sexta-feira, 31 de outubro de 2014

É por eles que os sinos estão a dobrar!

À primeira vista o debate desta manhã na Assembleia da República, em que o nome de José Sócrates foi elogiado pela bancada socialista e aviltado pela da maioria, veio com três anos de atraso por culpa da anterior direção de António José Seguro. Desde o último trimestre de 2011 teria sido interessante confrontar a realidade existente nos seis anos de socratismo com os sucessivos falhanços do governo de passos coelho e paulo portas. Porque houve sempre duas formas de olhar para a realidade de acordo com a luta de classes, que nunca deixou, nem deixará de existir: há os que pretendem um país mais desenvolvido e com menos desigualdades sociais. Há os que tudo fazem para que os interesses privados sejam beneficiados invariavelmente em prejuízo do Estado. Uns querem investimento e emprego, os outros querem privatizações e direitos nenhuns para quem trabalha sob a capa da «flexibilidade» e «competitividade».
Teria sido sempre um combate duro de travar, com muitas batalhas perdidas pelo meio, enquanto a direita conseguisse manter em muitos ingénuos a convicção de terem existido riscos de bancarrota por má governação, mas que cedo começaria a virar-se em função dos sucessivos fracassos macro e microeconómicos, dando lugar à evidência de existir uma razão fundamental para a crise e essa foi a do próprio capitalismo financeiro a nível internacional. Nessa altura a Direção do PS – que sempre teria valorizado os aspetos positivos da governação socialista (qualificação dos recursos humanos, energias renováveis, apoio à investigação científica, etc.) estaria em condições de não se limitar a derrotar os flancos do exército comunicacional da direita e poderia atacar de frente o seu comando. Porque três anos passados, a comparação entre os indicadores económicos e sociais de 2011 e os de 2014 são claramente desfavoráveis a esta arruinada coligação de passos com portas.
Lamentem-se, pois, os três anos perdidos por uma estratégia, que as Primárias comprovaram estar dissonante da dinâmica dos acontecimentos entretanto ocorridos!.
Quer isto dizer que o debate desta manhã não veio no tempo certo? Depressa veremos que, pelo contrário, ele não deixou de ser muito oportuno, porque ocorre neste hiato em que o PS ainda não elegeu a nova Direção e é tempo de fazer esse acerto com o passado.
Nestas semanas, que faltam para o Congresso, é bastante apropriada a revisitação da História recente, não permitindo que a direita mantenha a sua narrativa sem ela ser posta em causa. Até porque, sendo a sua credibilidade diariamente posta em causa pelos sucessivos casos, que a transformam numa trágica anedota, cada argumento por ela utilizada acaba por virar-se contra si própria. Assim, se há muito que o legado de José Sócrates vinha a ser defendido por quem sempre o apoiou, surge agora a oportunidade de transformar os que o vilipendiam naquele célebre cavaleiro de um filme dos Monty Pithon, que ia ficando sem braços e sem pernas, mas continuava a repetir ridiculamente as suas tolices. Sobre o período dos governos de Sócrates, os seus críticos arriscam-se a ficar cada vez mais isolados em estafados e cristalizados argumentos!
Mas,  a partir do final deste mês tudo fiará mais fino, porque superado este debate a favor ou contra Sócrates, o novo secretário-geral do PS ganhará a devida legitimidade para começar a propor a alternativa por que anseiam os portugueses. E esse será o momento que já faz tremer a direita. Porque esgotando agora a tese de regresso do «velho PS», ficará sem reservas de discurso para contrapor ao que António Costa enunciará de acordo com o seu calendário. Não admira que os mais inteligentes de entre os que apoiam ou integram este governo (lobo xavier, pires de lima) não tenham conseguido iludir a histeria, que lhes vai no âmago! A violência verbal  que passaram a adotar em relação ao futuro primeiro-ministro é um indício muito revelador do que a sua reconhecida argúcia lhes anuncia: tempos muito difíceis para quem julgava ter conquistado um desequilíbrio social a favor dos seus mandantes e afinal o sabem seriamente ameaçado por uma nova Visão de futuro, mais conforme com o interesse da maioria dos portugueses! Como diria o célebre poema de John Donne, eles sabem bem por quem os sinos estão a dobrar!

Indignados fomos! Por quanto tempo aguentaremos esta abulia?

