sábado, 31 de agosto de 2013

POLÍTICA: um maduro zombie

Que entusiasmo houve pela vinda de Florença do ministro maduro! Depois do relvas prometiam-nos um perfil académico e profissional na sua exata oposição. Um professor respeitado nas estranjas e com trabalhos de referência nos cenáculos onde costumava debitar a sua retórica.
Não foram precisos muitos meses para se compreender o flop, que ele é. Se se dizia, que a comunicação do governo era má - como se o problema residisse na forma de vender o produto e não na sua péssima qualidade, impossível de embelezar pelo mais dotado dos marketeers! - a sua estratégia dos briefings redundou numa anedota para gáudio da Oposição. Mas a empalidecida imagem entretanto dele criada, ainda pior fica com as repetidas demonstrações de desonestidade intelectual reveladas pelos seus discursos de que é exemplo lapidar o pronunciado durante a universidade de verão do seu partido. Nessa vertente conclui-se não haver diferença de monta entre maduro e o seu antecessor.
Na sanha anti-Tribunal Constitucional, que anima a atual direção do PSD, não existe pudor nem a mínima ponta de escrúpulo. Como lembrava Pedro Adão e Silva na sua sempre indispensável crónica no «Expresso», estamos num tempo de zombies ideológicos:  os argumentos vão sendo continuamente desmentidos pela realidade, que, logicamente, os deveria matar e enterrar, mas eles vão reemergindo à superfície para continuar o objetivo monstruoso de manter vivo um cadáver adiado - este capitalismo selvagem, avesso a regras e a sentido social.
Aparentando frescura no penteado e barba elegantes, maduro tem um rosto bem mais verdadeiro: o de um morto-vivo tão teimoso quanto o dos seus congéneres nos filmes do Georges Romero.


POLÍTICA: idiotices perigosas!

Muitas vezes sou levado a pensar que há certa gente, que mais vale ignorar, tão estapafúrdia é a sua argumentação para defender as mais absurdas opiniões.
Isso vale para um camilo lourenço, um medina carreira, um césar das neves, um josé gomes ferreira, um henrique raposo e umas quantas outras luminárias, que costumavam enfileirar com o agora finado borges na defesa de salários mais baixos, de legislação laboral expurgada dos mínimos direitos e garantias aos trabalhadores e na eliminação total e completa da Constituição da República Portuguesa.
Mas, por uma vez, vale a pena falar de gonçalo portocarrero de almada pelo facto de encontrar tanta facilidade na explicitação das suas idiotices nos jornais «Público» e «i». Assumidamente pertencente à Opus Dei, este sacerdote também aparece muito ligado ao suposto pretendente da inexistente coroa portuguesa. E as propostas por ele publicadas nem precisam de mais comentários nem introduções: falam por si!  Senão vejamos este extrato hoje publicado no jornal da Sonae:
Por que razão muitas empresas resistem a admitir novos trabalhadores? Porque os encargos decorrentes da admissão de mais um assalariado são, por exigência do contrato de trabalho, excessivos. Com efeito, a entidade empregadora fica de tal modo onerada, ante o Estado, a Segurança Social e o próprio trabalhador que, muitas vezes, não é comportável um tal encargo financeiro. Mas há uma fácil solução: basta desregular o compromisso laboral, em benefício dos agentes sociais, ou seja, substituir o contrato de trabalho tradicional pela união livre de patrão e operário.
Se há liberdade, sem compromisso, para o amor, porque não para o trabalho?! Se o proletário é, etimologicamente, o que gera filhos e quem os faz faz por amor, reconheça-se-lhe a mesma liberdade, sem obrigações, na actividade laboral.’
Depois de, na semana transata ter feito a apologia do Estado Novo, o paladino da total submissão do trabalhador ao patrão, que ficaria livre de lhe pagar o que quisesse e quando quisesse, parece estar aí para lavar e durar. O fascismo mais troglodita continua a ter quem o publicite!


