quinta-feira, 31 de março de 2016

A última festa em jeito de funeral

Passos é aquele junto de quem não há quem queira tirar uma selfie. Eis a conclusão a que Valdemar Cruz chegou no «Expresso Curto» a propósito da teimosia (ou feitio?) de quem está num beco sem saída e continua a marrar contra a parede à espera de ali ver surgir uma porta milagrosa.
Essa leitura da realidade laranja no dia em que se inicia o seu Congresso, ficou evidente na sessão de ontem à tarde no Parlamento, quando estava em equação o Plano Nacional de Reformas lançado pelo governo.
António Costa, a quem a sorte, mas também a enormíssima inteligência estratégica está a sorrir, ouviu o antecessor numa quezilenta verborreia, acolitada pelo entusiasmo da turba nas suas costas, e redarguiu-lhe com um sorriso sibilino: "sempre que falamos do futuro, o senhor vem-nos falar do passado. O senhor, em vez de falar sobre o que o país precisa, comporta-se como guardião das reformas que fez enquanto Governo". E acrescentou uma evidência, percetível a todos, menos aos fiéis do interlocutor: o povo português está muito mais interessado no que irá ser o seu futuro do que discutir a bondade ou a maldade do que ocorreu no passado.
Há dias um amigo das redes sociais dizia-me para poupar críticas ao ainda líder do PSD porque, enquanto ele se mantiver no cargo, é a autêntica sorte grande que saiu a António Costa. Pessoalmente, acredito que o atual primeiro-ministro dispensa bem essa circunstância, porque está muito longe de se limitar a governar contra Passos Coelho. Aliás este vai atalhando caminho para a total irrelevância alcançada por Cavaco Silva de quem não tardará muito tempo para candidamente perguntarmos «quem?» quando alguém ainda o invocar.
O que António Costa tem demonstrado é uma capacidade negocial inigualável para convergir com toda a esquerda parlamentar num conjunto de reformas, que muito contribuirão para a melhoria da qualidade de vida dos portugueses. E essa é a melhor estratégia para consolidar uma governação, que todos sentiram inicialmente como frágil, muitos deram como efémera, e agora quase já não há quem a não dê como duradoura. A não ser aquele que continua a ver nesse improvável fracasso a única hipótese de regressar ao lugar em que só ele pareceu ser feliz.
É por isso que as muitas horas dedicadas pelas televisões ao Congresso de Espinho serão interessantes para nelas pressentir os sinais de uma morte política anunciada. Porque o resultado kimjunguniano da sua eleição não esconderá a despedida em ilusória glória de um político, que quis aplicar em Portugal a receita ideológica, que já comprovou até à náusea a sua falibilidade quanto aos confessados objetivos a que se propunha. Muito embora quase tenha conseguido um sucesso retumbante nos que não quis confessar e prosseguiu com denodo: a privatização de tudo quanto ainda estava na alçada do Estado.
Hoje inicia-se um funeral sem pompa mas com muitas circunstâncias. 


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