Uma das mais lamentáveis consequências de três anos de governação do PSD/CDS tem sido a perda da capacidade de indignação dos portugueses.
É certo que outros importantes movimentos de Indignados também perderam o fôlego desde que encheram as ruas de Atenas, Madrid ou Nova Iorque, mas há uma diferença abissal entre a reação quase espontânea, que encheu as ruas e avenidas de Lisboa e do Porto em 15 de setembro de 2012 e a tristeza cansada dos que desde então se multiplicaram em dezenas de outras manifestações. Porventura culpa da CGTP, que banalizou de tal forma a convocatória para esse tipo de iniciativas, que mais se passaram a assemelhar a passeios de fim-de-semana, ou do final da tarde para desentorpecer as pernas, ou até mesmo às obrigações dos crentes em comparecerem à missa de todos os domingos.
Os comunistas ter-se-ão assustado com a perda da primazia para porem multidões nas ruas a protestarem na rua, que logo arranjaram a forma expedita de isso praticamente de nada servir.
E, no entanto, se naquela tarde ensolarada, que fez recuar as intenções de impor a TSU (depois habilmente conseguidas nos meses seguintes sem grandes percalços) uma multidão tivesse investido o Palácio de Belém ou o de São Bento, teríamos provavelmente dado o mesmo sinal de transformação política, que a Revolução de Abril de 1974 suscitou nos meses seguintes noutros países a contas com as mesmas indignidades.
Agora damo-nos conta de situações, que outrora,  sobressaltariam multidões e elas mantém-se impávidas à espera que novas circunstâncias lhes deem o ensejo de assistirem a mudanças para as quais se limitarão a apoiar com o seu voto.
Olhemos só para algumas, que ficámos a conhecer nos últimos dias cientes de que poderíamos arranjar outras tantas para confirmar o que fica dito:
(1) a intenção reiterada de passos coelho em afrontar o Tribunal Constitucional com a anunciada desobediência à indicação de repor os salários da Função Pública a partir de 1 de janeiro de 2016 se acaso ainda nessa altura estivesse no cargo de primeiro-ministro. Temos, pois, um governo em guerra constante com a Constituição do País!
(2) A transferência de dois altos quadros do Banco de Portugal ligados à supervisão do setor bancário para a consultora (PwC) com que estavam a trabalhar depois dela ter sido contratada sem concurso pela instituição, sem verem nisso qualquer escrúpulo respeitante ao mais que evidente conflito de interesses. Temos, pois, quadros das instituições de supervisão em promiscuidade evidente com quem deveriam ter a relação distanciada do cliente com quem lhe presta serviço!
(3) A perda de 2,6 mil milhões de euros no BES Angola, para onde o Banco da família Espírito Santo canalizara vultuosos empréstimos e agora praticamente dados como perdidos, depois de até ter sido vedada a entrada da representante do Novo Banco para a reunião de acionistas em que deveria ter assento como sócia maioritária. E, no entanto, os nossos comentadores andam muito calados perante um autêntico roubo, que as elites dominantes de Luanda cometeram sobre verbas que acabarão por ser pagas, em todo ou em parte, pelos contribuintes portugueses. Temos, pois, um governo incapaz de defender os interesses nacionais perante oligarquias estrangeiras!
(4) a mentira que pires de lima anunciou e todos quantos dele quiseram servir de altifalante disseminaram, segundo a qual o Banco Mundial reconhecera uma melhoria de seis lugares a Portugal enquanto país mais propício à atividade das empresas, quando se veio depois a saber que pela metodologia anteriormente utilizada a realidade seria a contrária, pois corresponderia a uma queda de dois lugares. Temos, pois, um governo que mente sem pudor, manipulando números para esconder as provas da sua incompetência.
(5) num inacreditável exemplo de censura, o diretor do Instituto das Ciências Sociais, José Luís Cardoso, proibiu a distribuição da revista «Análise Social» e a sua publicação online por causa de um artigo ilustrado por alguns graffitis das ruas de Lisboa destinados a corroborar a ideia transmitida pelo texto segundo o qual novas formas de comunicação estão a ser utilizadas para contestar o poder político. Uma atitude, que lembra inevitavelmente os comportamentos das instituições académicas antes do 25 de abril e que se julgariam improváveis em Democracia. Temos, pois, instituições públicas apostadas em coartar a liberdade de expressão e pensamento dos investigadores com que trabalham!
Não deveriam todos estes exemplos motivar-nos veemente repúdio e exigência de correção?


quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Uma atitude emotiva, uma correção racional!

