quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Dos Holocaustos do passado aos do presente

1. Foi incontornável a evocação de Auschwitz neste dia em que passavam setenta anos sobre a data da libertação daquele campo de extermínio pelo Exército Vermelho.
É claro que serviu igualmente para enfatizar o morticínio dos judeus, quando tantas outras foram as vítimas da “solução final” engendrada por Himmler: ciganos, homossexuais, comunistas e demais opositores do nazismo…
Consolida-se, assim, a perversão da História, que levou mais do que uma década a associar Auschwitz ao Holocausto, dando-o doravante como o epicentro da barbárie nazi. Ora, se ali foram assassinados milhão e meio de seres humanos, muitos mais já tinham sofrido idêntico destino por onde a Wermacht e as SS iam avançando, quando o império de Hitler aparentava ser capaz de se construir para durar mil anos.
E sobram tantas mais reservas a esse empolamento do martírio judaico em detrimento de todas as outras vítimas, quando vemos o Holocausto a servir de caução moral para os governos de Telavive também praticarem políticas de segregação racial e de agressão contra o povo palestiniano. Por exemplo quando pudemos ver ontem Netanyahu congratular-se por a União Europeia manter o Hamas no rol das organizações terroristas, não deixámos de ter presentes as imagens de há poucos meses, quando os ataques do exército e da aviação israelitas ao gueto de Gaza causaram milhares de vítimas civis. Se isso também não é terrorismo, o que será afinal?
2. Um dos argumentos dos comentadores mais fiéis a passos coelho para desvalorizarem o sucesso do Syriza, foi o de se terem coligado com o Anel, cujo líder proferira discursos antissemitas algumas semanas atrás. O quanto lhes custa depararem-se com uma realidade, que tanto assusta o seu instinto de servos dos interesses alemães! Como escrevia José Vítor Malheiros no «Público», citando o líder do Podemos, “a grande novidade das eleições legislativas gregas é que a Grécia vai ter finalmente um Governo grego, composto por gregos que se preocupam com a vida dos cidadãos gregos e não um Governo de capatazes, preocupados acima de tudo em não indispor os poderes financeiros do mundo e em obedecer às diretivas das forças ocupantes.”
E é essa convergência na vontade de governar para os gregos, afrontando as falhadas linhas estratégicas seguidas pela União Europeia nos últimos anos, que explica a coligação do Syriza com os Gregos Independentes. Daniel Oliveira, no «Expresso», acrescenta um argumento de peso para que ela não fosse feita com o bem mais apresentável To Potami, que até se classificava como de centro esquerda: “ Com os centristas e europeístas do To Potami, seriam eles a condicionar a negociação. As instituições europeias e a Alemanha não poderão usar o Anel para criar fraturas internas no governo. Com o To Potami seria muitíssimo mais fácil fazê-lo: bastava usar a chantagem da saída do euro. Terá sido isto, parece-me, a pesar na escolha do aliado do governo. Porque neste momento Alexis Tsipras tem uma prioridade: não perder o braço de ferro com Merkel. Com todo o pragmatismo, tudo se submeterá a isto. Difícil de engolir? Já se tinha dito que as escolhas a fazer para vencer esta batalha seriam difíceis. Foi só a primeira.”
3. A minha admiração pelos combatentes peshmergas, que lutam há décadas por um Curdistão independente, já perdura há décadas.
Numas alturas encaro com maior otimismo a possibilidade de serem bem sucedidos, noutras olho-os com a nostalgia dos quixotes, incapazes de vencerem os seus moinhos de vento.
Mas a vitória em Kobani contra os fanáticos do Daesh inscreve-se nas páginas mais gloriosas de um movimento revolucionário, que conta nas suas fileiras com valorosas guerrilheiras apostadas em darem expressão à emancipação feminina numa região onde ela é espezinhada todos os dias...

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