DOCUMENTÁRIO: «O Exílio dos Judeus: entre mito e história» de Ilan Jiv e Pascal Cuissot (2013)

Os judeus suscitam-me reações ambivalentes: por um lado de compaixão por tudo quanto sofreram ao longo dos séculos numa Europa antissemita, capaz de organizar progroms para assassinar e espoliar gerações de seguidores da Torah. Se o Holocausto figura como o exemplo mais terrível dessa tendência para perseguir e assassinar judeus, não podemos esquecer como a nossa História está manchada por muitos crimes similares, muitos dos quais com o alibi de julgamentos inquisitoriais. Mas, por outro lado, não podemos ignorar o comportamento igualmente criminoso dos governos israelitas, capazes de transferirem para os palestinianos o mesmo ódio para com o Outro, o que crê e pensa de forma diferente.
Este documentário ganha particular interesse por demonstrar como muita da mitologia em que assenta a argumentação dos governos de Telavive para suportarem a sua política expansionista através de colonatos e justificarem a ideia de ter existido algo que constitui uma enorme falsidade: um Grande Israel!
Desde a destruição do templo pelos Romanos no século II d.C. que, nas suas orações, os judeus de todo o mundo costumam enunciar um voto: no próximo ano em Jerusalém. Desde há dois mil anos que essa fórmula cabalística evoca a perda da Terra Prometida e a condenação ao exílio de todo o seu povo.
Os primeiros cristãos consideraram esse exílio uma punição divina contra aqueles que se tinham recusado a ver em Jesus Cristo o anunciado Messias e deram origem à tradição antissemita europeia nos séculos seguintes. E os próprios judeus abraçaram esse mito do exílio coletivo como uma sanção para os seus pecados.
O filme de Ilan Juv e de Pascal Cuissot questiona essa narrativa, que se instalou nas teologias judaicas e cristãs da Europa e do Médio Oriente e onde se mistura a historiografia e a lenda, o mito e a realidade.
Nesta abordagem, que se desenrola na Galileia, em Massada, em Jerusalém e em Roma, até se conclui que, em vez de constituir um período de desintegração do judaísmo, os séculos subsequentes à destruição do Templo até foram marcados pelo seu ressurgimento.
Os historiadores e os arqueólogos concordam em como é falsa a versão catastrofista do exílio, já que a diáspora judaica era frequente muito antes do século II d.C. em toda a bacia mediterrânica.
Os arqueólogos, que andam a estudar as ruínas de Sephoris na Galileia desde 1985, descobriram que a cidade rechaçou a possibilidade de apoiar a rebelião de Jerusalém e continuou a prosperar dentro do contexto do Império Romano. Viria a transformar-se numa aldeia árabe, Safuri, após a conquista da Palestina no século VII, embora os seus habitantes viessem a ser expulsos pelos ocupantes israelitas em 1948, apesar de reivindicarem ser os descendentes das populações hebraicas da Antiguidade.
O documentário de hora e meia tem entrevistas com especialistas, imagens de arquivo e recriação de episódios históricos com atores e atrizes, para revelar a riquíssima história dos povos da região.



sexta-feira, 30 de agosto de 2013

POLÍTICA: (des)alianças políticas no futuro ciclo político

Para os socialistas, que ainda se iludem com a possibilidade de virem a fazer Governo com o CDS no futuro ciclo político, a reação desse Partido à decisão do Tribunal Constitucional sobre a mobilidade especial deveria avivar-lhes a memória quanto ao intervencionismo ativo dos seus militantes e dirigentes, sempre que se tratou de  procurar a destruição do Partido Socialista. Como quando estiveram na primeira linha da tentativa de colagem de dirigentes socialistas ao caso Casa Pia. Ou como lideraram campanhas contra José Sócrates, nomeadamente pela criação de falsos argumentos no caso Freeport. Agora o arrivista joão almeida vem invocar novamente a pesada herança para explicar as dificuldades de um país a contas com um (des) governo completamente irresponsável e antinacional. 
O ódio ao PS é tão violento por parte dessa gente, que nunca com eles se poderá contar!


POLÍTICA: Bons augúrios neste final de agosto!

Agosto despede-se com bons augúrios para o futuro próximo. Entre nós o Tribunal Constitucional fez o que lhe competia, chumbando por unanimidade o diploma do (des) governo destinado a iniciar o processo de despedimentos na função pública.
Nem sequer os juízes nomeados por indicação dos partidos da maioria lhes fizeram o frete, passando por cima da nossa Lei Fundamental. O que indicia novas dificuldades para que prossiga o violento ataque a tudo quanto são os direitos e garantias reconhecidos aos cidadãos nacionais,
É claro que não tardarão a ouvir-se os abutres do costume (o camilo lourenço, o césar das neves, o josé gomes ferreira) a apodarem os juízes de todas as vilanias possíveis e imaginárias. Mas não conseguirão iludir a demonstração de completa ilegalidade em que passos & Cª se colocam em tudo quanto diz respeito à aplicação da sua agenda ideológica.
Se tantos portugueses estão a ser seriamente ameaçados pelos fogos, que permanecem ateados pelo Norte e Centro do país, quem parece cada vez mais chamuscado pela sua irredutível teimosia é esta direita a que nem sequer o bombeiro de Boliqueime parece disposto a dar a mão por muito mais tempo.
E, como escrevia Boaventura da Sousa Santos há uma semana na revista «Visão»: a Constituição que temos defendeu-nos até agora do caos. Para nos continuar a defender tem, ela própria, de ser defendida.
Mas não é só internamente que temos motivos de algum otimismo: nos Comuns, o primeiro-ministro inglês teve de meter a viola no saco e esquecer o projeto de atacar a Síria ao ver derrotada uma proposta nesse sentido. Até porque já começa a ter dúvidas quanto à autoria do crime ali perpetrado com armas químicas.
Acabamos, pois, o mês com a direita cada vez mais enredada no labirinto da sua incompetência para lidar com uma sociedade avessa à sua visão para o futuro de quem nela aspira a conquistar merecida felicidade.