Há dias surgiu-me no facebook a proposta de uma manifestação em Belém para exigir de cavaco silva a atitude de condecorar José Sócrates, o único primeiro-ministro, que não mereceu essa distinção desde o fim do PREC.
Muito naturalmente e porque pensei prioritariamente na necessidade de confrontar cavaco com a sua mesquinhez, logo coloquei um «vou» para essa tomada pública de posição, ciente da necessidade dela contar com muitos participantes e agastar tanto quanto possível aquele que nunca conseguiu que Boliqueime saísse dentro de si.
Agora, perante a missiva assinada por Ascenso Simões a apelar ao inquilino de Belém para que dignificasse a sua função com o reconhecimento de Sócrates, Augusto Santos Silva veio manifestar a sua discordância com argumentos mais do que pertinentes:
1. Finalmente, uma divergência política seriíssima entre os socialistas! Ascenso Simões pergunta ao Presidente da República por quanto tempo mais vai deixar José Sócrates na posição de único primeiro-ministro da democracia constitucional por agraciar com a Ordem do Infante. Capoulas Santos diz que é melhor ele continuar assim.
2. Estou ao lado do Capoulas e contra Ascenso. Tão contra que até quero dirigir também uma mensagem aberta ao PR:
3. "Senhor Presidente, não dê ouvidos a Ascenso. Não se deixe pressionar. Não condecore Sócrates.
4. É que ele não merece tamanha nódoa no seu currículo.
5. Haverá certamente, dentro em breve, um Presidente merecedor da honra de condecorá-lo".
Vejo-me, pois, obrigado a corrigir a minha opinião inicial: se Sócrates recebesse a condecoração das mãos do mesmo homem, que aprovou pensões para pides e a negou à viúva de Salgueiro Maia, só se desqualificava. De facto, depois da vitória nas próximas legislativas, será crível que o próximo presidente tenha qualidades de estadista, que faltam notoriamente a cavaco. E até podemos aspirar que tenha as qualidades humanas de um António Guterres, se entretanto não for ele o escolhido para suceder a Ban-Ki-moon na ONU.
Ora fará toda a diferença receber tal consagração das mãos de um político, que tem ganho grande respeito internacional pela ação em prol dos refugiados de todo o mundo, em vez de se obrigar a sorrir para quem ficará para a História como o pior Presidente da República do Portugal democrático!

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

E são capazes de se dizerem católicos

Ninguém contestará que a pobreza tem crescido significativamente em Portugal nos últimos três anos. Dizem-nos os indicadores oficiais e os estudos subscritos pelas mais variadas instituições nacionais e internacionais. Mas demonstra-nos, igualmente, a nossa perceção ao palmilharmos as cidades ou os seus subúrbios.
No entanto, também ficará na memória da maioria a forma insensível como este governo foi reduzindo drasticamente os apoios sociais aos mais pobres. Com um impacto particularmente obsceno nas crianças, setor etário onde a progressão da pobreza se fez de forma mais acelerada.
O «Expresso» trouxe agora mais uma confirmação dessa realidade: nos últimos anos 79,9 mil menores de 18 anos perderam o acesso ao rendimento mínimo de inserção, que era para a maioria deles a única barreira de proteção contra a condenação à miséria mais extrema.
Como será possível que muitos dos governantes responsáveis por este terramoto social se digam católicos e até porventura pertençam à Opus Dei?
Se lhes sobrasse um pingo de vergonha muito teriam de se penitenciar com o sofrimento causado nos mais pobres de entre os pobres dos seus concidadãos!

Se não fosse uma questão de ideologia diríamos tratar-se de incompetência!

Semana após semana o fracasso da colocação de professores não sai das notícias da imprensa escrita ou dos telejornais. O ano letivo já começou há praticamente mês e meio e milhares de alunos continuam sem aulas a uma ou várias disciplinas. O que não leva nuno crato nem a sua equipa a retirar a conclusão que todos consideram lógica exceto a ele e a passos coelho.
Perdurará por muitos anos o sucedido nestas semanas por exemplificar à saciedade a incompetência de uma direita que tanto criticou os governos de José Sócrates e se mostra incapaz de sequer organizar administrativamente uma das mais comuns tarefas exigíveis a quem tem por incumbência fazer funcionar as instituições do Estado. Tivessem uma parcela, mesmo que ínfima, da capacidade dos elencos ministeriais do governo anterior e nada de semelhante sucederia!
Estes têm sido, pois, anos pródigos em fazer cair uns quantos mitos criados por quem trabalha para quem detém a propriedade da comunicação social: depois da queda dos «donos disto tudo» ou dos «gestores de génio», que tão elogiados eram na imprensa económica, é a direita no seu todo que, mediante os exemplos na Educação e na Justiça, demonstra não merecer que se lhe volte a entregar a condução do país.
Porque, ainda está paula teixeira da cruz a queixar-se de lhe terem ido ao «citius» e já novo caso comprova a sua mediocridade: uma juíza do tribunal de Aveiro veio derrubar o decreto-lei do governo, que suspendia os prazos processuais enquanto durassem os problemas com a sistema informático, já que a Constituição ordena a sua aprovação pela Assembleia da República. Apenas se tivesse recorrido à solicitação de uma autorização parlamentar para avançar com esse decreto-lei é que ele seria válido. Quer isto, pois, dizer que muitos processos prescreverão devido à paralisia da Justiça durante várias semanas por sua exclusiva responsabilidade.
Mas dos juízes continuam a sair decisões mais do que controversas, como a absolvição agora definida para os arguidos do caso Bragaparques.
Se durante um par de semanas ainda houve quem imaginasse uma Justiça forte a castigar quem aparentemente se servira de cargos políticos para favorecer os amigos, esta decisão veio na linha do que se desconfia: os tribunais parecem zarolhos ao condenarem com penas por muitos tidas como absurdas, quem está conotado com o Partido Socialista e assegurando a impunidade de  quem praticou atos lesivos para o erário público quando exercia cargos em representação dos partidos da direita.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Uma pesada herança de quem sente uma angústia miudinha

