quinta-feira, 28 de julho de 2016

Uma questão de Grandeza (com g grande)

Nós, portugueses, conseguimos ser gloriosos na valentia e mesquinhos na cobardia. E, nesse sentido as homenagens de domingo passado a Mário Soares e a Cavaco Silva são as duas faces dessa arte de sermos quem somos: o primeiro não teve pejo em sofrer as consequências de dizer NÂO a regimes e poderes que impunham ou pretendiam impor aos portugueses formas diversas de privação da Liberdade, enquanto o segundo sempre a eles se submeteu na lógica do que crismou como «ser bom aluno».
Ser bom aluno é uma das formas mais sórdidas de cobardia, que conhecemos e tem servido para que gente sem coluna vertebral obrigue os portugueses a sofrerem o que nunca deveriam ser obrigados a padecer.
Ser bom aluno dá muitas vezes resultados proveitosos para quem tal pretende mostrar-se. Durão Barroso esforçava-se por o ser e por isso fazia os possíveis para ser bem visto por quem entendia estar numa posição de poder a cada momento. Já era assim no Liceu de Almada, quando aí estudava, foi-o no MRPP, quando julgou que a “Revolução Democrática e Popular” estava ao virar da esquina e o poderia transformar num émulo de Pol Pot, ultrapassando Arnaldo de Matos pela mais extrema das extremas-esquerdas. Passou a ser pelo polo contrário, quando viu o neoliberalismo ganhar expressão dominante na política mundial e conseguiu sucessivamente ser líder do principal partido da direita, primeiro-ministro, presidente da Comissão Europeia e, cereja em cima do bolo!, alto responsável da Goldman Sachs.
A História portuguesa tem exemplos assim deste tipo de arrivistas manhosos capazes de adotarem as opiniões maioritárias a cada momento para com elas alçarem-se a posições de poder, mormente marinheiros abandonados nas costas africanas ou malabares, que passados anos eram encontrados como lugares-tenentes dos respetivos régulos ou reis locais. Mas nenhum conseguiu, na sua capacidade de intriga e de lábia, alcançar um percurso tão bem sucedido nessa permanente intenção de curvar-se oportunisticamente aos poderes aparentemente mais fortes de cada momento.
Tomássemos nós Barroso como exemplo e submeter-nos-íamos a tudo quanto querem os schäubles e os dijsselbloems desta (des)União Europeia, cumprindo o desejado por Passos Coelho ou Assunção Cristas. Imitaríamos assim aqueles aristocratas de 1383 ou de 1580, que achavam perfeitamente lógico, que o reino de Portugal se diluísse no do vizinho ibérico. Era o seguimento de um lema bem português que diz: «O que tem de ser tem muita força».
Ora não tem, e Mário Soares no passado, quando combateu a ditadura fascista ou os riscos de totalitarismo de 1975, ou António Costa hoje, quando combate a sanha dos parceiros europeus quanto à sua alternativa à austeridade, demonstram-no. É um caminho mais pedregoso, envolve riscos sérios, que incluiu a prisão e o degredo para o primeiro, e todo o tipo de sabotagens internas e externas para o segundo, mas promete Grandeza, que é algo desconhecido para os cavacos, para os barrosos ou para os passos coelhos desta vida.
Ter a coragem de dizer Não, como o fizeram os heróis da Revolução do Mestre de Avis, da Restauração ou da República, corresponde ao que de melhor existe na nossa identidade. E este governo mostra essa fibra, verticaliza-se e ganha altura perante quem o pretende curvar. Por isso ontem foi um dia excelente para os que, dentro de si mesmos, procuram enaltecer o que têm de corajoso e esmagar o que os tende a acobardarem-se.



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