quinta-feira, 29 de agosto de 2013

POLÍTICA: as tentações para intervir em Damasco

Será que a Síria escapará a uma intervenção punitiva do Ocidente, que quererá assim justificar o injustificável apoio aos que combatem o regime de Assad?
Ontem e anteontem a pressa das chancelarias parecia imparável: cameron e hague tinham as certezas, que os observadores da ONU ainda não haviam garantido quanto à culpabilidade do regime. Em França fabius estava de mão dada com os seus cúmplices israelitas na necessidade de aproveitar o alibi do ataque químico para dar a Assad o mesmo destino que a Saddam ou a Kadafi. E obama até se enganava na entrevista em que afiançava haverem armas nucleares na posse do regime sírio, até dar pelo lapso e corrigir para as de natureza química, adotando então uma expressão angelical para considerar impossível que os oposicionistas também as detivessem.
O que ninguém explica é porque, estando a viver uma fase vitoriosa na guerra em curso, o regime optaria pela estratégia suicida de dar argumentos aos rebeldes para estes recorrerem aos seus apoios internacionais. Dos romances da Agatha Christie sabemos que o crime tem sempre um autor previsível: quem mais lucra com ele!
Daí que se me afigure crível uma tese difícil de contestar: divididos entre os fundamentalistas apostados em transformar Damasco na capital de mais um Estado Islâmico e a grande burguesia, que sonha com um tipo de desenvolvimento económico parecido com o do seu vizinho turco, os rebeldes sírios viam o tempo correr em seu desfavor. E os seus apoiantes ocidentais a desinteressarem-se progressivamente da sua sorte ou não vão tendo semanalmente no Iraque ou no Afeganistão, exemplos lapidares quando intervém de acordo com os seus preconceitos geoestratégicos. Nada mais lógico do que utilizarem armas fornecidas pelos traficantes que com eles têm enriquecido, ou espoliadas dos arsenais do regime, e encenarem o crime que poderia justificar uma reviravolta na sua difícil realidade.


BANDA SONORA: no 93º aniversário do Bird


Nascido a 29 de agosto de 1920, Charlie Parker dá-nos todos os motivos para recordarmos a sua arte.

FILME: «Alabama Monroe» de Félix Van Groeningen

«Alabama Monroe» foi um enorme êxito nos cinemas belgas com uma daquelas histórias capazes de fazerem chorar as pedrinhas da calçada.
O protagonista é Didier que, aos 36 anos e com o seu banjo, lidera um grupo de country music, tendência bluegrass. Um dia conhece Elise por quem se apaixona apesar de terem valores e personalidades completamente diferentes: ele é um romântico e um ateu convicto enquanto ela, mais realista, diz-se assumidamente crente em deus. Mas o grupo prossegue a carreira agora com ela como vocalista...
Maybelle é a filha resultante dos seus amores e que os enche de alegria. Até ao dia, em que, já com seis anos, ela adoece com um cancro. Tudo quanto até então tinham construído ameaça ruir...
A miúda projeta a sua imaginação para as estrelas, enquanto o pai vitupera o Criador e a mãe pretende renascer sob outro nome, o de Alabama.
Um filme de risos, choros, gritos e alguma boa música...