Na coluna semanal, que assina às segundas-feiras no «Público», o antigo ministro Correia de Campos reconhece que, em circunstâncias normais, um governo em guerra aberta com jornalistas e comentadores e capaz de inventar conspirações para explicar o desastre em que deixou o sistema judicial, estaria de portas escancaradas para sair rapidamente de cena. No entanto, o apego ao poder é tal que só circunstâncias extraordinárias a tal o conduzirão antes da data prevista pela Lei Eleitoral.
Mas o comentador alerta para a pesadíssima herança deixada por passos & Cª: “O governo não fez reformas porque reformas levam tempo, exigem saber, experiência, bom senso e energias. Com o país sedento de investimento, não consegue aproveitar os fundos de Bruxelas, dinheiros que se perderão na competição entre compromissos liquidados e não pagos. O governo teve tempo que desperdiçou, tinha conhecimento que desprezou ou maltratou, tinha energias sempre disponíveis, se bem conduzidas. Preferiu a via fácil e rápida dos cortes brutos na despesa. Preferiu aparecer como “quick winner”, em vez de paciente reformador. Quando partir, deixará quase tudo pior. Tudo teve e quase tudo deitou a perder. Terá o destino que escolheu.”
Mas demorará a reparar os danos, que deixará a quem lhe sucederá! Por isso mesmo António Costa mostrava particular firmeza, quando previa nos debates das Primárias, que o mais difícil estará por fazer, quando o Partido Socialista for governo…

O filósofo José Gil foi em tempos um crítico contundente da governação de José Sócrates. Mas, a exemplo de muitos outros comentadores da política portuguesa depressa se desenganou da «mudança» prometida por passos coelho, que a tudo agravou, exceto para os mais ricos dos portugueses,  sempre capazes de lucrarem com as conjunturas de crise.

Agora as suas expectativas viraram-se para o PS saído das primárias que derrotaram o anterior secretário-geral: “O seu desaparecimento da cena política destabilizou profundamente a relação de forças equilibrada, confortável e mesmo promissora para o PSD. O PS constituía uma espécie de complemento necessário à estabilidade governativa da coligação. A saída de Seguro abriu um novo espaço de esperança no País, que ultrapassa em muito os militantes e simpatizantes do PS. Não é um efeito de ‘messianismo’ que se diz acompanhar a nova liderança de António Costa, é antes o desbloquear de um espaço congelado de expetativas indeterminadas. Sem que nos tenhamos apercebido, um grande vento invisível passou, limpou e abriu o espaço político. Abalou o PSD e deixou-o com uma angústia miudinha”. (Visão) 

Novidades do castelo de cartas

Será uma das palpitantes informações, que a Comissão Parlamentar nomeada para analisar o sucedido com o Grupo Espírito Santo deverá apurar: até que ponto os vários ministros, secretários de Estado e outros titulares de cargos relacionados com o governo, num mínimo de 16 membros, terão mantido as suas carteiras de ações, obrigações e outros ativos então investidos nas diversas empresas ligadas a ele?
Terão escapado à tentação de, aproveitando informações internas sobre as decisões iminentes sobre o GES, as comercializarem com a mesma rapidez da PT ou da Goldman Sachs?
Ou será que as decisões do governo em proteger os interesses dos depositantes em detrimento dos acionistas teve a ver precisamente com a realidade agora apurada e divulgada?
Por muito que fernando negrão procure ser tão eficiente quanto a sua colega de bancada mónica ferro (relatora da Comissão dedicada aos submarinos) em limitar os danos, tratar-se-á de um assunto a merecer destacada atenção nas próximas semanas, já que é tão frágil o castelo de cartas em que assenta o Executivo de passos coelho que um pequeno abanão poderá fazê-lo cair estrondosamente, deitando a perder os esforços de Belém e de São Bento para tal evitar…