribuindo vouchers aos encarregados de educação apostados em não enviarem os pimpolhos para as do ensino público.
Quem alimentasse algumas ilusões deveria delas prescindir rapidamente por falta de fundamento. 
Pedro Calapez, O que existe além do horizonte

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