FILME: «Yema» de Djamila Sahraoui

O fracasso da Primavera Árabe - que não cumpriu as suas promessas democráticas, apenas servindo para dar asas ao terrorismo dos fundamentalistas islâmicos - já conhecera um exemplo precursor na Guerra Civil argelina do início dos anos 90 do século XX.
O filme realizado e protagonizado por Djamila Sahraoui regressa a esse passado e mostra como ela, na pele da camponesa Ouardia, vive numa zona isolada muito próxima das montanhas aonde se acoitam os guerrilheiros islâmicos liderados pelo seu filho Ali.
Quando o outro seu filho, Tarik, morre assassinado, ela tem poucas dúvidas quanto à culpabilidade do irmão, já que aquele era militar do exército argelino e, como tal, alvo preferencial dos homens de Ali.
Apesar de vigiada  por um dos guerrilheiros - cujo braço fora amputado por uma explosão - Ouardia obstina-se em dar vida à sua horta em luta constante com o avanço do deserto. Mesmo que tenha de passar o tempo a partir pedra e a escavar a terra dura.
Mas a vontade em contrariar os obstáculos que a rodeiam ainda mais se afirma, quando Ali lhe surge um dia, bastante ferido, e com o filho nascido dos seus amores com Malia, a quem Tarik também amara. Agora, sem a mãe, morta no parto, a criança será uma bênção para a determinação da avó ainda mais se vincar.
A fotografia do filme é sublime e Ouardia lembra as personagens da tragédia grega entre a vingança e o perdão, com um final a condizer.
Aquele recanto da montanha torna-se num espaço fechado em si mesmo onde as relações entre as personagens são complexas e subtis, senão mesmo doces e violentas para recordar como foi violento o fratricídio entre argelinos.




POLÍTICA: mas ainda há quem duvide da aproximação das grandes tempestades de outono?

A notícia ontem publicada no «Jornal de Negócios» passou de raspão pelos noticiários e não mereceu a importância que é dada nesta altura aos incêndios ou aos primeiros jogos do campeonato de futebol. E, no entanto, tem um impacto potencial na vida de milhares de portugueses, que escapa à relevância daquelas notícias de abertura dos vários telejornais: quando o (des) governo envia para o FMI números falsos, que possam induzir aquela instituição, já de si nada meiga para com os interesses dos que trabalham, a incentivar medidas ainda mais gravosas no que diz respeito a uma distribuição ainda mais injusta de rendimentos, está a distorcer a realidade de forma a possibilitar uma aceleração da aplicação da sua criminosa agenda económica e social.
Como se viu com o estorricado borges, que até ao fim não renegou a cartilha de que foi altifalante dotado de muitos amplificadores, esta direita não se coíbe em desprezar a realidade dos factos e dos indicadores, demonstrativos de um país em plena catástrofe social, para pretender levar até à lógica da terra queimada a implementação da sua visão económica e política.
Sempre suspeitáramos que a conjunção de um presidente com uma maioria de direita tenderia a desequilibrar a relação entre as várias classes sociais a um nível próximo da rutura da paz e da concertação negociadas dos respetivos interesses. Por ora anda por aí uma enganadora acalmia. Mas os focos de altas pressões estão a formar-se e cavaco deu agora mais um pequeno impulso com a aprovação do horário das 40 horas semanais para os funcionários públicos.
Não é preciso consultar astrólogos ou zandingas para suspeitar da aproximação de um outono de grandes tempestades.  Até porque, passadas as autárquicas, não se encontrarão mais nenhuns artifícios para mascarar uma realidade, que vai de mal a pior...


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

DOCUMENTÁRIO: «The Look: Charlotte Rampling» de Angelina Maccarone

O primeiro filme em que me deparei pela primeira vez com o estranho olhar de Charlotte Rampling terá sido em «Zardoz», que John Boorman rodou mo mesmo ano da nossa Revolução dos Cravos e tendo como outra grande novidade a de encarar Sean Connery dissociado da sua tradicional personagem de agente secreto. No entanto, o papel, que mais me impressionou foi a da mulher angustiada com o desaparecimento do marido na praia e incapaz de se libertar do seu obsessivo fantasma.
«Sous la Plage» foi o filme de François Ozon, que a resgatou de uma depressão aparentemente irreversível e a devolveu para uma brilhante e movimentada segunda carreira cinematográfica. Nestes últimos anos desde a entrada no milénio, o seu sucesso tem sido tal, que já se anuncia a sua participação na nova temporada da série «Dexter».
No entanto, ela iniciara a sua carreira cinematográfica no seu país natal, a Inglaterra, a meio dos anos 60, quando a sua magreza associada á especificidade do seu olhar estava em conformidade com a imagem das jovens teenagers da Swinging London..
Um trauma levá-la-á a deixar Londres e a buscar refúgio em Itália: a morte brutal da sua irmã em 1966. Visconti vê nela a atriz ideal para protagonizar «Os Malditos», um filme polémico sobre as perversões de uma família de industriais alemães comprometidos com o nazismo.
Essa interpretação talhou-a para outros papéis em que se revelavam os recantos mais inesperados da personalidade humana: «Porteiro da Noite» de Liliana Cavani vem nessa linha e supera em controvérsia o filme do realizador de «Senso».
Essa fama sulfurosa nunca mais a irá abandonar: em «Max Meu Amor» de Nagisa Oshima ela é a mulher de um diplomata, que a todos escandaliza devido aos seus amores com um chimpanzé. E, mesmo mais recentemente, ela interpretou um dos principais papéis de «Melancolia» de Lars van Trier.
Justifica-se assim a sublime definição da sua personalidade revelada pela réplica por ela dada ao personagem interpretado por Woody Allen em «Stardust Memories»: sou fascinante e perigosa.



EFEMÉRIDE: Foi há cinquenta anos!

DOCUMENTÁRIO: «Le petit train de bambous» de Carmen Butta

O engenho humano consegue ser admirável: no norte do Camboja os norry permitem à população deslocar-se mediante a utilização das linhas férreas só utilizadas um par de vezes por mês por comboios de mercadorias.
Com quatro rolamentos, uma plataforma feita de bambus e motores vetustos retirados de antigos geradores, estas pequenas composições evitam aos aldeãos os riscos ainda significativos das minas abandonadas nos antigos trilhos e estradas por onde a guerra passou.
Carmen Butta, a realizadora deste documentário de 2008, acompanhou a família de um dos condutores desses norry, percebendo como ela se formou no tempo dos khmers vermelhos, quando o casal recebeu ordem de se unir apesar de nunca se ter conhecido até então. Sobrevivendo à guerra e à fome foram educando as três filhas, que já lhes vão acrescentando netos à tribo.
O progenitor tornou-se condutor de norry por se tratar de ofício bem melhor remunerado do que se continuasse a vender trabalho braçal nos campos de arroz. Agora ele transporta passageiros para consultas médicas, para festas familiares ou para os seus negócios pelas aldeias das redondezas. Mas há também sacerdotes budistas ou taxistas, que aproveitam esse meio de transporte para irem de aldeia em aldeia.
Os carris estão em péssimo estado e eles são muitas vezes obrigados a reparações precárias, tapando as falhas passíveis de suscitarem descarrilamentos com remendos de troncos de madeiras. E o esforço é grande quando duas dessas composições se cruzam em sentido contrário, havendo regras restritas sobre quem terá a prioridade em cada caso: aquele que sair dos carris para deixar passar o outro norry vê-se obrigado a descarregar a carga e os passageiros e a desmontar o próprio veículo.
Para as duas dúzias de condutores o futuro constitui uma preocupação muito séria, porque vão ouvindo falar de planos governamentais para substituir as decrépitas vias férreas e as composições ainda do tempo do colonialismo francês. E temem que a proibição para circularem nos novos carris se cumpra verdadeiramente, já que, por ora, embora a sua atividade seja proibida, a polícia vai fechando os olhos às transgressões e … embolsando os subornos.
Já com olhos nesse futuro previsível os dois genros do protagonista do documentário já se reciclaram em moto-taxistas, cientes de poderem continuar a garantir o sustento da família. Sem esquecerem a importância por quase todos referida em como será fundamental enviarem as crianças para a escola a fim de ascenderem a uma qualidade de vida ainda a todos inacessível...


POLÍTICA: por onde anda o irrevogável crítico das políticas alheias sobre fogos florestais?

Será que este verão tem sido mais quente, menos húmido e mais ventoso do que os do período em que José Sócrates foi primeiro-ministro?
Será que apareceram, vindos sabe-se lá de onde, uma chusma de incendiários apostados em prejudicar o esforço de recuperação económica do país?
Será que existem outras razões, não imputáveis à falta de meios ou de coordenação, que justifiquem as vastas superfícies reduzidas a cinzas e as quatro mortes já verificadas (sem sequer contarmos com as dezenas de feridos!) entre os bombeiros mobilizados para o combate aos incêndios?
Nós não esquecemos o oportunismo com que paulo portas aparecia em anos idos, quando estava na Oposição, para invocar todos os argumentos possíveis e imagináveis para maldizer as políticas do governo socialista!
Nessa altura não faltavam promessas em como seria capaz de fazer bem melhor, quando chegasse ao governo.
Ainda não tínhamos nessa altura a demonstração de como o vice-primeiro-ministro era tão dado à irrevogabilidade das opiniões!
E, no entanto, assunção cristas - a sua aposta para resolver os problemas da agricultura e das florestas - já teve mais de dois anos para cuidar da prevenção de tais ocorrências, tornando-as conformes com as promessas do seu líder. O resultado está à vista e é dramático para quem viu em cinzas as árvores de que colhia rendimento imprescindível para iludir a pobreza.  Ou, sobretudo, para quem perdeu a vida ou familiares, sem sequer merecer a atenção conferida por Belém ao zombie entretanto cremado com honras públicas num cemitério lisboeta.
O discurso dos ministros sobre esta catástrofe é o da indigente passividade perante as circunstâncias. Como se tudo devêssemos a vontades divinas predispostas ao inexplicável castigo dos mortais.
O mês de agosto está a terminar, mas deixa a imagem de uma total incapacidade deste (des) governo em apagar os muitos fogos, que incendeiam todo o país!


terça-feira, 27 de agosto de 2013

POLÍTICA: Números com significado

  • 1,9 milhões de refugiados - dos quais um milhão é constituído por crianças - é o resultado da guerra civil síria. E por muito que EUA, França e Inglaterra queiram imputar todas as culpas a Assad, os seus adversários estão longe de ser meninos de coro. O resultado poderá ser a transformação de uma sociedade muçulmana laica para outra dominada pelo proselitismo fascista islâmico…
  • Portugal já é o país europeu com maior percentagem de professores com mais de dez anos de serviço em contratos a termo. Nuno Crato ainda quer melhor: o único a obriga-los a exame para aferir se podem ou não ser professores…
  • Em julho houve menos 15 mil pessoas a receberem subsídio de doença, menos 1200 o de inserção, menos 9000 o de desemprego e menos 2350 o de parentalidade.  Obviamente isso só pode significar que a situação social está a “melhorar”. Pelo menos será isso o que pensam os apoiantes de passos & Cª.
  • Para quem se orgulhava de optar sempre por menos impostos, esta direita continua a mostrar-se “coerente” com a sua ideologia: até julho o Estado arrecadou mais 1358 milhões de euros de receita do que no período homólogo do ano passado, o que equivale a uma subida de 7,6%. Os bolsos dos portugueses continuam a ser esmifrados sem contemplações.
  • Ainda assim a execução orçamental continua um desastre: segundo a Direção Geral do Orçamento as receitas caíram 3,4% até Julho e as despesas aumentaram 3,5%. Mas os porta-vozes da coligação congratularam-se com tanto “sucesso”.
  •  A Google, o Microsoft, o Yahoo e Facebook receberam milhões de dólares da Agência Nacional de Segurança (NSA)  para possibilitarem o acesso do programa Prism da espionagem norte-americana às contas dos seus clientes.

BANDA SONORA: Fernando Guimarães canta "Erwäge" da Paixão Segundo S. João de J.S. Bach


O tenor Fernando Guimarães é um dos nossos intérpretes líricos com maior sucesso na sua internacionalização, tendo já atuado com os L’Arpeggiata de Christina Pluhar ou com a Académie Baroque d’Ambronay dirigida por Jean Tubéry.
Em produções operáticas já desmepenhou papéis tão diversos quanto os de Ferrando em «Cosi fan tutte»,Don Ottavio em «Don Giovanni» ou Monostatos em «A Flauta Mágica»
Aqui temo-lo numa gravação com cinco anos a interpretar uma das árias da Paixão Segundo S. João de Bach e ocorrida em Santarém.


segunda-feira, 26 de agosto de 2013

LITERATURA: escritores de Long Island (Matthiessen e Salter)

A costa leste dos EUA, e particularmente, as praias de Long Island, ainda guardam as memórias da chegada dos primeiros colonos. A ilha era outrora o ponto de partida dos barcos, que iam pescar baleias. Hoje vivem aí os mais endinheirados dos habitantes de Manhattan, que fica apenas a duas horas de viagem por estrada e consideram imprescindível ter casa por estas paragens como forma de demonstração do seu estatuto.
De certa forma imitam Gatsby, o personagem de Scott Fitzgerald na mesma intenção de exibirem a ascensão social, tão importante na América quanto a conquista do Oeste ou a perseguição à baleia branca.
Essa vinda do jet set nova-iorquino intensificou-se nos anos 80 do século XX, quando os miúdos de Wall Street começaram a ganhar fortunas apenas por fazerem telefonemas a uns quantos interlocutores privilegiados e invadiram Hampton, esta pequena aldeia de pescadores, aonde se tinham instalado sobretudo pintores, poetas e romancistas. Como Peter  Matthiessen, que constitui um exemplo paradigmático de aventureiro e poeta, de explorador e de romancista.
Nascido em 1927 ele sabe identificar, quase à porta de sua casa, o primeiro terreno cultivado da história americana. O que significa ter-se instalado numa comunidade, que sempre se dedicou à agricultura, já que a terra revelou-se extremamente fértil. Comparativamente  com outras bem mais agrestes, como as do Connecticut, os colonos quase se julgaram instalados no paraíso.
Matthiessen fundou a «The Paris Review», que foi uma das mais importantes revistas literárias dos EUA, e foi premiado por algumas das suas obras mais importantes como «The Snow Leopard» (em que testemunha a sua notável ascensão ao topo do Everest), «Killing Mister Watson» ou «Shadow Counting».
Mas, na sua bibliografia também constam outros livros não menos apreciáveis como «Lost Man’s River», «In The Spirit of Crazy Horse»
Crítico mordaz da política da Casa Branca, ele acredita que o papel do escritor é o de falar por aqueles que não conseguem fazer-se ouvir. Nomeadamente os índios, que terão conseguido alguma atenção nos anos 60 durante e revolução hippie, mas logo voltaram ao esquecimento. Daí que ele se sinta eticamente estimulado para lhes dar voz às aspirações e inquietações.
Outro escritor residente há meio século em Long Island é James Salter, que foi em tempos piloto de aviões militares em guerra já tão distante como a da Coreia. Ao fim de doze anos de serviço decidiu reciclar-se em romancista. Desde então escreve livros sublimes sobre o indizível e o que é frágil.
Vizinhos há mais de trinta e cinco anos Matthiessen e Salter têm partilhado opiniões sobre a evolução do seu país. Nalguns aspetos consideram notáveis essas mudanças como é o caso das que disseram respeito aos afroamericanos. Mas para o primeiro as coisas deveriam ter mudado muito mais aceleradamente. Tanto mais que as pessoas deixaram de sentir a qualidade de vida a melhorar como ocorrera logo após o fim da Segunda Guerra Mundial. Embora não enjeite culpas próprias no crepúsculo do sonho americano, já que terão sido os eleitores a optarem pelos recentes e atuais políticos, Matthiessen não desiste de um mundo bem mais agradável de ser vivido.


domingo, 25 de agosto de 2013

POLÍTICA: A marcha sobre Washington

Na próxima quarta-feira, dia 28, comemorar-se-ão os 50 anos da Marcha Sobre Washington, que os líderes negros da luta pelos Direitos Cívicos organizaram e donde emergiu a figura notável de Martin Luther King com o seu memorável discurso I Have a Dream.
A marcha tinha um pretexto comemorativo: um século antes, a 1 de janeiro de 1863, Abraham Lincoln declarara implementada a emancipação dos afro-americanos até então sujeitos à condição de escravos. Mas, no seu discurso à multidão, King lembra as promessas então formuladas em favor da sua comunidade e ainda por cumprir.
Ele que vivera a dolorosa derrota do movimento de contestação em 1961, em Albany, ganha um tal prestígio com esta Marcha, que nunca mais irá deixar a ribalta nos cinco anos decorridos até ao seu assassinato em Memphis.
Por exemplo a campanha de boicote aos autocarros de Montgomery (Alabama) constituirá uma vitória prenunciadora daquilo que Dylan anunciava numa emblemática canção desse tempo: the times they’re a changing.
E um dos sintomas dessa mudança anunciada é constatado com a presença de sessenta mil  brancos envolvidos na multidão Entre eles Walter Reuther, que liderava então o mais importante sindicato norte-americano.
Mas King ambicionava bem mais e, em 1964, numa entrevista à BBC, previa a possibilidade de vir a existir um presidente negro. O que demonstra quanto ele não se surpreenderia com o atual estado das coisas se se pudesse, de facto, envolver...


BANDA SONORA: Charlotte Müller Perrier interpreta Rossini

Charlotte Müller Perrier é uma conceituada soprano suíça., que já interpretou papéis de referência em diversas produções de Genebra ou de Lausanne: Belinda em «Dido and Aeneas», Don Ramiro em «La finta giardiniera» e a Condessa Ceprano em «Rigoletto».Mas o momento culminante da sua carreira terá sucedido com a interpretação do papel de Violetta em «La Traviata» com a Ópera do Reno. Em gravações contamos com o «Requiem» de Gounod e com as «Vésperas» de Monteverdi.
Ela já está bastante distante dos estudos de violino em que se empenhara, quando tinha apenas oito anos. Hoje percorre o mundo em intensa atividade de concertista.
Mas aqui iremos recordá-la com a «O Salutaris» da Pequena Missa Solene de Rossini, numa atuação verificada em maio de 2012.



sábado, 24 de agosto de 2013

POLÍTICA: e se a próxima chicotada psicológica ocorrer na noite das autárquicas?

Na coluna semanal no «Expresso» Pedro Adão e Silva vem refletindo sobre a tendência dos partidos tradicionais do sul da Europa em perderem influência devido à sua incapacidade para corresponderem às ansiedades dos seus desiludidos eleitores.
Os casos da Grécia - com a fuga de eleitores para o Syriza e para um partido neonazi - ou da Itália - com o fenómeno do palhaço Grillo - parecem atestá-lo.
Ora, Pedro Adão e Silva questiona-se quanto ao que se passará em Portugal num altura em que as autárquicas estão aí à porta.  E perspetiva a possibilidade de uma grande recuperação do PCP em câmaras há muito perdidas e um meio empate entre o PSD - não tão causticado nas urnas quanto as suas políticas recentes justificariam - e um PS aonde Seguro vai constituindo a demonstração lapidar do que pode ser uma vitória de Pirro: ganhar-se um partido com a potenciação da lógica clientelar dos aparelhos internos e perder-se um país.
Pessoalmente, e desde que José Sócrates saiu da sua liderança, considero-me sócio do Partido Socialista (e por isso tenho as quotas pagas até ao fim do ano), mas não propriamente militante. Porque, para militar necessitaria de acreditar no sucesso desta estratégia insonsa escolhida por Seguro para aparentar que é Oposição responsável. E a verdade é que não acredito!
O que significa compreender plenamente o que Pedro Adão e Silva afirma no seu texto: por enquanto socialista, não direi que doutra água não beberei se sentir os meus valores de igualdade, justiça e liberdade, melhor defendidos por outro partido. Por exemplo, se estivesse na Grécia, decerto já teria saído desse zombie em que o Pasok se converteu para apoiar sem reservas as propostas de Alexis Tsipras.
Mas não concordo que a solução para uma maior identificação dos eleitores com os que defendam os seus interesses de classe passe por fora dos partidos. De todas as candidaturas “independentes”, que tenho visto surgir para as próximas autárquicas só a de Guilherme Pinto em Matosinhos e a do Movimento Cidadãos por Coimbra mereceriam o meu apoio se acaso votasse nessas cidades.
Continuo, pois, a defender a importância dos partidos enquanto instrumentos imprescindíveis da democracia. E a importância de neles pugnar pelas mudanças que os adequem à eficácia dos seus propósitos.
Assim, se hoje sou sócio e não militante do Partido Socialista, não significa que altere essa postura quando a direção atual for confrontada com a sua mediocridade e lhe suceder quem possui a cultura, a inteligência e a Visão de Futuro, que esta não tem. Aguardo, pois, por António Costa, por Pedro Nuno Santos, por Sérgio Sousa Pinto, por João Galamba, por Fernando Medina, por Isabel Moreira, por Pedro Delgado, por Pedro Marques, por Pedro Silva pereira e por muitos outros a que desejaria ver associado José Sócrates, o político mais subestimado e criminosamente atacado no Portugal democrático por quem os socialistas têm de identificar como os seus verdadeiros inimigos! E quiçá encontrando pontes de diálogo frutuosas com um Bloco de Esquerda e um Partido Comunista capazes de se mostrarem menos sectários do que têm sido até aqui!
Com tais dirigentes a liderar o meu partido, decerto que ele deixará de parecer titubeante na Oposição e liderará os movimentos sociais dispostos a pôr fim a esta austeridade! É que, seja aqui, seja na França do igualmente timorato Hollande, ou em Espanha com o quase inaudível  Rubalcaba, as democracias europeias não se compadecem com socialistas esquecidos em como tudo continua a resumir-se à velha luta de classes, connosco de um lado da barricada e os outros - o capital, o grande patronato - a dispararem do outro artilharia pesada, que só do nosso tem provocado vítimas.
Por tudo isso ainda acredito que existirá futuro com os atuais partidos de esquerda, incluindo aquele a que me mantenho ligado. Mas a agudização na desigual distribuição de direitos e rendimentos exige que façamos mudanças urgentes nos nossos comandos operacionais.
Para começar seria bom que, na noite das autárquicas, quando o PSD minimizar a sua derrota encostando-se à tíbia progressão do PS, o exemplo de Guterres fosse seguido e no Rato surgisse a consciência de não se poder perdurar por mais tempo neste pântano!